EDIÇÃO 4 » ESTRATÉGIAS E ANÁLISES

Jogando com mãos marginais


Hugo Mora

O poker é um jogo em que se enfrenta outras pessoas. Você não está simplesmente colocando fichas em um número e torcendo para que a bolinha da roleta caia nesse número. Também não pega uma cartela e torce para que os números sorteados estejam na sua cartela – não é como roleta, bingo ou mega sena. No poker, tudo que você precisa fazer é jogar melhor do que os adversários, os quais, assim como você, são de carne e osso.

Eles têm que tomar decisões, mas nem sempre fazem isso de forma correta. Você também precisa agir e, para ser um vencedor, deve realizar jogadas com base em uma lógica racional.

Ao se sentar em uma mesa com outros nove jogadores, suas chances de vencer não serão de 10%: elas dependerão do quão superior você é em comparação aos outros jogadores. Se for bem melhor que os outros, suas chances poderão ser de 20%, 30% ou até mais. Sendo pior, é provável que sejam menores que 10%.

É claro que, mesmo jogando com perfeição, não há como vencer sempre. As cartas variarão a cada dia, mas, ao longo do tempo, você receberá tantas cartas (sejam boas ou ruins) quanto qualquer outra pessoa. O que se faz com elas é que determina se você é um vencedor ou um perdedor: não será a sorte que ditará seu sucesso no poker.

Um dos principais erros de um jogador iniciante é entrar no pote com mãos marginais. Muitas vezes ele conseguirá algo no flop, mas terá decisões difíceis quando encontrar resistência dos adversários. Saber com quais jogar e com quais correr fará a diferença entre ganhar e perder – principalmente para os novatos.

Não existe uma fórmula que diga exatamente com que mãos se deve entrar no pote em determinada posição. No livro “Hold’em Poker for Advanced Players”, os autores David Sklansky e Mason Malmuth explicam que “as mãos iniciais sobem e descem no ranking dependendo das circunstâncias. Por isto, jogar apenas de acordo com o ranking das mãos iniciais pode ser um erro”. Os bons jogadores conseguem ajustar suas mãos iniciais de acordo com vários fatores: posição na mesa, existência de ação na mesa, se os jogadores são loose ou tight, agressivos ou passivos etc. Então, o ranking de mãos deve servir apenas como um guia, adaptando-se a cada situação.

No poker online, sobretudo em torneios baratos, existem muitos jogadores que entram nos potes com mãos bastante marginais. Procure sempre explorar os erros cometidos por eles: nem sempre dá certo, mas, quando eles acertam algum tipo de jogo, geralmente vão até o final e muitas vezes entregam todas as fichas. Abaixo coloco três exemplos, todos ocorridos no mesmo torneio. Nos dois primeiros eu dobrei meu stack; no terceiro, fui eliminado.

Exemplo 1: Estágio inicial de um torneio de $11. A mesa estava com nove jogadores, eu era o cut-off e recebi AK. Um jogador em posição intermediária aumentou para quatro big blinds. Apenas paguei e todos os outros correram. O flop trouxe A82. O adversário saiu disparando metade do pote. Como não havia possibilidade de flush ou seqüência, resolvi dar um slowplay, já pensando em dar um reraise caso ele apostasse no turn. O turn trouxe um 7, colocando duas cartas de espadas na mesa. Dessa vez o adversário apostou o valor do pote e eu voltei all-in. Ele pagou imediatamente e mostrou um A6. O 4 no river dobrou meu stack e deixou o adversário bem machucado.

Exemplo 2: Cerca de quarenta mãos depois da anterior, recebo QQ no big blind. O jogador em UTG+2 aumenta para 5 big blinds. Eu havia acabado de ser mudado para essa mesa, e não tinha a mínima idéia do estilo desse jogador. Todos fogem e eu resolvo dar um reraise nele, colocando 12 big blinds. Ele paga. Já descartei a possibilidade dele ter AA ou KK pois provavelmente ele teria voltado um reraise. No flop temos Q58. Com a trinca de damas peço mesa, na esperança que ele aposte alguma coisa. Para minha surpresa ele resolve colocar all-in, que era aproximadamente três vezes o valor do pote. Eu pago imediatamente e ele mostra Q10, sem nenhuma chance de vencer a mão.

Exemplo 3: Restando apenas quatro mesas neste torneio que começou com quase 2000 jogadores, os blinds já estavam muito altos (5K/10K). Na posição do cut-off, recebo AK. A mesa roda em fold e eu aumento para 45K, deixando 120K em meu stack. Apenas o big blind paga. O flop traz K83, colocando três cartas de espadas na mesa. O big blind entra de all-in. Com o top pair e o melhor kicker, e após gastar quase todo meu tempo pensando, resolvo pagar. Ele mostra K8, fazendo dois pares. E é o fim do torneio para mim.

Nos três exemplos que coloquei acima, o adversário entrou no pote com mãos marginais. Muitos jogadores iniciantes gostam de jogar com quaisquer duas cartas do mesmo naipe, e isso ocorreu nas três jogadas. Em todas elas eu tinha um jogo forte antes do flop e os adversários tinham mãos dominadas. Um dos maiores perigos de se entrar no pote com mãos desse tipo é a de se estar dominado por alguém com uma mão melhor. Infelizmente, na última delas, o adversário acertou dois pares no flop, o que resultou em minha eliminação do torneio. Mas é bem provável que se apenas o K aparecesse no flop, ele também tivesse colocado all-in e meu stack dobraria, me dando melhores chances de chegar ainda mais longe nesse torneio.

Quando perco mãos assim, principalmente em estágios mais avançados de um torneio, fico muito chateado e acabo me questionando se estou jogando da maneira correta ou não. Reflito bastante sobre a mão. Algumas vezes chego à conclusão de ter cometido um erro, mas quase sempre vejo que joguei de forma correta, ou seja, que a jogada feita me levará a ter bons resultados no longo prazo.

Aos novatos, sugiro que escolham melhor as mãos com que entram no pote.  Em torneios de no-limit hold’em, qualquer mão poderá ser sua última: é uma questão de sobrevivência, e geralmente os melhores é que sobrevivem. Ao entrar nos potes com mãos marginais, você poderá colocar o torneio em risco. Muitas vezes acertará algum jogo, mas enfrentará adversários com mãos ainda melhores. As decisões serão difíceis e muitas delas levarão ao mesmo resultado: sua eliminação!




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