O que a mãe de um garoto de seis anos, diagnosticado com febre reumática, poderia fazer para entreter o filho durante os longos meses de recuperação e repouso? Bem, a Sra. Reese resolveu ensinar o pimpolho a jogar cartas. E o resultado desse período de convalescência foi o despertar de um dos maiores gênios do poker de todos os tempos, David “Chip” Reese.
É provável que o dia 28 de março de 1951 tenha sido mais uma quarta-feira modorrenta em Dayton, Ohio, leste dos EUA. Ninguém poderia imaginar que a cidade que viu nascerem os irmãos Wright, rivais de Santos Dumont na briga pela invenção do avião, fosse também o berço de um jogador que ficaria marcado pela extrema polidez à mesa, aliada a uma técnica impecável.
Ainda no colégio, Reese começou a lucrar com o poker. Não era dinheiro o que ele puxava do pote, mas sim cards de baseball, um tesouro para qualquer garoto da sua idade. Ao entrar na conceituada Dartmouth College, deu seguimento ao sucesso nas mesas. Agora, as vítimas eram professores e funcionários da universidade, que insistiam, sem sucesso, em tentar derrotar o calouro do interior.
Competitivo, Chip Resse chegou a fazer parte do time de futebol americano da faculdade, muito embora tenha ganhado notoriedade mesmo nos debates de economia. Seu estilo elegante de argumentar e seu relevante saber acadêmico chamaram a atenção da tradicional fraternidade “Beta Theta Pi”, para a qual foi aceito com louvor.
Após a graduação em Dartmouth, Chip abocanhou uma vaga na respeitada faculdade de direito de Stanford. O sonho de se tornar advogado em Los Angeles estava cada vez mais próximo. Só que entre Ohio e a Califórnia tinha uma cidade no meio do caminho, no meio do caminho tinha uma cidade... Las Vegas.
Na companhia do seu grande amigo Danny Robeson, Chip pisou na cidade do pecado com 400 dólares no bolso. Pouco tempo depois, ao vencer um torneio de Seven-Card Stud no Cassino Sahara, transformou essa quantia em 40 mil. Nos anos seguintes, a conta já era feita em milhões.
Em 1978 veio o seu primeiro bracelete da WSOP, no evento de Seven-Card Stud Split. Repetiu a dose em 1982, com a vitória no Seven-Card Stud Limit. Em 1991, aos 40 anos, Chip entrou para o Hall da Fama do Poker, tornando-se o jogador mais jovem da história do esporte a fazer parte do seleto time.
Como prova de que a qualidade resiste aos castigos do tempo, a maior premiação de Chip Reese viria em 2006, com o primeiro lugar no dificílimo evento H.O.R.S.E., em que cinco modalidade são disputadas alternadamente (Hold’em, Omaha, Razz, Stud e omaha Eight-or-better). Não bastasse a dificuldade natural dos múltiplos jogos, quem quisesse participar do torneio precisaria desembolsar a bagatela de 50.000 dólares, o que reduz a concorrência praticamente aos jogadores fora de série. Pela vitória, Chip Reese recebeu US$ 1.784.640.
Apontado por muitos jogadores, fãs e jornalistas como o melhor jogador de cash game da história, Chip se contabilizou por um estilo cerebral, capaz de jamais se desesperar e de conseguir grandes resultados com mãos tidas como fracas. Grande estudioso do jogo, ele dominava diversas modalidades do poker.
Outra característica marcante deste “gentleman” do pano verde era jamais encarar uma derrota como o fim do mundo. “Se eu realmente tiver aprendido a jogar isso aqui, conseguirei recuperar o prejuízo muito em breve”, era seu pensamento.
Alguns meses depois de vencer o H.O.R.S.E., David “Chip” Reese foi chamado à Mesa do Senhor. Morreu em casa, vítima de pneumonia. Certamente, um dia triste e modorrento em Las Vegas, em Dayton e, sobretudo, no mundo do poker.
Especialista em esportes desconhecidos, encontrou no poker um porto seguro. Converse com ele cinco minutos, e ele vai citar umas cinquenta pessoas. Vinte delas não existem, dez você não conhece e o resto ele falou o nome errado.
