EDIÇÃO 23 » FIQUE POR DENTRO

Filosofia do Poker: Desordem em Tempos


David Apostolico

Em minha última coluna, demos uma olhada na obra de Miyamoto Musashi, O Livro dos Cinco Anéis. Musashi escreveu com profundidade sobre sua exploração de uma vida inteira de dois elementos essenciais das tradições marciais e estratégicas. De acordo com a tradução de Thomas Cleary, “o primeiro desses princípios básicos é manter calma e clareza interiores mesmo em meio ao caos violento; o segundo é não se esquecer da possibilidade de desordem em tempos de ordem”.

Da última vez, analisamos a aplicação do primeiro elemento ao no-limit Texas hold’em. Aqui, vamos estudar o segundo componente.

A situação no poker pode mudar drasticamente com a virada de uma carta ou uma aposta forte de um oponente. Uma mão sobre a qual você aparentemente tem domínio pode sair de controle bem depressa. Embora nunca possamos eliminar a possibilidade de desordem, podemos jogar de modo a diminuir seu potencial.

Quando eu li o segundo elemento de Musashi pela primeira vez, lembrei de meu amigo que tem a queixa de que nunca ganha com um par de ases. Embora isso provavelmente não seja 100% verdade, ele perde com muita frequência com eles porque merece perder com eles. Ele faz slowplay ou dá mini-raises, e deixa os jogadores entrarem pagando pouco. Ele olha para os ases como um direito a ganhar o pote em vez de como uma mão a ser jogada com inteligência e pelo valor. Sem saber, ele recebe um processo relativamente em ordem e não prevê a desordem que pode ocorrer.

Ao deixar de aumentar, ele convida múltiplos limpers e agora não faz ideia de onde está quando o flop é virado. O que ele faz ao se deparar com um flop semicoordenado como Q-T-2 com duas cartas de espadas e sofrer um check-raise? Ele pode estar enfrentando A-Q, Q-T, um flush draw, uma trinca de dois e algumas outras mãos possíveis. Se ele tivesse aumentado pré-flop, provavelmente não precisaria se preocupar com algo como Q-T ou um par de dois.

Vários jogadores de poker cultos defendem que, se você for entrar num pote, é sempre melhor aumentar do que pagar. Embora eu não aceite essa lógica como sendo absoluta, acho que a verdadeira mensagem é que, ao aumentar, você toma o controle da mão. Quando você tem controle, tem ordem. Os outros agora estão à mercê de suas próximas ações. É mais provável que eles fiquem cautelosos quanto às próprias jogadas. O grande problema é que você sempre deve estar atento à potencialidade de desordem. O poker é um jogo de muitas nuances, que pode se tornar caótico demais às vezes. Gosto de tomar o controle enquanto minimizo as oscilações. Para fazer isso, você precisa constantemente equilibrar jogo agressivo com uma visão para a desordem. O que quero dizer com isso?

Eis aqui alguns exemplos. Embora eu goste de executar continuation bets, não faço sempre. Assim, você convida uma armadilha ou um blefe de jogadores astutos. Embora eu me assegure de cobrar o preço certo para que os jogadores tentem seus draws, não faço apostas exageradas e ofereço aos jogadores um incentivo para roubar um pote agora maior. Eu baseio o tamanho da aposta não apenas no que é material em meu estoque, mas também no que é material no do meu oponente. Tento manter os tama-nhos dos potes pequenos quando os estoques estão altos. Resumindo, tento limitar a habilidade de meus oponentes de criar desordem.

De modo inverso, procuro oportunidades de criar alguma desordem eu mesmo. Aposto com cartas que não me ajudam, mas que sei serem capazes de assustar meu oponente. Quando eu tenho posição, pago uma continuation bet pós-flop visando roubar o pote no turn. Também dou check-raise contra essas c-bets. Obviamente, com qualquer jogada que eu faça para criar desordem, devo estar preparado para receber um pouco mais de desordem de meu oponente.

David Apostolico é autor de vários livros do poker, incluindo O Poker e A Arte da Guerra. Você pode contatá-lo em thepokerwriter@aol.com.




NESTA EDIÇÃO



A CardPlayer Brasil™ é um produto da Raise Editora. © 2007-2024. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução total ou parcial do conteúdo deste site sem prévia autorização.

Lançada em Julho de 2007, a Card Player Brasil reúne o melhor conteúdo das edições Americana e Européia. Matérias exclusivas sobre o poker no Brasil e na América Latina, time de colunistas nacionais composto pelos jogadores mais renomados do Brasil. A revista é voltada para pessoas conectadas às mais modernas tendências mundiais de comportamento e consumo.


contato@cardplayer.com.br
31 3225-2123
LEIA TAMBÉM!×