Nos feltros ou fora deles, todos estamos sujeitos a erros, inclusive os melhores jogadores profissionais.
Que fique bem claro que eu sou fã do jogo criativo, principalmente deepstack. Porém, não se deve confundir criatividade com agressividade sem limites ou ação contínua inadequada.
Aqui, chamarei a atenção de vocês para os “blackouts”, ou seja, aquelas mãos que jogamos sem nenhuma razão aparente, sem nexo e sem freio.
Para facilitar a análise, dividi-a em sete partes. Vamos a elas.
Torneio: WSOPE Main Event
Blinds: 500/1.000 - 100
Viktor "Isildur1" Blom (240.000 fichas)
Ian Munns (300.000 fichas)
Pré-flop: Do meio da mesa, Viktor Blom aumenta para 3.000 com K♦2♦. Do button, Ian Munns faz tudo 9.000 com A♥7♠. Blom paga.
Flop: A♦A♣3♣ (Pote: 20.400) Blom dá check. Munns repete a aposta e coloca 9.000 no pote. Blom faz tudo 58.000, Munns dá reraise para 116.000. Blom vai all-in. O pote tem 367.400 e Munns precisa colocar mais 115.000 para o call. O inglês paga. O turn é um 10♣, deixando Blom sem chances na mão. O river é um irrelevante 3♦, e Munns puxa um pote de 482.400.
PARTE 1
Com 240 big blinds, em um torneio com uma das melhores estruturas do mundo, quase não há necessidade de forçar o jogo e abrir com K♦2♦. Ocorre que, em seu estilo de jogo hiperagressivo, é compreensível que Viktor Blom jogue praticamente todas as mãos e tente confundir os adversários. Acho também muito justo que ele faça um mix e não tenha um range pré-estabelecido, mesmo fora de posição. Ainda assim, considero desnecessária essa postura de sair apostando com quaisquer cartas.
PARTE 2
A 3-bet em posição contra um jogador agressivo como Blom pode ser bastante efetiva e também ter valor, mesmo segurando A♥7♠. O cuidado aqui seria não incentivar o maníaco a aplicar uma 4-bet, para depois jogar suas cartas fora, já que a 5-bet pode sair muito cara. Note que a estratégia do sueco é essa: dar inúmeros raises com mãos ruins e, de repente, acordar com um monstro e surpreender o adversário, ou até mesmo empurrar tudo com uma mão ruim, sabendo que a chance de o oponente dar fold é grande. Ao mesmo tempo em que a jogada do Munns é boa, talvez não seja a melhor estratégia entrar nesta guerra contra um adversário que está disposto a colocar tudo no pano a qualquer momento.
PARTE 3
Mesmo respeitando a estratégia de Blom, de abrir com K♦2♦ algumas vezes, mesmo fora de posição, o call na 3-bet é um grande erro. K-2 é uma mão que não desenvolve bem pós-flop e, com frequência, deixará você em situações complicadas, inclusive quando um rei aparecer no bordo. Um bom jogador poderá fazer, se estiver em posição, um grande estrago em seu stack.
Aqui, o sueco tenta representar uma mão muito forte, uma armadilha. Mas todos sabem que ele dificilmente tira o pé do acelerador quando está blefando. Ele está explorando mal a própria imagem, e isso é outro grande erro.
PARTE 4
Ele decide dar call, criando um pote de 20 BBs pré-flop. Um jogador mais equilibrado, que tivesse apenas 20 big blinds, pilotaria este stack por horas, provavelmente com sucesso.
No flop, ele ainda aplica um check-raise de 58.000 depois de Munns apostar 9.000. Que tipo de aumento é esse? Parece que o exagero criativo acabou subindo à cabeça de Blom. Esse número nunca vai constituir uma boa aposta, seja por valor ou por blefe.
Antes de a mão começar, acredito que ele simplesmente tenha pensado em blefar até o fim, mas talvez tenha se esquecido de que o sucesso do blefe está diretamente relacionado à linha que você adota para jogar a mão. Neste caso, não consigo enxergar nenhuma linha de valor em suas ações. Erro básico.
Acredito que um check-raise para 22.000 poderia representar muito mais força, apesar do que, mãos como A-K e A-Q estariam muito mais no range de 4-bet pré-flop do sueco do que no de call fora de posição. Outro fato é que o ás estará no range de 3-bet do seu oponente com frequência, transformando em erro crasso continuar blefando na mesma street. Um modo mais eficaz de prosseguir com o blefe seria dar apenas call no flop e levar a mão para o turn. Neste caso, o T♣ traria a possibilidade do flush para a mesa e faria o oponente reduzir a marcha. No river, muitas cartas dariam a chance para um blefe bem sucedido.
PARTE 5
Aqui, eu gosto muito da jogada do Munns. Ele aplica outro raise, baixo, deixando espaço para Blom terminar de se enforcar.
PARTE 6
Talvez o erro mais grave de Blom foi não parar para raciocinar e repensar a mão. Suas ações impulsivas fizeram com que ele jogasse o torneio no lixo. Utilize o seu tempo em cada street. Pense muito bem antes de agir. Nenhuma ação por impulso traz sucesso em torneios.
PARTE 7
De modo geral, esta jogada não se aplica muito bem para torneios deste tipo, em que o objetivo no Dia 2 é acumular um bom stack para o Dia 3 e então ficar na faixa de premiação. Não é necessário ficar correndo grandes riscos. Respeitar as fases de um torneio é primordial. Arriscar um stack de 240 BBs para ganhar um pote de 500 BBs não vale a pena. Em um torneio de cinco ou seis dias, não é no Dia 2 em que o campeão é decidido.
Esse erro de gerenciamento de stack é bastante comum entre jogadores excessivamente agressivos, ou que fazem a transição dos cash games para torneios, ou ainda do poker online para o jogo ao vivo. Portanto, se esse é o seu caso, tome muito cuidado.
Com certeza, Viktor Blom é um excelente jogador. Quanto ao Sr. Munns, sei apenas que ele é um amador inglês. Aqui, o verdadeiro objetivo foi mostrar que é possível acabar com um stack muito confortável se você perder o foco e decidir blefar apenas por blefar. Quando for fazer uma jogada, pare e pense nas suas ações. Isso será decisivo para o desenvolvimento e sucesso do seu jogo.