EDIÇÃO 68 » COLUNA NACIONAL

Muito risco ou alto valor?

Um fino concreto


Felipe Mojave

Neste artigo, vou analisar uma mão jogada na primeira etapa do Rio Poker Tour de 2013, no Rio de Janeiro.

O torneio já estava em estágio avançado, com blinds 1.200/2.400 e ante de 300. Os stacks efetivos eram de 50 big blinds.

Do UTG, abri raise para 5.000, e o meu oponente, André Morgado, deu call no big blind. O flop veio AQJ, e nós dois pedimos mesa. O turn foi um 9. Ele pediu mesa novamente, e eu apostei 3.200. Ele hesitou um pouco, mas pagou um tanto quanto rápido. O river trouxe um J, deixando o bordo AQJ9J, e ele disparou 10.500. Depois de pensar bastante, fui all-in. André pensou por muito tempo e deu call. Eu tinha 99, para um full house; e ele, 42, um flush.

Até o flop, a mão é normal, check atrás com 9-9 em um bordo com três overcards. Mas, normalmente, eu optaria pela continuation bet, por estar abrindo o pote do UTG+1.



Já no turn, quando acerto a minha trinca, meu pensamento é tentar extrair valor de alguma forma, já que aquele era um bordo muito perigoso. Apostei bem baixo (menos de 1/3 do pote). Eu sabia que tomaria call de mãos especulativas, já que decidi não apostar no flop, o que naturalmente desagrega valor da minha mão.

Quando meu oponente hesita, mas dá o call, descarto algumas mãos do range dele. Restam opções como o flush draw e par com gutshot (gaveta). Sendo a segunda menos provável, pois seria mais normal ele apostar no turn do que ir para o check-call.

Quando o river traz o J e possíveis flush e full, meu oponente aposta 2/3 do pote, o que eu tinha certeza que nunca representaria um blefe. Ou seja, sempre seria uma mão de valor. No turn, eu já havia excluído do range dele mãos como A–J ou Q–J, o que me deixou muito tranquilo para seguir a linha de extrair valor no river.

Como os stacks eram bem grandes, havia espaço para muitas alternativas. Eu acreditava que qualquer valor entre 21.000 e 35.000 seria pago. Sabendo disso, e restringindo o range do meu oponente para flush, tentei algo bastante ousado e criativo, que foi o all-in – um overshove, que faria meu oponente ir para o tanque se ele tivesse o flush, mas também o levaria a desconfiar do real valor da minha mão ao mesmo tempo. Devido à maneira que me comportei, o shove (all-in) no river poderia ser um grande blefe para puxar o pote.

Depois de minutos pensando, o André deu call com o flush, e eu ganhei um pote enorme. Pensar diferente, aqui, tornou a jogada extremamente lucrativa. Esta mão tem várias faces e definitivamente poderia ser jogada de diversas maneiras. No poker é interessante tomar linhas que confundirão adversário. Transformar padrões e mãos normais em jogadas complicadas para os oponentes, fatalmente, irá induzi-los ao erro.


André Morgado e Felipe Mojave

Depois do torneio, o André entrou em contato comigo para discutir sobre a mão. Abaixo, um breve relato do mesmo:

“No river, a dobra do J trouxe o meu flush. Havia umas 17.000 fichas no pote. Apostei 11.000, e você (Mojave) pensou um pouco e anunciou all-in de umas 100.000 fichas, jogada que me fez pensar muito, pois abriu uma infinidade de possibilidades, inclusive um blefe. Eu tinha cerca de 80.000 para trás, o que me possibilitava dar fold e ainda continuar tranquilo no jogo – até porque, em certo momento, achei que você poderia ter feito o full e estaria dando o shove para induzir um erro. Porém, comecei a eliminar as possibilidades de A-J e Q-J pelo check no flop. O 9 no turn e a aposta de 3.200 me fez pensar em algo como K-10. No river, resolvi dar o call, pois pensei que o shove também poderia ser a única chance que você teria de levar o pote”.

Acredito que ambos aprendemos muito com a jogada, e espero que vocês, leitores da Card Player, também.





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