Parecia que Annette Obrestad teria 18 anos para sempre. Isso porque sempre que alguém discutia as impressionantes vitórias desse fenômeno do poker, a idade dela invariavelmente se tornava parte da discussão.
A norueguesa Obrestad é famosa por ter começado no poker online jogando freerolls com o nickname “Annette_15”. Ela rapidamente transformou $0 em dezenas de milhares de dólares sem jamais ter depositado um centavo. E continuou a ganhar dinheiro em torneios online, surpreendendo os curiosos virtuais do Full Tilt quando venceu um torneio de $500.000 em agosto desse ano, faturando $117.000 (seu segundo maior prêmio em dinheiro: ela ganhou $163.000 por ter chegado à mesa final do evento principal do World Championship of Online Poker do ano passado, no PokerStars).
Obrestad voltou a impressionar a comunidade do poker online ao ganhar um torneio sit-and-go com 180 participantes sem olhar suas cartas (na verdade, ela admitiu ter olhado uma vez, antes de decidir levar a sério a empreitada). Ela postou um vídeo que mostra todas as mãos do torneio e estrategistas do poker ficaram impactados com as táticas baseadas em habilidade e solidez que ela aplicou para vencer.
Não satisfeita em fazer uma reviravolta no mundo do poker online, ela testou suas habilidades no evento principal do World Series of Poker Europe em setembro. Faturou o pote final do histórico torneio, levando para casa mais de $2 milhões com esse feito e se tornando a pessoa mais jovem a ganhar um bracelete na história do WSOP – além de ser a mulher que mais ganhou dinheiro.
O time da Card Player na Noruega encontrou a jovem, que hoje tem 19 anos, para falar com ela sobre seu sucesso e seus planos para o futuro.
Stig Moen: Quais eram seus interesses quando você era mais nova?
Annette “Annette_15” Obrestad: Eu joguei boliche durante seis anos, mas parei quando comecei a levar o poker a sério. Eu também entrei em um curso, então decidi desistir. Quando eu estava no primeiro ano, meu clube pagava tudo, como despesas de viagem e inscrições, e eu não tinha muito dinheiro, então decidi parar. Eu não conseguia mais pagar, e, além disso, estava ficando um pouco cansada de tudo. De qualquer forma, eu não era tão boa.
SM: Você, honrosa ou desonrosamente, começou a jogar poker com 15 anos de idade. Como você descobriu o jogo?
AO: Tudo começou quando eu ainda jogava boliche. Eu vi o comercial de um site de poker quando estava assistindo a um torneio de boliche na TV e decidi conferir. Comecei com jogos sem dinheiro e freerolls, e construí um patrimônio do zero. Eu perguntei a minha mãe se ela podia fazer um depósito para mim, mas, como eu era menor de idade, ela disse que não. Quando eu fiz 18 anos, não precisava mais fazer isso, então nunca depositei nenhum dinheiro que não ganhei jogando poker.
SM: Quando você começou a levar a sério?
AO: Levou mais de um ano. Quando eu consegui cerca de $15.000, comecei a jogar em torneios com buy-ins maiores e quis mostrar a todo mundo que eu era uma boa jogadora. Rapidamente fui subindo os níveis e jogava sempre que podia. Se eu tinha cem buy-ins para alguma coisa, jogava aquilo, e quando minhas finanças cresciam, subia.
SM: Você usou alguma ferramenta para melhorar seu jogo?
AO: Eu não uso Poker Tracker ou coisas assim. Eu sou membro de todos os sites de treinamento e vi todos os vídeos. Também analiso a história de minha própria mão, mas é só. Também li alguns livros; Harrington on Hold’em é legal, eu acho. Mas eu jogo mais com base no meu feeling, e não me importo se tenho ou não pot odds para pagar. Eu não sou muito de pagar mesmo (rindo).
SM: Foi uma decisão consciente se concentrar nos torneios de no-limit em vez de cash pot-limit ou outros com limite?
AO: Apenas aconteceu dessa maneira. Eu comecei jogando em torneios e nunca fiz outra coisa. Eu tentei jogar cash games, mas não obtive sucesso. Além disso, eu acho cash games online meio chatos.
SM: Qual foi sua primeira experiência ao vivo com o poker?
AO: Eu joguei em muitos torneios ao vivo pequenos em clubes underground perto de onde moro. É ilegal jogar poker por dinheiro na Noruega, mas você pode encontrar clubes se souber onde procurar. Geralmente são torneios freezeout de $100 com buy-in de $20, então tudo é muito discreto.
SM: Você acha que isso lhe ajudou a se tornar uma jogadora melhor ao vivo?
AO: Ajudou, mas eu não levava muito a sério. Nesses clubes, o aspecto social é na verdade mais importante, pois você conhece e conversa com outros jogadores de poker. Eu acho que minha primeira grande experiência ao vivo foi em Aruba ano passado, onde realmente ganhei dinheiro. Mas eu tive muita sorte de chegar onde cheguei. Cheguei a quebrar um par de ases na bolha, indo de all-in com J-8 off (rindo).
SM: Qual foi sua primeira vitória significativa online?
AO: Eu não sei, ganhei tantos pequenos torneios. Eu não acho que tive grandes saltos. Acho que a minha vitória no Full Tilt há alguns meses foi a maior, mas não foi realmente significativo — pelo menos não para minhas finanças.
SM: Quando foi que você tomou consciência de que estava causando um alvoroço no poker da internet?
AO: Talvez quando eu comecei a ganhar no PokerStars, porque no começo eu jogava no UltimateBet a maior parte do tempo. Quando eu comecei a ganhar em todo canto, as pessoas obviamente passaram a prestar atenção e a postar sobre mim em fóruns. Acho que levou um ano e meio.
SM: O que seus amigos acham de sua carreira?
AO: Na verdade, não falamos muito sobre isso. A maioria deles freqüenta a escola e não sabe realmente nada sobre cartas. Eu sei que os pais deles não gostam, então eu sou discreta. Meus amigos são todos “bons filhos”. Como eu, eles não fumam nem bebem, então eu acho que o fator “apostar” os preocupa.
SM: Mas agora que você provou que é boa, alguns deles mudaram de opinião?
AO: Na verdade não. Eles são teimosos. São velhos (rindo)!
SM: E quando você ainda estava na escola? Seus professores sabiam do seu “hobby”?
AO: Sim, alguns deles sabiam. Durante o último ano eu viajava muito, então tinha que tirar uns dias de folga de vez em quando. Posso dizer que isso afetou meu desempenho na escola, mas eu tive bons resultados durante um longo período de tempo. Você não pode deixar de estudar apenas porque teve uma boa semana jogando poker!
SM: Você pensa a respeito do que irá fazer no futuro? Você se imagina jogando poker pelo resto da vida?
AO: É claro que sim! Eu serei a próxima Doyle Brunson, espere e verá (rindo)!
SM: Então, você não tem outro plano caso esse não dê certo?
AO: Não. Vai dar certo sim.
SM: Quando você começou, havia algum jogador que você admirava em termos de estilo?
AO: Eu costumava assistir a todos os profissionais do UB, como PokerHO e Debo34, durante o dia inteiro, tentando entender o que eles estavam fazendo. Agora que eu sou um pouco melhor do que eles, não vejo razão pra isso, porque eles não são tão bons quanto eu achava que fossem. Já no poker ao vivo, eu diria Daniel Negreanu. Ele nunca coloca muitas fichas, a não ser que tenha quase certeza que o outro jogador irá desistir, ou que ele tem a melhor mão. Ele evita arriscar muito cedo, e controla muito bem os potes. Eu também gosto muito de Phil Ivey.
SM: E Phil Hellmuth?
AO: Então você ouviu falar (rindo)? Eu vi que Phil Hellmuth estava registrado para um heads-up de $5.000 no UB, e as pessoas estavam esperando que alguém o enfrentasse. Eu esperava que outra pessoa o fizesse, para que não tivesse de ser eu, mas acabei me inscrevendo e o derrotando em doze mãos. Eu devo admitir que estava recebendo boas cartas, e ele estava tentando blefar contra mim também, o que é sempre uma boa combinação.
SM: Fale sobre sua forma ao se preparar para o WSOPE. Você teve alguns ótimos resultados online. Você estava confiante ao chegar ao evento?
AO: Sim, houve o torneio no Full Tilt (de $500.000), em que eu ganhei $117.000, mas que não ajudou a me dar confiança, pois eu sempre tenho confiança em minhas próprias habilidades. Eu sei que sou uma boa jogadora, e acho que tenho uma vantagem sobre a maioria dos oponentes. Devo ter jogado uns dez grandes torneios ao vivo até hoje, e eu certamente progredi muito com essa experiência. Eu acho que sou muito mais difícil de ser decifrada do que costumava ser.
SM: Você ainda fica nervosa?
AO: Na verdade não. Eu estava nervosa quando fiquei heads-up, e a diferença entre primeiro e segundo lugar era um milhão de dólares (rindo)! Eu fico nervosa quando blefo.
SM: Levando em consideração a força dos concorrentes do WSOPE, você tinha alguma estratégia ao entrar no torneio?
AO: Não, não tinha. Você deve apenas ver como sua mesa está jogando e se ajustar a ela.
SM: Havia algum jogador que você temia ou estava ansiosa para conhecer?
AO: Não, não nesse torneio. Eu não estava impressionada com nenhum dos profissionais contra os quais joguei. Bem, Vicky Coren na verdade me impressionou, mas eu não sei se ela é assim tão boa. Ela jogou bem em minha mesa, e era uma mesa muito difícil. Ted Forrest foi quem menos me impressionou, pois entrava de limp em todo pote e pagava qualquer raise. Ele estava conseguindo alguma coisa em todo flop, mas quando não conseguia, pedia mesa e depois caía fora. Eu não acho que ele tenha jogado bem de forma alguma.
SM: Fale um pouco sobre sua experiência no evento principal do WSOPE e do processo para ganhar $2 milhões.
AO: Bem, eu comecei como sempre faço (rindo); comecei com 20.000 em fichas e rapidamente desci para 13.000 porque tentei blefar contra Ted Forrest, e todo mundo sabe que isso não funciona! Depois, eu tive sorte e fiz uma trinca de dois duas vezes, então subi para 60.000. Então, paguei quando não devia perto do final e terminei o dia com cerca de 40.000. Eu estava muito feliz porque estava acima do stack inicial. No segundo dia, cai em uma mesa muito difícil. Tinha Greg Raymer com uma enorme pilha de fichas à minha esquerda, Hoyt Corkins à esquerda dele, e também havia Vicky Coren, Erick Lindgren, Allen Cunningham e Brian Townsend, todos na mesma mesa. Mais uma vez, tive sorte ao acertar o nuts e dobrei minhas fichas à custa de um jogador muito ruim que tinha o segundo melhor jogo. Eu estava com cerca de 200.000 ao final do dia sem ter feito muita coisa. A diversão começou quando nos aproximamos da bolha! Todo mundo ficou mais tight quando eu comecei a dar muitos raises, e todos desistiam. Um cara veio até mim depois e disse: “Bem, eu dei fold com um par de dez no big blind. Eu não vou deixar você fazer isso comigo da próxima vez!” Eu pensei: “Sim, claro... belo fold!” Depois da bolha eu fiquei mais tight, enquanto as pessoas estavam indo de all-in como se não se importassem mais. Eu na verdade descartei a maior parte dos K-Q ou pares, pois as pessoas estavam me voltando muitos reraises. Eles achavam que eu ainda estava loose quando na realidade eu estava muito tight, o que foi uma vantagem pra mim. A mesa final foi uma loucura! Havia uns suecos que entravam em todos os potes, aumentando em todos os flops e fazendo jogadas fora de posição. Eles eram loucos, então eu decidi não me envolver muito e esperar até que eles fossem eliminados. Eu perdi um pote enorme para o cara à minha esquerda, mas dupliquei as fichas novamente com valetes. Depois disso, eu esperei até que tivesse três adversários e comecei a jogar. A batalha do heads-up foi muito difícil. John Tabatabai era muito duro de se jogar contra. Era muito agressivo, mas eu acho que estava blefando demais. Ele sabe que eu sou uma boa jogadora, mas mesmo assim estava tentando fazer muitas jogadas contra mim que não funcionavam. Eu não acho que nenhum de nós estava conseguindo mãos boas, então tudo era uma questão de executar o melhor blefe toda vez. Acho que foi uma boa partida. Eu mal posso esperar para ver na TV: eu blefei muito! As pessoas provavelmente vão me achar louca quando virem (rindo).
SM: Você pode nos dar exemplos?
AO: Eu estava em um pote contra John quando ainda havia 15 jogadores no torneio, e aumentei do cut-off com 6♦2♦. Ele pagou do button e o flop veio Q-9-6, com duas cartas de paus. Eu pedi mesa, sabendo que ele apostaria. Se eu apostasse, sabia que ele iria contra-atacar, e eu não queria colocar muito dinheiro no pote. Ele apostou o valor do pote, que era de cerca de 20.000, e eu subi para 60.000 para ver a reação dele ou talvez assustá-lo. Ele pensou por um momento e voltou um reraise de $140.000, com 300.000 restantes. Eu pensei durante um longo período, depois fui de all-in. Ele desistiu (rindo).
SM: Você mudou seu pensamento durante a mesa final? Em algum ponto você duvidou de si mesma?
AO: Apenas quando eu fui de all-in com Q-J e me deparei com J-J, mas eu tinha a sensação de que conseguiria uma dama mesmo assim (rindo). Eu geralmente tenho essas sensações quando estou em uma boa fase, e elas geralmente estão corretas.
SM: Quais foram as mãos chave para você no torneio?
AO: Posso dizer que 6-2 foi meio assim, mas também teve outra. Eu tinha acabado de me tornar chip leader com duas mesas ainda faltando, e aumentei do button com um par de três. O small blind abriu reraise, eu voltei all-in e ele pagou imediatamente com um par de damas. Eu perdi cerca de um milhão ali, e esse foi um grande erro. A média na mesa final era de 800.000. Eu tinha cerca de 160.000, mas dobrei de novo com um par de cincos contra A-J ou algo do gênero. Depois, eu aumentei minhas fichas mais uma vez com A-10 contra A-J. Pensando nisso agora, houve poucas mãos chave. Q-J na mesa final foi obviamente outra. Eu estava bem nesse torneio.
SM: Que efeitos psicológicos têm o fato de você perder uma mão como aquela do par de três?
AO: Eu não me deixei abalar. Isso já me aconteceu muitas vezes online, então eu sei como lidar. Eu ainda tinha uns 20 big blinds, e já venci um torneio tendo apenas um big blind, então sabia que era possível. É aí que a experiência de ter jogado muito poker online me ajuda.
SM: Com essa vitória, você ganhou muito dinheiro. Como isso irá afetar sua vida?
AO: O bracelete significa muito mais do que o dinheiro, mas o dinheiro obviamente é ótimo. Eu na verdade não ia jogar o torneio, pois achei que $20.000 era muito caro para um buy-in, então eu perguntei a dois amigos, Cliff Josephy e Eric Haber, se eles pagariam 50% para mim e eles concordaram. Eles estão felizes por isso agora (rindo)! Depois de pagar impostos, nós provavelmente compraremos uma casa, então eu não vou usar muito do dinheiro, de qualquer forma. É muito caro viver na Noruega.
SM: Você diz que foi convidada para encontros românticos. Você já ficou tentada em aceitar as ofertas?
AO: Não, nunca! Nunca fiquei, nunca ficarei (rindo)!
SM: Você assinou um contrato de patrocínio com o BetFair. Quanto tempo duraram as negociações e quais foram seus critérios para escolher o Betfair?
AO: Eu tinha recebido umas duas outras ofertas que não me atraíram muito. Meu agente, Per Hagen, do Pokermanager.com, fez uma biografia/currículo que ele apresentou a vários sites, e o Betfair ofereceu um contrato que me agradou bastante. Eu sou a prioridade deles, e eles me deram a oportunidade de jogar em qualquer torneio ao vivo que eu queira, que era exatamente o que eu buscava em um acordo. Por falar nisso, não deixe de checar meu blog tanto em betfair.com quanto em pokermanager.com.
SM: Você quebrou muitos recordes — mais jovem vencedor de um bracelete e primeira mulher a ganhar o evento principal, para mencionar alguns. Você escreveu a história do poker, e alguns acreditam que sua vitória sempre terá um grande impacto, como a de Chris Moneymaker em 2003. Você concorda?
AO: Não, eu não acho que serei tão lembrada. É engraçado que muitas pessoas estejam acompanhando meu sucesso e estejam torcendo por mim. Eu não acho que conseguiria me dar tão bem se eles não me apoiassem, mas é um pouco difícil de se acostumar à atenção que tenho recebido. Eu recebo mensagens de texto a cada minuto de pessoas que eu sequer conheço, me parabenizando, me convidando para sair e até pedindo dinheiro. É inacreditável. A atenção da mídia é também enorme, mas eu acho que é apenas parte do trabalho.
SM: Será difícil superar essa vitória, Annette, mas qual é seu próximo objetivo?
AO: Talvez ganhar um evento do EPT? Eu irei jogar em vários dos eventos do European Poker Tour essa temporada. Ainda há muito que eu possa fazer até que eu complete 21, mas no minuto que eu completar, vou para Vegas! ♠