Em minha primeira viagem para disputar um torneio internacional, o Evento 45 da WSOP 2010, pelo BestPoker Team Brasil, tive a oportunidade de jogar na mesma mesa de um Top Pro, o francês Bertrand Grospellier, o “ElkY”. E me sentei logo depois dele, com vantagem de posição. Como tirar proveito disso, jogando em uma mesa assim?
Um jogador como ele tem a tendência de querer dominar a mesa, entrar em vários potes baixos e exercer seu jogo agressivo. E isso é ajudado pelo fato de muitas pessoas quererem confrontá-lo, afinal, ele é uma estrela.
Enquanto os holofotes estavam em sua direção, eu estava ali, observando seus showdowns, tentando achar algum padrão de apostas e praticando um jogo tight. Ele percebeu isso. Mas, no poker, temos que sempre estar em um passo à frente, ou um “level” a mais. Quando ele se deu conta disto, eu já estava voltando reraises nele quando a mesa rodava em fold e ele abria raise com quase qualquer mão.
Ter um Top Pro a sua direita lhe dá a chance de ganhar fichas que você não puxaria se ele não estivesse ali. Por exemplo, muita gente pagava um raise dele com jogos mais fracos, mas davam fold diante do reraise de um jogador “tight”. E o alvo dos holofotes (que não queria se envolver em potes grandes) também saía. Mas, já que ele é tão fera, será que não notaria isso? Sim. Assim, eu teria que realmente assumir uma postura tight perante os outros jogadores, e também evitar bater de frente com o ElkY a todo o momento, senão eu entraria na mesma onda daqueles que estavam à mesa para perder no longo prazo jogando contra um top.
Eu me lembro de uma hora em que tinha um jogador que entrava sempre de limp na posição 2, e o Elky, na posição 7, sempre aumentava para ganhar em uma continuation bet. Isso aconteceu três vezes. Na quarta, olhei para minhas cartas, vi um J-Q e voltei reraise. A mão não importava, minha intenção era levar o pote ali mesmo. Imagine um torneio que comeca com 4.500 fichas (não era das melhores a estrutura do evento, mesmo sendo a WSOP), com blinds em 50-100, um jogador passivo dá limp de 100 e um agressivo dispara 325. Pronto, o pote já tinha ido para 555, mais de 10% do meu stack! Aumentei para 850 e não tive tempo nem de olhar para frente direito: os dois deram fold rapidinho.
Nessa brincadeira, quase dobrei meu stack inicial sem showdown. Mas é preciso lembrar-se de alguns fatores que tornam vantajoso jogar contra uma estrela para ganhar algumas fichas a mais:
– ele deve estar altamente participativo
– você deve estar com uma imagem tight
– você não deve banalizar a jogada, pois ele entenderá sua tática e se ajustará a ela
– outros jogadores apenas querem dar call no superstar, mas não querem confrontar reraises de jogadores “anônimos”
– não se atole na jogada, pois tecnicamente se trata de um resteal, então a ideia é levar a mão ali mesmo
Como você pode notar, não é a força da sua mão que importa aqui, mas sim a oportunidade. Por exemplo: ele sempre aumenta de determinada posição quando a mesa roda em fold. Obviamente, ele pode estar recebendo jogos bons, mas isso é improvável.
O fato de uma estrela estar presente na sua mesa realmente muda todo o cenário. Ele é o foco. Mas não se esqueça de que você também tem personalidade e de que seu jogo não pode mudar muito por causa disso – você deve apenas adaptar-se à situação. Se quisermos ser estrelas do poker também, devemos ter sempre um arsenal de jogadas, afinal, não estamos aqui para ser coadjuvantes. As fichas são nossas, não deles.
Para finalizar nossa pequena conversa deste mês, uma frase do dramaturgo baiano Dias Gomes: “Ao inimigo não só deve-se dar a estrada para fugir, como até construir”. ♠