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Mike Sexton: Hall da Fama

O Embaixador do Poker reconhecido por suas contribuições ao jogo


Stephen A. Murphy

Com os bolsos vazios e o coração partido, um jovem Mike Sexton voltou para casa. Sua mãe o olhou e balançou a cabeça.

“Deixe-me lhe dizer uma coisa”, ela falou ao filho de 13 anos, que tinha acabado de perder todo seu pagamento semanal em outro jogo de cartas. “Se você é idiota o suficiente para se levantar e trabalhar a semana toda e depois voltar aqui e dar seu dinheiro, você não merece ter dinheiro”.

Sexton sorriu enquanto recordava essa história. “Foi uma lição divertida que eu nunca esqueci”, disse ele.
O profissional de 62 anos evoluiu muito desde os tempos em que era entregador de jornais nos subúrbios de Dayton, Ohio. Aquele garoto cresceu para se tornar uma das pessoas mais respeitáveis da indústria do poker, não apenas por suas habilidades na mesa, mas por sua incansável promoção do jogo que ele ama.

Em 7 de novembro, Sexton foi incluído no Hall da Fama do Poker, tendo se tornado o 38º membro a se juntar a esse seleto grupo.

Um Mau Começo Para Uma Incrível Carreira
Hoje, ele é mais conhecido por sua inconfundível voz no World Poker Tour, onde comenta a ação desde 2003. Mas também esteve na fronteira do poker online no começo da década, navegando no PartyPoker desde sua pequena estreia até sua histórica ascensão.

Sexton não estava apenas por perto durante o boom do poker; ele ajudou a moldá-lo.

Mas antes de se tornar um dos mais famosos embaixadores do feltro, ele era apenas um garoto de Ohio que não conseguia segurar seu dinheiro.

“Danny Robison me ensinou a jogar poker. Ele me incentivou durante todo o tempo de escola”, disse Sexton, que não achava que tinha muitas habilidades no poker, já que não conseguia vencer sequer a concorrência local.

Obviamente, ele não sabia que a “concorrência local” era um dos melhores jogadores de seven-card stud  e gin rummy do mundo. Alguns anos mais tarde, Robison fez parceria com outro nativo de Ohio — Chip Reese — e os dois se mudaram para Las Vegas e logo destruíram nas mesas de lá, tornando-se mais conhecidos como os Gold Dust Twins, pois ganharam mais de $1 milhão no primeiro verão.

Sexton então foi para a faculdade, graças a uma bolsa desportiva, inconsciente de quão bom ele na verdade era no poker. Mas em Ohio State ele rapidamente percebeu que tinha potencial.

“Eu logo vi que era melhor que esses caras em todos aqueles jogos”, disse Sexton. “Foi aí que percebi que tinha um verdadeiro dom para as cartas que os outros caras não tinham”.

Nos seus dois últimos anos na Ohio State, Sexton jogava bridge ou poker “literalmente todo dia”.

Ainda assim, ao se formar, ele não tinha grandes sonhos de seguir os passos de Robison ou Reese e ir para Las Vegas. Ele escolheu uma profissão mais prática e tradicional.

“Eu entrei para o exército e fui enviado para Fort Bragg, na Carolina do Norte”, afirmou Sexton. Paraquedista da 82ª Divisão de Aerotransporte em 1970, Sexton nunca serviu fora do país, pois sua divisão tinha acabado de voltar do Vietnã quando ele chegou. Quando terminou de servir ao exército, ele permaneceu na Carolina do Norte atuando como vendedor de uma companhia de base militar.

Um Homem de Muitos Talentos Escolhe Uma Nova Profissão
Mas mesmo numa rotina semanal normal de trabalho, Sexton não deixou de encontrar os jogos de poker locais.

“Eu comecei nos jogos caseiros da Carolina do Norte”, ele disse. “E eu me dava muito bem nessas mesas”.

Embora estivesse se dando bem no poker, ele não andava tão bem em outras áreas da sua vida. Ele tinha se casado: “Então durante três anos mais ou menos, eu era um homem de família, trabalhador comum”, falou. Mas à medida que as noites fora de casa se acumulavam, também se acumulava a tensão que isso trazia a seu casamento. Ele e sua primeira esposa se divorciaram. “Eu jogava muito”, Sexton admitiu.

Era doloroso para Sexton deixar os suculentos jogos noturnos de modo a dormir para poder ir trabalhar, principalmente porque agora ele estava ganhando mais dinheiro jogando poker do que no seu emprego.
Então, em 1977, resolveu desistir. Ele achava, que, se o poker não desse certo, ele poderia voltar e procurar outro emprego.

“Foi assim que eu abandonei o mundo real e comecei a jogar poker profissionalmente”, disse Sexton. “E durante os próximos 20 anos, eu literalmente não recebi um salário”.

Embora ele tenha visitado Las Vegas e ocasionalmente se hospedado com Robison e Reese, demorou um pouco para que ele fizesse sua estreia na World Series of Poker.

Sexton era um dedicado técnico de beisebol da Little League, e suas temporadas coincidiam com a World Series. Mas depois de oito anos como profissional na Carolina do Norte, ele decidiu que era hora de tentar. Então tirou uma semana de folga de suas atividades da Little League em 1984 e foi para a WSOP.

“No Lugar Certo na Hora Certa”

“Naquele tempo, eles tinham apenas um evento dia sim, dia não na World Series of Poker”, Sexton explicou. Assim, durante sua estadia de uma semana em Las Vegas, ele tinha três oportunidades para aproveitar ao máximo.

Nos três eventos que jogou, Sexton fez duas mesas finais.

“Por causa do sucesso que tive, eu disse: ‘Quer saber? Se vou jogar poker profissionalmente, talvez devesse me mudar para Las Vegas’”.

E, assim, o profissional de jogos caseiros da Carolina do Norte agora residia em Las Vegas.

Com um apetite insaciável por torneios, Sexton logo se tornou assíduo nas competições, e causou furor em 1989 quando começou a usar trajes “La Mode” em todos os seus eventos.

“Era um patrocínio pequenino, mas eu vestia em todos os torneios”, disse Sexton sobre a linha de roupas. “Todo mundo meio que ria de mim, dizendo: ‘Olhe esse cara. Que palhaço’. Mas eu via grandes coisas para o poker”.
Phil Hellmuth, que entrou
no Hall da Fama do Poker há dois anos, lembra-se bem do patrocínio de Sexton.

“Eu me lembro que ele tinha o patrocínio da La Mode. Não era muito dinheiro, mas ele estava lá, usando”, disse Hellmuth. “Além de ser um ótimo jogador, ele foi um dos primeiros caras a trazer patrocínio para o poker”.

Sexton dizia a qualquer um que ouvisse que grandes coisas iriam acontecer com o jogo, e chegou até mesmo a ganhar uma capa na revista Card Player em 1992 por aquele patrocínio. As previsões de Sexton naquela edição se concretizaram.

Ele falou sobre o potencial do poker na TV, dizendo: “As cartas de cada jogador seriam mostradas em uma tela para os telespectadores. Saber as mãos e assistir a alguns dos grandes blefes seria muito empolgante. [...] Seria muito popular”. Mais de uma década antes da explosão do poker, muitos de seus competidores achavam que esse entusiasmo era inocência.

“Eu sempre acreditei que o poker pudesse crescer. É o verdadeiro passatempo americano”, afirmou Sexton. “Nos anos 80, quando eu dizia isso aos jogadores, todo mundo ria de mim. Nenhum outro jogador, a não ser Phil Hellmuth, achava que eu sabia do que estava falando”.

Depois que Sexton venceu um grande torneio no Four Queens in 1996, Linda Johnson, a dona da Card Player na época, perguntou se ele estava interessado em escrever para a revista. Sexton concordou, e escreveu uma coluna regular durante 10 anos.

Ele credita à Card Player o empurrão que o ajudou a executar seu projeto seguinte — o Torneio dos Campeões.

“Eu sempre achei que o poker devesse ter um evento comparável ao Torneio dos Campeões no golfe”, disse Sexton. “Eu tinha essa visão de que você precisaria ganhar um torneio no calendário daquele ano para participar. Você não poderia adquirir um buy-in”.

Portanto, Sexton embarcou em uma missão pessoal de criar esse novo torneio para o poker no final dos anos 90. Mal ele sabia que estava na trilha para se tornar um dos jogadores mais ricos de todos os tempos.

“Eu estava no lugar certo na hora cerca para criar o Torneio dos Campeões”, falou. “E a criação desse evento me conduziu a um emprego no PartyPoker e no World Poker Tour”.

O Torneio dos Campeões e o Nascimento do PartyPoker
Sexton viajou pelo país, e até além-mar, no final dos anos 90, para convencer os gerentes de sala de poker a enviar jogadores para esse evento exclusivo. As regras eram simples: se alguém tivesse ganhado um torneio com buy-in de $200 ou mais no calendário daquele ano, ele ou ela estariam aptos a jogar.

“Mas para conseguir todos os grandes jogadores — porque eu queria caras como Chip Reese e Doyle Brunson, que não jogavam torneios — eu criei a regra segundo a qual, se você tivesse ganhado um bracelete da World Series of Poker, estaria automaticamente apto”, disse Sexton.

Tanto jogadores quanto cassinos não acreditavam no evento. Sexton disse que cinco cassinos o rejeitaram antes que o The Orleans concordasse em sediar o evento.

“Todo mundo pensava: ‘Ah, cara, ninguém vai vir para esse torneio’”, Sexton recorda, pois ele insistia que o campeonato fosse no formato mixed games. “Bem, eu achava que provavelmente 90% das pessoas aptas a jogar viriam e jogariam. Tínhamos cerca de 700 participantes”.

Brunson foi o anfitrião do primeiro Torneio dos Campeões como favor a Sexton, e ainda se lembra de como o evento foi popular.

“Foi um torneio excelente, uma ótima ideia e muito bem executado”, disse Brunson. “Ele ainda devia acontecer”.

Brunson afirmou que ficou muito feliz quando Sexton entrou no Hall da Fama, dizendo que ele era o maior apoiador de Mike.

“Mike tem feito tanto pelo poker ao longo dos anos. Ele viajou pelo país às próprias custas muitas vezes para promover o poker”, afirmou Brunson. “E mais importante do que o que ele fez após o boom do poker foi o que ele fez antes de o poker explodir. É isso que o torna único”.

Embora o Torneio dos Campeões tenha sido bastante popular entre os jogadores, ele não conseguiu angariar fundos, e teve fim depois de três anos. Contudo, o evento chamou atenção para Sexton numa época em que o poker online estava apenas engatinhando.

Em dezembro de 2000, Sexton recebeu um telefonema em que foi questionado se já estava envolvido com algum site de poker online. Ele disse que não, e, em duas semanas, estava ajudando a desenvolver o software do PartyPoker.

Sexton afirmou que tudo aconteceu muito depressa. Ele conheceu Ruth Parasol, a dona do site, que tinha uma pergunta urgente para ele: “Se nós lhe contratarmos, você pode estar na Índia em 10 dias?” Sexton disse que sim, e, nove dias depois, ele estava diante de meia dúzia de programadores de software na Índia. Nenhum deles fazia ideia de como se jogava poker ou de quais eram as regras, mas os empresários achavam que poderiam ganhar dinheiro com essa “coisa de poker”.

Sexton explicou o jogo aos programadores, e, depois de quatro meses ajudando-os a construir o site, a companhia o enviou para a República Dominicana para começar tudo de novo com o atendimento ao consumidor.

Foi a primeira vez que ele encontrou o diretor executivo da empresa, Vikrant Bhargava.

“Eu tinha acabado de voar cerca de 20 horas e, assim que cheguei lá, a primeira coisa que Vikrant me perguntou foi: ‘OK, nós temos o site. Como conseguimos jogadores?’” Sexton recorda.

Sexton disse que foi ideia dele criar o PartyPoker Million, um grande torneio de poker em que os jogadores competiriam por um primeiro prêmio de $1 milhão, e a única maneira de se qualificar era por meio de satélites de $20 no site.

Os executivos da companhia não ficaram nada contentes com a ideia.

“Tenha em mente que, quando eles começaram o site, fizeram um orçamento de apenas $500.000 para o site todo”, Sexton explicou.

Embora a maioria das pessoas presentes tenham recusado a ideia, Sexton ganhou o apoio de Bhargava, e o PartyPoker Million nasceu.

A Explosão do PartyPoker e o World Poker Tour

Steve Lipscomb abordou Sexton e o PartyPoker propondo filmar o evento deles. Animados com a oportunidade de ganhar publicidade extra, eles aceitaram, e o torneio foi exibido no Travel Channel.

Sexton disse que não havia dúvidas em sua mente que os índices de audiência do programa ajudaram o World Poker Tour a fechar um contrato subsequente com o Travel Channel. E, é claro, quando o World Poker Tour entrou no ar, tanto Sexton quanto o PartyPoker receberam propostas tentadoras.

Sexton aceitou o emprego de comentarista do WPT. E o PartyPoker, vendo um novo programa de TV sobre poker que tinha como apresentador seu principal porta-voz, viu uma oportunidade ainda maior. A empresa comprou o máximo de espaços de publicidade que podia tanto para a data de exibição original quanto para as reprises do programa — todas por um valor acessível.

“Para falar a verdade, nós pagamos menos por um anúncio na televisão naquela época no Travel Channel que seria visto por toda a nação do que pagávamos por um anúncio de página inteira na Card Player”, disse Sexton. “Eu acredito que, na história da televisão, ninguém jamais conseguiu um valor melhor em um anúncio televisivo. Com apenas duas semanas de exibição do programa, nós multiplicamos nossos negócios por 10, e nunca mais paramos, tendo nos tornado o site nº 1 do mundo”.

O World Poker Tour foi o programa nº 1 do Travel Channel por cinco anos. Atualmente em sua oitava temporada, ele hoje é exibido pelo canal FSN.

Olhando Para Trás e Andando Para a Frente
Sexton não se arrepende de nada em relação à sua época no PartyPoker (ele chama o período de “a decisão mais inteligente que eu já tomei na carreira”), mas uma coisa que o incomoda foi ter aberto mão de suas ações na companhia. Com as frágeis leis dos EUA, ninguém sabia ao certo o que significaria ser um acionista norte-americano, então Sexton concordou em vender suas ações.

Quando a companhia foi vendida por quase $9 bilhões, Sexton deixou de ganhar de $600 milhões a $700 milhões.

“Eu me lembro de chegar ao Bellagio [naquele dia] e Mike Matusow se levantar e gritar na sala de poker: ‘Hey, Mike, como você se sente tendo perdido $600 milhões?’ Todo mundo riu, e foi meio engraçado”, Sexton recorda.

Sexton é anfitrião e consultor do PartyGaming.
Depois de refletir sobre suas décadas como jogador, Sexton tem dois grandes conselhos para os jovens jogadores que tentam ganhar a vida em Las Vegas: jogue mais cash games, que lhe dão uma taxa de vitória mais consistente do que torneios, e cuidado com seus vícios.

Tendo visto muitos jogadores talentosos sucumbindo a seus vícios, incluindo seu grande amigo Stu Ungar se render às drogas, Sexton também adverte os jovens sobre as armadilhas de Las Vegas. Ele chegou até a mencionar seu próprio vício em apostas esportivas, que lhe deixou quebrado durante décadas, apesar de seu bom desempenho no poker.

“Se você tiver algum vício, não importa qual seja — drogas, apostas em jogos de azar, apostas em esportes, apostas em corridas de cavalos, prostitutas, álcool em excesso — ele vai lhe encontrar em Las Vegas”, afirmou Sexton. “Eu jamais tive outros vícios. Eu nunca bebi, nunca usei drogas, nunca tive problemas com outros jogos nos cassinos. Basicamente, durante toda a minha vida, eu tive um vício, que eram os esportes. Eu não me orgulho disso, e perdi uma fortuna com isso”.

Olhando para o futuro, ele acha que a evolução do aspecto beneficente do poker é o próximo grande passo. Embora aplauda os esforços individuais que tantos jogadores realizam para ações de caridade, ele acha que a indústria devia organizar ações beneficentes de modo que o público veja a quantidade de dinheiro que os jogadores de poker doam para causas nobres. Isso, diz ele, atrairia grandes patrocínios, geraria prêmios maiores e tornaria o poker mais aceito, mesmo por aqueles que não jogam. Foi por isso que ele criou o pokergives.org juntamente com Linda Johnson, Jan Fisher e Lisa Tenner.

Olhando em retrospecto para sua carreira de jogador, Sexton disse que se orgulha em especial de seu bracelete ganho na WSOP 1989 e de sua vitória no Torneio dos Campeões 2006 na ESPN (em que ele doou metade de seu prêmio de $1 milhão para organizações de caridade), mas nada jamais vai se comparar a ter sido incluído no Hall da Fama do Poker.

“Mesmo que eu ganhasse o Main Event da World Series, ter entrado para o Hall da Fama e ser reconhecido pelo que fiz pela comunidade do poker  ao longo da minha carreira vai sempre ter um significado muito mais especial”, falou Sexton.

Nos próximos anos, Sexton ainda vai aumentar as apostas, mas ele admite que sua vida esta tomando novos rumos. Ele e sua esposa há quase três anos, Karen, estão criando seu primeiro filho — Ty Michael Sexton.

“Eu sou muito abençoado por poder começar uma família a essa altura da minha vida”, disse Sexton, chamando a si mesmo de um “orgulhoso papai” e seu filho de um ano de “a criança mais linda do mundo”.

“Minha vida está definitivamente tomando novos rumos”, afirmou Sexton. “Agora, minha prioridade é ser um bom pai mais do que um bom jogador”.




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