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Marcos Sketch: Poker, música e outras viagens

Facilidade na exposição de ideias. Raciocínio empresarial vanguardista. Vasto conhecimento sobre poker e música. Graças ao sucesso obtido em esferas tão distintas, Marcos Sketch vem constantemente sendo chamado de “gênio”. Isso, no meio do poker, é ainda mais raro do que no mundo real.


Marcelo Souza

Bastam cinco minutos de conversa com esse carioca de 31 anos para se tornar mais um dos que se convencem de que o termo é justo. Devorador voraz de livros de poker e audiófilo inveterado de bandas clássicas de rock, Sketch vem se mostrando um livre pensador, uma personalidade diferenciada em uma fauna povoada por idiossincrasias.

Ele é um dos responsáveis por um dos projetos de maior sucesso no Brasil, a Poker Villa, que reúne algumas das principais promessas do pano verde brasileiro em uma casa no Guarujá, litoral de São Paulo. Lá, esses jogadores são patrocinados, treinados e depois entregues ao campo de batalha com uma mentalidade técnica e profissional do jogo.

Com vocês, Marcos Sketch, falando de poker, música e outras viagens.

Você tem uma carreira como produtor musical. Imagino que isso tome grande parte do seu tempo. Onde foi que surgiu o poker nisso tudo?

Há três anos e meio, mais ou menos, eu estava muito focado no trabalho. Respirava música o dia inteiro. Todos os meus amigos e as pessoas que eu conhecia eram do meio. Depois de um tempo, você começa a buscar coisas diferentes. Na música, você trabalha com pessoas muito parecidas, que gostam das mesmas coisas. Já no poker, impera a heterogeneidade. Você se senta à mesa com pessoas que possuem histórias e culturas completamente diferentes, e acaba fazendo diferentes tipos de amizade. Uma hora com um ginecologista, outra com um policial, outra ainda com um jogador de futebol. Então, eu já tinha a vontade de buscar coisas diferentes para ocupar meu tempo. Meu primeiro contato foi com uma série de TV chamada Professional Poker Tour (PPT). Era uma liga de profissionais. Só participavam craques como Doyle Brunson, Erik Seidel, Daniel Negreanu etc. Eu assisti a três temporadas inteiras em um mês: uns três episódios por dia antes de dormir. Paralelamente, baixei o Party Poker. Pouco depois, descobri que um clube poker seria inaugurado ao lado do meu escritório.

Existem alguns jogadores que parecem ter nascido sabendo o caminho das pedras do poker, com uma espécie de compreensão natural do jogo. Alguns chamam isso de dom. Você se considera um desses sujeitos?

Muito pelo contrário. Eu não achava que levava jeito para o jogo. Tive que ralar muito para entender o poker da forma que eu entendo hoje. Muita gente conta aquela velha história: “Ah, depositei uma vez e depois nunca mais”. Eu quebrei várias vezes. Depositava $50 dólares e ia jogar SNG de $30. Quebrava mesmo. Por sorte, eu podia me dar a esse luxo de fazer alguns depósitos online.

Então descobri que uns amigos estavam organizando torneios. Na segunda vez que fui lá, ganhei. Fiz várias jogadas bizarras, mas fiquei muito feliz por superar 30 pessoas. Na época, faturei uns 600 reais, uma fortuna. Aí vem aquele sentimento de que você vai ganhar sempre. Decidi estudar o jogo, levar a sério. Foi quando comecei a jogar no La Torre. Foi lá que conheci Danilo Montiel, meu mentor no início, que acabou se tornando um grande amigo. Ele me dava várias dicas, me deixava sentar ao seu lado para observá-lo, contava histórias de mãos de torneios etc. Foi quando eu comecei a premiar grande parte das vezes.

Nessa época, eu comprei o Super System, livro do Doyle Brunson. Li muito rápido. E isso me deu certa vantagem sobre a concorrência. O poker ainda estava no começo, a galera ainda não tinha noção nenhuma e não havia tanto material disponível. Depois eu comprei os três volumes do Harrington no Hold’em. A essa altura, eu já tinha aprendido os fundamentos. Estudei muito. Isso, aliado ao fato de eu ter me dado bem, fez com que meu começo no poker live fosse lucrativo.

Pouco depois, comecei a frequentar os fóruns de poker: TwoPlusTwo, MaisEV e por aí vai. Foi quando li uma série de artigos do Tony “Bond18” Dunst chamada Things it took me a while to learn, algo como “coisas que levei um tempo para aprender”. Eu então me senti pronto para vencer online. Até então, eu não tinha jogo para vencer na internet, nem tinha muito costume de grindar online. É uma leitura que eu recomendo, que derruba vários mitos de torneios. Ali eu comecei a entender um dos principais conceitos do poker, o EV. Esse desenvolvimento foi o que me permitiu elevar meu nível de jogo, tanto live quanto online.

E esse lance de “Sketch1967”, que história é essa?

Sketch é um apelido que eu criei em 1995. Eu trabalhava com um grupo de design, desses que faziam arte em ASCII, e era único que não tinha um nick. E como Sketch tem a ver com desenho, eu gostei da palavra e peguei. Poucos anos depois, eu comecei a trabalhar com música e passei a assinar “Marcos Sketch”. Muita gente já me conhecia como Sketch, e eu achava que precisava mesmo de um nome forte para a carreira. Meu nome é Marcos Henrique Neves da Silva, muito comum. Assinando Marcos Sketch, as pessoas se lembrariam. E isso foi bem útil na minha carreira. O “1967” eu uso porque foi um grande ano na música mundial. Vários discos brilhantes foram lançados, como o Sgt. Peppers dos Beatles e o Pet Sounds, dos Beach Boys. Quando eu era adolescente, tinha uma fixação por esse ano. Até fiz uma música chamada "1967".

Entre tantos jogadores brasileiros de talento, as pessoas normalmente usam a expressão “gênio” para se referir a você. Em sua opinião, a que se deve isso?

Acho que tem a ver com a postura pessoal. Aprendi isso de forma muito clara no meu trabalho com a música. Para mim, o verdadeiro gênio do poker não sou eu, e sim Will Arruda, mas ele não trabalha o marketing pessoal. No meio artístico, você tem que aprender a se tornar uma pessoa mais aberta, precisa ser capaz de fazer amizades com facilidade, coisas desse tipo.

Com a música, por exemplo, eu percebi que o conteúdo de uma banda é muito menos determinante para o seu sucesso do que a forma como ela vai apresentar esse conteúdo. Assim, o carisma de um artista, a maneira como ele se porta e a maneira como ele concede uma entrevista são determinantes para o seu sucesso. É por isso que eu sempre instruo as bandas a agirem dessa forma. E eu mesmo procuro agir assim em tudo que eu faço. Mesmo quando o poker era só uma recreação para mim, eu sempre procurava trabalhar esse lado, a apresentação do conteúdo. Deve ser por isso que acabaram me chamando de gênio.

Já ficou bem claro que a música exerce muita influência nas suas ações dentro do poker. Mas e o poker, influencia sua música?

 Com certeza. O poker influencia não só minha música, como também minha vida. Volta e meia, eu solto no meu Twitter frases no estilo “coisas que eu aprendi com o poker”. Variância, EV e controle psicológico são conceitos que nos ajudam no dia a dia. Quando sua televisão quebra, por exemplo, você fica puto da vida e desconta em meio mundo. Mas quando você comprou, sabia que existia o risco de quebrar: isso é variância. No meu caso, o poker me tornou uma pessoa muito mais serena. Eu não vou tiltar se um show do Forfun for cancelado, sabendo que amanhã eu posso perder um coin flip no EPT valendo milhões de dólares. O poker lhe ensina a dimensionar melhor as coisas.

Você desenvolve muitos projetos ao mesmo tempo. Como anda sua rotina hoje em dia?

Bem desgastante, mas boa. Eu estou me dividindo entre empresário do Forfun, compositor, jogador de poker live e online, e gerente e treinador do projeto. Graças às pessoas que trabalham comigo, tenho flexibilidade para cumprir todas as minhas funções.

Talvez seu principal projeto hoje seja a Poker Villa, com Caio Brites e Will Arruda. Como começou tudo isso e como se deu aproximação com eles?

Meu primeiro contato com Caio foi no satélite em que eu havia puxado a vaga para o Nordeste Poker Fest. Eu notei que um tal de “CaioDream” estava infernizando a mesa, jogando muito mesmo. Lá no torneio, acabamos ficando na mesma mesa e mais tarde fizemos mesa final juntos. Chegamos a trocar porcentagens no prêmio. Mas nossa parceria mesmo começou depois que Vitor Brasil, que jogava ao vivo comigo na época, falou de mim para Caio. Eu era usuário do fórum MaisEV, e começamos a conversar. Foi então que decidimos criar nosso próprio fórum, o 4Bet.

Eu conheci Will através de Caio. Eles já tinham o SNG Team Pro. E foi aí que meu jogo deu outro salto de qualidade. Will é o maior estudioso de poker no Brasil. Ele respira o jogo. Se ele não está dando aula, está jogando. Se ele não está jogando, está estudando. Ele assina todas as escolas de vídeo. Se ele está jogando contra alguém que faz uma jogada boa, ele vai atrás do cara e questiona o porquê daquela jogada. Eu passava horas – e ainda passo – conversando com ele sobre o jogo. Foi uma época bastante interessante.

Juntos, vocês três estão patrocinando 23 jogadores, incluindo os da Poker Villa. Como surgiram esses projetos de “cavalagem”?

Começou através de Caio e Will. Eles já tinham o SNG Team Pro, que era um projeto de coaching e cavalagem, mas queriam fazer algo relacionado a torneios. Então, nós três decidimos pegar uma grana e investir em alguém. O escolhido foi Fabiano “Kovalski”. Ele era do time de SNG, estava muito bem, e nós achávamos que ele poderia bater os torneios high-stakes da internet. Resolvemos cavalar Kovalski em uma grade de torneios mais caros, com buy-ins acima de $100 dólares, e ele foi muito bem. Em dois meses, lucrou mais de US$ 50 mil, enquanto nossa expectativa era de 8 ou 10 mil. Foi então que chamamos Vitor Brasil, que também é um jogador fantástico, um dos melhores que conheço. O Vitor também começou muito bem. Como as coisas vinham dando certo, decidimos colocar mais uns 8 cavalos. Aí vieram Thiago Crema, Rafael Moraes, “Tuba” e “Japa”. O projeto cresceu, virou referência no Brasil e hoje, se você olhar, os principais jogadores online do Brasil são cavalos nossos.

Quanto ao 4Bet Team, em que vocês selecionaram jogadores para disputar torneios live, o projeto deu certo? Que avaliação você faz?

A ideia surgiu como uma maneira de divulgar o fórum, mas precisava ir além. A gente já tinha o projeto dos cavalos online, mas queríamos fazer algo mais. Quero deixar claro que muito do que fazemos é pensando no crescimento do poker nacional como um todo. Mas não é porque nós somos bonzinhos ou filantropos, e sim porque acreditamos que o crescimento do esporte vai trazer mais torneios e mais investimentos e, consequentemente, um retorno maior para todos que trabalham no ramo, inclusive nós mesmos. Então, juntamente comigo, Will e Caio, participaram do projeto Igor Federal e Jorge Breda.

O time era bem mesclado, com 12 jogadores.  Colocamos uma mulher, Larissa Metran, alguns jogadores da nova geração do online e uns caras mais conhecidos do circuito live, além de um sujeito da mídia, Guilherme Kalil, que não era grinder, mas na época apresentava o podcast da CardPlayer Brasil. Era um investimento arriscado, de R$ 200 mil, mais ou menos. Sabíamos que não ganharíamos muito dinheiro com aquilo, mas também não queríamos perder.

Vocês conseguiram recuperar o investimento? Há chances de uma “segunda edição”?

Conseguimos sim, mas só aos 45 do segundo tempo, com a cravada do Stetson na penúltima etapa do BSOP 2010, em Salvador. Tivemos mesas finais e ITMs durante o ano, mas o lucro foi bem pequeno. No final das contas, atingimos nosso objetivo, que é o que importa. Nós nos divertimos muito, divulgamos o fórum e só não fizemos de novo esse ano porque estamos muito focados no projeto do online. No futuro, quem sabe não pinta alguma coisa de novo? Mas, a princípio, não há nada de concreto.

Você disse estar bastante focado no projeto online. Pode adiantar alguma coisa sobre isso?

Bem, nós temos nos preparado bastante para o crescimento desse projeto. Hoje, a maioria dos nossos jogadores disputa os torneios mais caros da grade. Se não tem como crescer mais em relação aos buy-ins, temos que crescer no número de jogadores, mas sem deixar de lado a qualidade. O grande trunfo do nosso projeto são as aulas, a formação técnica que damos aos jogadores. No mundo inteiro, existem apenas três ou quatro projetos maiores que o nosso, no que diz respeito ao valor médio do buy-in e ao número de jogadores. O maior deles, de Cliff “JohnnyBax” Josephy e Eric “Sheets” Haber, que inclusive patrocinou Joe Cada, campeão da WSOP 2009, coloca cerca de 50 jogadores só no Main Event da WSOP. Ou seja, eles investem meio milhão de dólares em um único torneio.

Nosso projeto é diferenciado por oferecer todo o treinamento para o jogador. Por que um cara como o Kovalski, que já forrou uma nota preta, ainda não saiu? Porque ele sabe que vai aprender muito mais conosco, e que vai ter oportunidade de jogar torneios mais caros totalmente dentro da sua zona de conforto, sem ter que se preocupar em ganhar para pagar as contas no final do mês. Para a WSOP desse ano, levaremos “Kovalski”, “Zareta” e “disgueh” para disputar alguns torneios.

Tem jogador no time que já chegou a ficar US$ 100 mil negativo, mas como o bankroll é do projeto e não de um jogador apenas, conseguimos arcar com essa variância. Há todo um suporte para cada jogador. É como a formação de um atleta.

Em breve, haverá mais jogadores entrando para o time. Já estamos pensando em algumas maneiras de selecionar. Por enquanto, os jogadores entram por indicação ou quando nós achamos alguém com talento por aí. O que posso adiantar é que estamos analisando a viabilidade de criar um projeto no estilo Poker Villa, só que no Sul do país.

Você tem se mostrado um profundo conhecedor do poker, um livre pensador do jogo. O que você julga ser realmente necessário para vencer?

Aprender a jogar não é tão difícil. Em três horas, eu lhe ensino tudo que sei. Falo todos os conceitos. Se você vai aprender ou não é outra história. Agora, é possível pegar um desses conceitos, por exemplo, “balancear o range”, e falar cinco horas sobre ele. Faço isso nas minhas aulas na Poker Villa, e mesmo assim não é o suficiente. Algum tempo depois, tenho que voltar lá e falar novamente sobre “balancear o range”.

Se você ler os livros e acompanhar os fóruns, aprenderá tudo sobre o jogo. O poker é limitado: só permite apostar, pedir mesa ou correr. Quando você joga em um nível alto, todo mundo sabe o que você sabe. Então, para lucrar, não basta jogar certo, é preciso jogar melhor do que o seu adversário. E como você joga faz isso? Explorando os pontos fortes do seu próprio jogo. Se você é melhor pré-flop, por que levar a briga para depois do flop? Poker é isso. Às vezes você vai estar por baixo, aplicar uma bad beat, mostrar uma feiúra. Apenas jogar corretamente não é o bastante para ser vencedor no poker.




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