EDIÇÃO 5 » COMENTÁRIOS E PERSONALIDADES

Bad Run


Raul Oliveira

O que fazer na fase mais difícil do poker, a famosa bad run? Tudo dá errado: entram todas as quedas dos adversários (e quando é com você, nem em vinte mãos); você flopa uma trinca, o cara faz uma seqüência; você faz uma seqüência, ele acerta um flush; o seu flush bate, mas ele consegue um full...

A primeira coisa a se fazer é ter por perto algo que, ao ser jogado longe, não aumente ainda mais seu prejuízo. São incontáveis a quantidade de teclados, monitores e mouses danificados em função dos suckouts. Por isso, é sempre bom ter por perto algo que possa ser lançado com toda força e que não represente perigo.

Quanto ao jogo em si, penso que o mais importante nessas sessões é determinar um teto de perda. Por exemplo, você tem 5k de bankroll e normalmente oscila entre $300 para cima ou para baixo. Em um dia assim, provavelmente perderá $1.000 em pouco tempo. O desespero é imediato e a tendência de se encorajar e encarecer o jogo é enorme – mas se lembre deste artigo nessa hora, e não faça isso. O melhor é levantar de todas as mesas e respirar, nem que seja por 5 minutos, e o principal ao voltar para o jogo é fazer isso com metas e tetos. Sei o quanto é difícil parar numa session trágica, mas no dia seguinte você vai agradecer por ter interrompido. Assim como na situação citada, ao voltar, esteja decidido a apertar o botão de desligar e parar a sessão, caso perca mais $1.000. No dia seguinte os $3.000 terão muito mais valor para você, com certeza.

Então, meu conselho é que você volte em um nível mais barato do que de costume e jogue mais tight do que o normal. “Por que mais tight”? Porque nesse momento, a não ser que você se dê muito bem com as bad runs, sua confiança vai estar muito baixa e a tendência de jogar mal algumas mãos é bem grande; por isso, sendo mais tight que o normal, você só vai usar mãos fortes, que são mais fáceis de jogar do que as medianas. Outro conselho é “tentar” esquecer o cashier do dia anterior: tentar recuperar toda a perda no dia seguinte costuma ter o efeito contrário. Refazer o pacto com a vitória é mais importante nessas horas – mesmo que ganhe só 10% do que perdeu ontem, a sensação de vitória faz bem e ajuda a bad run a passar.

Outro aspecto importantíssimo é acreditar que não foi o escolhido pelos deuses do poker para perder, e muito menos que tudo que ganhou até esse momento tenha sido por sorte. Acreditar no seu potencial é imprescindível para se libertar da “urucubaca”. O problema é que às vezes as bad runs duram uma semana, duas, ou até meses, e saber lidar com isso se torna um grande dilema. Se você joga por hobby, tente parar um pouco – faça outras coisas e retorne quando a cabeça estiver fria. Mas, se jogar for o seu trabalho, é preciso encarar, e pelo menos minimizar as derrotas. Uma dica é jogar com alguém ao lado, mesmo que seu poker seja melhor que o dessa pessoa: ter alguém assistindo faz com que você jogue fora mãos que pagaria só por raiva do momento.

Entre os melhores jogadores de cash game do mundo, o grande diferencial no resultado deles gira em torno da forma com que cada um lida com suas bad runs. Tecnicamente, o nível é bem parecido; mas psicologicamente, não. Inclusive, numa de minhas viagens, um amigo meu, conversando com o Carlos Mortensen (que estava jogando um cash game pesado, só com bons jogadores), perguntou quem ganharia ali naquela mesa, já que todos eram bons competidores. Ele respondeu friamente: “quem sangra mais”. Numa mesa de profissionais, ao primeiro sinal de fraqueza de alguém, todos passarão a marcá-lo e testá-lo mais do que o normal. E até ele se levantar ou se recompor, o jogo só ficará mais difícil, devido à forma que os adversários passam a enxergá-lo.

Durante essas marés bravas, é muito comum você se deparar com jogadores que pagam seu AK com 22 até o river, passando a sensação de que se trata de um grande fish. Mas acredite, nesse momento o grande fish é você, e seu desespero por não conseguir levar mãos fica estampado na sua testa, ou pior, na sua forma de jogar. Por isso, caso não esteja em um estado emocional propício, reconheça que você é o fish e saia da mesa.

A notícia boa que dou neste artigo é que, assim como na vida, em que tudo passa, as “bad runs” também são passageiras: o problema é ter fôlego pra agüentar até esse dia. Acredite, um dos grandes segredos para se ganhar dinheiro no poker é aprender a perdê-lo... Espero que este artigo ajude nos momentos difíceis da carreira – e não se esqueça de ter ao lado do computador coisas leves que possam ser arremessadas.

Um grande abraço Raul Oliveira.




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