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O melhor jogador que você nunca ouviu falar

Vencedor de Dois Braceletes do World Series of Poker, Scott Clements Ganha Primeiro Título do World Poker Tour em Mesa que Bateu Recordes


Seth Niesen

Scott Clements é provavelmente o melhor jogador de que você nunca ouviu falar. O humilde Clements não traz atitude, teatro ou truques à mesa de poker. Esse jogador de 25 anos, nascido em Mount Vernon, Washington, traz apenas uma coisa — jogo, muito jogo. Embora ele seja conhecido como um dos melhores jovens jogadores do circuito de torneios, muitos fãs casuais nunca ouviram falar nele. Essa falta de reconhecimento é estarrecedora, levando em consideração seus feitos: dois braceletes do World Series of Poker, mais de $2,8 milhões em ganhos em torneios, e agora um título do World Poker Tour. Se você não sabe quem ele é, já está na hora de conhecer.

Dia 1: O Kid, o Survivor e o Myst
Os três primeiros dias do North American Poker Championship atraíram 504 jogadores, criando um total de $4.863.300 (dólares canadenses) em prêmios. O primeiro prêmio pagou $1.361.724 (dólares canadentes) e um buy-in de $25.000 no WPT Championship, no Bellagio. O Dia 1-A contou com a presença de mais participantes, e o eventual chip leader da mesa final, Jonathan Little, emergiu como o dono do maior stack desde o início. O Dia 1-B testemunhou Jen-Robert Bellande, um participante da atual temporada de Survivor, acumular a maior pilha dos três primeiros dias. O Dia 1-C foi liderado pelo profissional do poker canadense e colunista da Card Player, Marc “Myst” Karam. Ele ficou na sexta colocação do NAPC há um ano, e terminou o dia como o líder em fichas, ganhando posição para mais uma excelente campanha em sua terra natal.

Dia 2: Flutuando Rio Abaixo
Os três “Dias 1” seguiram até diminuir a concorrência para 234, e os jogadores sobreviventes se reuniram em um único grupo pela primeira vez no segundo dia. Barry Greenstein pegou Bellande em sua mesa e não perdeu tempo para tomar seu grande stack. Greenstein e Bellande duelaram várias vezes, com Greenstein claramente vencendo os confrontos. Em uma mão, ele colocou uma value-bet perfeita com uma trinca de oitos contra o top pair de Bellande, ganhando dinheiro em cada street. As coisas ocorreram de maneira oposta para Little, que começou o dia com $164.200 em fichas. Na metade do dia, tinha superado Bellande como chip leader com mais de $300,000, e parecia que ninguém poderia pará-lo. Contudo, as coisas começaram a desandar quando ele dobrou as fichas de Adam “Roothlus” Levy em um pote de $100.000, e a montanha de fichas que ele construíra começou a desmoronar. Little acabou o dia com uma modesta contagem de $132.000 em fichas, e apenas 79 jogadores restantes.

Dia 3: A Bolha Estoura
O jogo chegou até a bolha rapidamente, e vários profissionais famosos foram mandados embora no processo, incluindo Karam, Jordan Morgan, Kathy Liebert, J.C. Tran, Joe Cassidy e Jeff Madsen. O dono de um título do WPT, Nick Schulman, foi o azarado 46º colocado. Lee Markholt foi eliminado na 23ª colocação, o que lhe garantiu seu impressionante oitavo ganho de dinheiro no WPT em 2007. Ao final do dia, apenas 18 tinham sobrevivido para tentar figurar entre os seis jogadores que participariam da mesa final televisionada.

Dia 4: Definindo a Mesa Final
Dezoito jogadores retornaram para tentar obter glória no poker, mas foi Jonathan Little quem recebeu o papel principal. Ele habilidosamente refez seu stack, depois puniu oponentes durante a maior parte do dia. Little constantemente colocava médios e grandes stacks diante de decisões all-in, e, ao final da noite, emergiu como o líder em fichas. Mas dessa vez Clements não estava muito atrás, e jogou talvez a mão mais comentada do torneio, dando um grande blefe que fez a sala ficar em polvorosa. Cheryl Deleon aumentou para $45.000 e Clements pagou do small blind. O flop veio Q94, Deleon apostou $80.000 e Clements aumentou para $175.000. Deleon pagou, e o turn trouxe o 9. Clements apostou $300.000 e Deleon refletiu por cerca de um minuto antes de pagar. O river foi o K, e Clements imediatamente anunciou que estava all-in. Deleon perguntou se ele cobria o milhão de fichas que ela tinha, e ele cobria, sobrando $200.000. Deleon pensou durante cinco minutos antes de finalmente descartar sua mão. Clements mostrou um devastador 86, e Deleon bateu na mesa com raiva enquanto falava um palavrão. Isso claramente a deixou tiltada, e pouco tempo depois ela foi eliminada em sétimo lugar, estourando a bolha do evento televisionado.

Dia 5: A Mesa Final
Na mesa final havia mais coisa em jogo do que apenas dinheiro: o final do torneio teria implicações na corrida para Jogador do Ano da Card Player. Little começou o dia em quinto lugar no ranking. Clements começou em terceiro, e uma vitória o levaria para a segunda ou terceira colocação, a depender da de Little. Além disso, o quarto colocado no ranking do Jogador do Ano, Tom Schneider, acabava de chegar à mesa final de um evento válido por esse ranking em Indiana, botando ainda mais pressão. No começo da mesa final, as contagens de fichas eram as seguintes:

nº 1 Kofi Farkye $1.504.000
nº 2 Jonathan Little $2.616.000
nº 3 Jeff “ActionJeff” Garza $1.320.000
nº 4 David Cloutier $1.614.000
nº 5 Barry Greenstein $447.000
nº 6 Scott “BigRiskky” Clements $2.483.000

Jeff “ActionJeff” Garza — Sexto Colocado
O respeitado jogador da internet de 19 anos, Jeff “ActionJeff” Garza, é novato no circuito de torneios. Ele foi o primeiro eliminado, na seguinte mão: Clements aumentou da posição cutoff para $70.000 e Garza pagou. O flop veio 872, Garza pediu mesa, Clements apostou $150.000, e Garza refletiu durante quase um minuto antes de voltar all-in. Clements imediatamente pagou com seu A9nut-flush draw, e Garza mostrou 109. Qualquer esperança que Garza pudesse ter foi mandada embora quando o turn trouxe o 3. Ele foi eliminado em sexto lugar, o que lhe valeu um prêmio de $170.216 (dólares canadenses).

Kofi “Redsoxsox” Farkye — Quinto Colocado
O próximo a sair foi outro jovem de 19 anos, Kofi Farkye, que também foi vítima de Clements. Na última mão de Farkye, Clements aumentou do small blind para $80.000, e Farkye pagou do big blind. O flop veio 1087, Clements rapidamente pediu mesa, Farkye foi de all-in, e Clements pagou na mesma hora com 108. Farkye mostrou 65 O turn e o river não ajudaram, e a mão de Clements permaneceu sendo a melhor, o que lhe garantiu o pote e a eliminação de Farkye. A quinta colocação de Farkye lhe rendeu $218.849 (dólares canadenses). Durante a saída de Farkye, Barry Greenstein não resistiu e fez uma piadinha. “Eles estão saindo por ordem de idade”, disse , se referindo aos dois primeiros eliminados.

Barry Greenstein — Quarto Colocado
Infelizmente para Greenstein, sua observação não vingaria, pois uma derrota sofrida pelas mãos de David Cloutier o mandaria embora em seguida. Cloutier subiu para $140.000 do small blind e Greenstein voltou de all-in do big blind. Cloutier pensou por alguns instantes antes de decidir pagar com K9. Greenstein mostrou A9.O flop veio Q107, e Cloutier conseguiu odds adicionais para tentar acertar a gaveta. A carta do turn foi o K, dando a Cloutier a liderança e deixando Greenstein, ironicamente, esperando um Às no river (o título do livro dele) ou um valete para ganhar. A quinta carta foi o 5, e Cloutier levou o pote, eliminando Greenstein em quarto lugar, o que lhe valeu $291.798 (dólares canadenses). O sempre educado Greenstein parou por um momento para assinar uma cópia de seu livro para Cloutier, e, enquanto saía da mesa, foi ovacionado de pé pela sempre simpática torcida canadense.

David Cloutier — Terceiro Colocado
Nesse momento, o jogo estava entre os dois profissionais, Little e Clements, e o amador em seu primeiro torneio ao vivo, David Cloutier. Foram necessárias 137 mãos entre os três jogadores, o que equivaleu a exatas cinco horas, para que Cloutier fosse eliminado. Na mão final, Little aumentou do small blind para $180.000, e Cloutier empurrou all-in com seu $1,68 milhão restante. Little pagou com A10, Cloutier mostrou J9, e o bordo veio 863J3, dando a Little o nut flush e eliminando  Cloutier em terceiro lugar, com ganhos de $355.021 (dólares canadenses). Uma grande quantidade de conterrâneos dele o aplaudiram bastante enquanto ele deixava a arena, e a partida estava agora entre dois jovens talentos.

Heads-up — Jonathan Little Versus Scott Clements
Apesar de ter eliminado Cloutier, Little ainda precisava fazer força para encarar Clements, pois a contagem de fichas no início do heads-up era a seguinte:

Jonathan Little — $3.685.000
Scott “BigRiskky” Clements — $6.400.000

Devido à duração da batalha entre os três últimos, o mano-a-mano estava a apenas oito mãos de bater o recorde de maior quantidades de mãos jogadas em uma mesa final do WPT. O recorde anterior de 263 foi quebrado quando Clements desistiu do button na 264ª mão. A batalha do heads-up acabou quando Little foi eliminado na 271ª mão do jogo (o novo recorde do WPT). Do button, ele subiu para $180.000, e Clements pagou. O flop veio 755. O turn foi o 4, Clements pediu mesa, e Little apostou $250.000. Clements aumentou para $550.000, Little pensou por um momento antes voltar ir all-in, o qual Clements imediatamente pagou com Q5 Little mostrou K4 $680.862 (dólares canadenses). Clements levou o título do WPT North American Poker Championship, ganhou $1.361.724 (dólares canadenses) e um lugar no WPT Championship em abril de 2008. A vitória de Clements o colocou no terceiro lugar do ranking de Jogador do Ano da Card Player, enquanto a segunda colocação de Little lhe garantiu o segundo lugar.


Um Grande Risco Vale a Pena
Por Julio Rodriguez

Scott “BigRiskky” Clements disse à Card Player que sempre tentará um blefe se achar que pode fazer com que seu oponente desista. Talvez aquela tenha sido a mão do torneio (veja Dia 4: Definindo a Mesa Final). Clements executou um enorme blefe contra Cheryl Deleon na bolha da TV e mandou uma mensagem clara a seus oponentes com sua coragem e audácia. A Card Player teve a oportunidade de conversar com Clements e Deleon para entender o processo mental deles durante aquela mão.

Julio Rodriguez: Cheryl, você aumentou para $45.000 com AQ e Scott pagou. Que tipo de mão você achava que ele tinha?

Cheryl Deleon:
Quando ele pagou, imaginei que ele tivesse um par pequeno.

JR: Scott, o que lhe fez pagar com uma mão tão especulativa como 86?

Scott Clements:
Ela vinha jogando de forma muito sólida, e eu estava esperando um flop alto para tentar ganhar um grande pote. O fato de estarmos na bolha da TV aumentava a probabilidade de um blefe dar certo. Aparecer na TV é importante para muitos jogadores — às vezes mais importante do que a colocação.

JR: Então, o flop veio Q94 e Scott pediu mesa.

CD:
Nesse momento eu apostei $80.000, achando que a mão estava acabada e que iríamos para a próxima.

SC: Eu decidi aumentar apenas um pouco, para $175.000, pois não achava que ela fosse simplesmente pagar um aumento se tivesse uma mão grande como uma trinca, então eu descobriria imediatamente se o flop a tinha beneficiado. A aposta dela indicava que ela tinha jogo, mas que não estava em busca de muita ação – não por causa do montante, mas pela velocidade da aposta dela, e do comportamento que ela projetou para mim enquanto apostava.

JR: O turn chegou trazendo o 9, e Scott apostou. Scott, o que lhe fez apostar $300.000?

SC:
Eu sempre tento manter os estoques de fichas das pessoas na mente. Eu não sabia exatamente qual era o stack dela, mas sabia aproximadamente o quanto ela tinha. A aposta de $300.000 não iria comprometê-la com o pote, e, a não ser que minha leitura anterior estivesse errada, o 9 não ajudou a mão dela.

CD: Quando ele apostou $300.000, eu demorei um pouco antes de pagar. Eu estava tentando conseguir alguma informação dele, mas ele não me dava nada.

JR: O river foi o K, e Scott foi de all-in com $1,2 milhão. Cheryl tinha cerca de $1 milhão ainda. Scott, você já estava decidido a empurrar todas as fichas de qualquer maneira, ou estava esperando uma carta perigosa para poder fingir?

SC:
Eu iria continuar com minha leitura de que ela não iria de all-in na bolha da TV sem ter um monstro em mãos. Se uma dama tivesse aparecido no river, eu não teria voltado tudo, pois ela provavelmente a ajudaria. Eu achava que ela só pagaria se tivesse K-K e o river a tivesse dado um full house.

JR: Cheryl, depois de cinco longos minutos, você finalmente decidiu dar fold. Que fatores você levou em consideração no river?

CD:
Eu demorei muito cogitando cada possibilidade de combinação de cartas possível que ele pudesse ter que o permitisse apostar tão alto no river. Eu sei que, quando eu tenho uma mão forte na quinta carta, aposto alto, imaginando que, se pagarem a aposta, vale a pena maximizar o valor. Eu realmente não achei que ele arriscaria virtualmente todo o estoque na bolha da TV. Por fim, eu achei que ele tivesse J-10 e descartei minha mão.

JR: Nesse momento, Scott mostrou seu blefe e Cheryl com raiva bateu na mesa, revoltada. Scott, por que mostrar o blefe?

SC:
Uma razão para mostrar era induzir loose calls em minhas grandes apostas. Um blefe como esse é sempre raro para mim. Isso faz com que os jogadores sempre questionem minhas apostas. Eu também percebi como foi difícil para ela desistir, então achei que, se mostrasse, ela ficaria mais propensa a tomar decisões erradas no futuro, e eu teria uma chance em seis de lucrar com uma má decisão.




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