Se nos feltros o show ficar por conta de nomes como André Akkari, Alexandre Gomes e Thiago Decano, fora deles, Sérgio da Silva Prado, o Serginho, o “Sé” ou simplesmente Sérgio Prado, seria o equivalente a esses fenômenos.
Antes da tarde do que nunca, a Card Player Brasil conversou com esse paulista de 41 anos, casado, pai da Manuela e do Daniel, e referência do jornalismo especializado em poker no Brasil.
Por que você escolheu o jornalismo?
Eu me formei em comunicação, mas como radialista. Na escola sempre escrevi bem, os meus professores gostavam dos meus textos e me aconselharam a entrar nessa área. Eu sempre gostei dessa parte tecnológica, equipamentos eletrônicos, e eu acabei optando pelo rádio e TV. Fiz Quando fui para a televisão, eu trabalhava na produção, e sempre escrevendo muito nos programas que eu fazia.
Todo jornalista tem as suas influências. Quais são as suas?
Eu trabalhei com grandes figuras. A ESPN, para quem é jornalista e trabalha com esportes, é a maior escola de todas. Lá estão as grandes feras, pessoas que estão na profissão há muito tempo, responsáveis por reportagens fantásticas. O Helvídio Mattos, por exemplo, é um cara que eu sempre admirei. Já trabalhei com muitos repórteres sensacionais, ajudando nas coberturas. Cobri três Super Bowls [jogo que vale o título da liga profissional de futebol americano, a NFL] com o André Kffouri, e é impressionante trabalhar com ele. Ele merece o reconhecimento. No começo, ele ficou muito tempo na sombra do pai, mas quem entende de jornalismo sabe que ele é muito bom.
Mas, talvez, o maior professor que eu tive por lá foi o próprio José Trajano. Um cara que sempre me deu bons conselhos. A gente sempre conversava depois do expediente, e eu aprendi muito, ali, o ouvindo falar.
No poker, eu aprendi bastante com o Brad Willis, o blogger oficial do PokerStars. Os textos dele são fantásticos. Toda a vez que tenho a oportunidade de conversar com ele, eu aproveito.
Quem te conhece, sabe que você é um amante da música, em especial da lenda Frank Zappa. Há um pouco do Zappa em você, no seu trabalho?
Meu caráter, minha evolução como pessoa e profissional foi formada por três pessoas: minha mãe, meu pai e Frank Zappa. Em termos musicais, ele é a minha maior influência, disparado. Foi um cara que realmente conseguiu criar e ser eficiente em todos os estilos musicais que você possa imaginar. Do erudito ao jazz, do clássico ao rock. Ele era um cara que tinha uma postura bastante crítica em relação à sociedade. Sempre contra a corrente, virando as costas para a indústria.
Hoje em dia, é comum falar de um músico que tenha a sua própria gravadora, mas ele foi o primeiro cara que fez isso, e em 1970. Algo impensável. O Zappa chegou a distribuir os seus discos pelo correio. Sem liberdade, ele optou por trabalhar do seu jeito.
Toda a postura dele, tudo que ele sempre mostrou na musica e nos seus ideais, sempre me influenciou. Isso reflete, sim, nos meus textos, no meu trabalho. Algo que sempre tento fazer é me guiar pela honestidade do questionamento.
Como começou a sua história na ESPN?
Quando a ESPN Internacional começou por aqui, eles precisavam de produtores – antes, todo o material era produzido em Bristol, nos Estados Unidos, por brasileiros. Eu trabalhava na TVA, que lançou a ESPN no País, e meu nome veio à tona. Nem pensei, abandonei o meu trabalho em outro canal de esporte e fui para a ESPN.
E a história do poker na ESPN?
Isso foi marcante para mim. Na primeira semana, fizemos uma reunião. A equipe era pequena, e a gente tinha que dividir as funções de cada um. A minha chefe, na época, falou: “Vamos tentar pegar por esporte. Alguns vão pegar umas coisas legais, mas vão sobrar umas tranqueiras também”. Na hora, eu levantei a mão e falei: “Eu fico com qualquer tranqueira, mas que o poker comigo”. Todo mundo olhou pra mim e ficou espantando, porque o poker era a maior tranqueira que havia ali (risos).
Eu peguei o poker porque eu já gostava nessa época. Acompanhava desde 2003. Tudo sobre poker na ESPN passava na minha mão.
Você se considera um dos responsáveis pelo o que o poker se tornou hoje no Brasil?
Eu acredito ajudei, sim. Eu era o cara certo, na hora certa e no lugar certo. Eu tinha interesse no poker, e já tinha adquirido conhecimento suficiente para mostrar às pessoas tudo o que eu sabia, que o poker era um esporte, não um jogo de azar. Aquilo me fez batalhar muito na ESPN para mostrar isso às outras pessoas.
A ESPN mostrava o poker porque eles tinham na programação dos EUA. Porque era legal passar. Eles me perguntaram se havia comentaristas para transmissões, e eu falei que existiam jogadores consagrados no Brasil. Corri atrás e fui fazendo as coisas. Trabalhei muito lá dentro, mas a força que ESPN tem no mercado ajudou bastante. Foi uma junção das duas coisas: a minha vontade de ajudar o poker e a força da emissora.
Em que passos anda o jornalismo no poker? Está no caminho certo?
Eu já até escrevi uma coluna sobre isso [Card Player Brasil, edição nº 33/2010], falando que o poker estava deixando de ser uma criança para se tornar um adolescente. O que eu quis dizer foi que, no começo, as pessoas que trabalhavam com o nosso esporte, o tratavam de uma maneira paternalista, como criança mesmo. Defendíamos o poker contra tudo e contra todos. A gente não agia muito como jornalista, mas como fãs. Enaltecíamos e mostrávamos só a parte boa do jogo. Essa atitude era muito mais por causa do preconceito do público externo. Era como uma postura de autodefesa.
Hoje, o poker esta ganhando um respeito muito grande da sociedade, está cada vez mais bem visto. Está na hora de abaixar a guarda e realmente tratar o poker como adolescente. Começar a dar os puxões de orelha quando precisar, questionar, colocar um pouco mais de opinião no nosso trabalho. Isso faltava um pouco no início. É claro que vamos apará-lo quando for o momento, mas precisamos agir diferente. Acho que é possível ter jornalistas que opinem mais sobre o que está acontecendo no cenário nacional.
Dá para fazer um trabalho diferente no poker, jornalisticamente falando? Cabe o jornalismo Gonzo de Hunter Thompson ou algo do tipo?
Acredito que sim. É um caminho bem viável porque o poker é algo que dá para você se envolver e participar de forma rápida. Nós vimos repórteres fazendo matérias no BSOP, o Cazé Peçanha foi um desses, e ainda participou do jogo, se envolveu na coisa. Um dos livros de poker que eu mais gosto é o de um cara que foi fazer uma matéria sobre a WSOP, ganha a vaga para o Main Event em um satélite e termina na quinta colocação [Positively Fifth Street: Murderers, Cheetahs, and Binion's World Series of Poker, de James McManus]. Esse é um bom paralelo com as obras do Hunter Thompson. Se os jornalistas descobrirem a maneira certa de fazer, dá para fazer sim.
Viver de poker não é fácil. Por conviver regularmente com os principais profissionais desse esporte, você é uma das pessoas credenciadas a falar sobre a profissão. O que você diria para quem está começando ou pensando em ingressar nesse trabalho?
Um bom exemplo para falar de como é difícil viver do poker é o meu. Eu lido com o poker diariamente há quase dez anos. Eu conheço e sou amigo dos principais jogadores do Brasil e até do mundo. Convivo com eles, jogo com eles nos home games. Isso me faz ver que eu nunca poderia sequer pensar em ser um profissional do poker. Eu não sou preparado para isso. Dá para ver o quanto eles batalharam e o tamanho do talento que esses caras têm para se da bem nessa profissão.
Hoje, tem muita gente que joga poker no Brasil pensando em ficar rico, em ganhar o seu sustento, mas a matemática do poker é muito simples, existe uma pequena parcela que vai se dar bem e outra que não vai.
São poucas as pessoas que possuem capacidade para se profissionalizar, tecnicamente ou emocionalmente. As pessoas acham que jogar poker é muito fácil, mas não é. São decepções atrás de decepções, e o que você tem que fazer é levantar a cabeça e partir para a próxima. É o lema que todo jogador de poker tem: caiu de um torneio? Levanta porque já vem outro por aí. Se você não for bem preparado para isso, não vai da certo.
Por fim, não se iluda com o dinheiro fácil. Se ele vier, pode saber que será difícil. É preciso estudar muito, batalhar bastante e ter consciência que isso é necessário para se manter no topo.
Eu estou nessa há anos. Já vi muito jogador profissional que começou como promessa e logo depois sumiu.
O que falta para o poker se tornar parte da grade esportiva da televisão?
O grande problema do poker na televisão é como nos vamos lidar com ele na grade de programação. Um jogo de futebol começa 12 horas e acaba às 14, e dá para você colocar um jogo de vôlei em seguida. No poker, isso não é possível. Uma mesa final da WSOP pode durar três ou quinze horas. Esse é o grande problema.
Para televisão, nós sempre vamos trabalhar com os programas editados – em algumas ocasiões, eles serão ao vivo, caso da mesa final do Main Event da WSOP. O resto, nós teremos que nos acostumar via internet, com cartas fechadas ou com as abertas sendo exibidas com atraso.
Em breve, nós vamos poder dar passos mais largos. Se você quiser acompanhar um torneio inteiro, somente na internet. Não há como transmitir um torneio inteiro, são 20 ou 30 mesas para mostrar e mais uma dezena de horas de jogo.
Para finalizar, qual momento você definiria como o mais marcante na sua carreira?
Acho que foi a minha primeira cobertura de um grande torneio internacional, o PCA 2008. Naquele momento, eu tive contato com um mundo totalmente novo, o dos maiores jogadores profissionais do planeta. Foi ali que eu soube o que queria fazer na minha carreira.
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