Rotina de morador. É o que consegui alcançar em Vegas e que vou manter até o fim dos três meses programados na capital do jogo. Não cheguei pensando que teria pouco tempo para fazer tudo o que queria, e sim que teria (e tenho) tempo para fazer o que me desse na telha nessa cidade imensa e fascinante. Mesmo por tão pouco tempo, vim em busca de mudança. Meu estilo de vida, de me sentir bem comigo mesmo, em busca de uma paz de espírito que uma Disneylândia pode proporcionar a uma criança.
Vim para saber também se conseguiria viver continuamente em Vegas caso quisesse. Tudo isso e muito mais estou conseguindo, mesmo com algumas dificuldades previsíveis pelo caminho. Realmente, a única questão sem resposta para mim ainda é o porquê de ter demorado tanto em passar uma temporada por aqui.
Treinar o inglês era um dos objetivos. No momento em que estou escrevendo esse artigo, já passei dos dois meses na terra do Tio Sam, e devo ter falado e escutado o triplo do inglês que usei em seis meses de Miami. Isso ocorreu porque em Las Vegas fiquei exclusivamente jogando ao vivo, e não existe a opção conveniente de falar espanhol, que existia em Miami. Fiquei (e fico) pouco em casa, e a intenção era mesmo essa, afastar-me temporariamente do mundo do poker virtual – assim como do msn, orkut, skype e afins.
Como vim sozinho pra cá, também não tive muito contato com brasileiros, por consequência, com a língua portuguesa. Os únicos brasucas que conhecia e estavam por essas bandas eram os cariocas Mothel e Eloy, que chegaram no inicio do ano e já foram embora faz tempo. Esbarrei com Akkari e Alexandre Gomes no fim de maio, e até o início de junho ninguém mais tinha chegado (ou apenas não esbarrei). Sei que esse ano a galera vai chegar em peso a partir da segunda semana de junho, e que muito está para acontecer nesse momento inicial da febre do poker de junho-julho.
Estive no hotel Rio para ver o início da WSOP. Mesmo já estando duas vezes por aqui antes, na data dos eventos da Série Mundial de poker, sempre é uma emoção ver salões imensos lotados de torneios e cash games. Algo que me chamou a atenção na sessão de cash game do Rio é que ela era dividida em Limit e No-Limit. O hotel dos eventos dá uma atenção superespecial ao Limit, assim como quase todas as cardrooms de Las Vegas.
Isso é algo que deveria ser muito bem pensado e testado pelos clubes no Brasil. Limit é um jogo que tem publico e dá lucro às cardrooms, e aposto sem medo de errar que o mesmo se aplicaria ao Brasil, caso fosse testado. Atualmente o No-Limit predomina, mas o Limit tem seus muitos atrativos, por ser uma variante em que você pode jogar maior quantidade de mãos, trabalhar muito mais a leitura no flop, turn e river, além de tem um público “da antiga” que só joga Limit, para não mencionar aqueles que acham o No-Limit extremamente chato e traiçoeiro ao mesmo tempo.
Outro fato a respeito de Limit que poucos sabem: o número de mãos jogadas por hora é bem maior do que No-Limit. Pareceu-me estranho quando falaram isso, mas observando melhor vi que realmente é o que ocorre. Todos os dealers a quem perguntei, falaram que a proporção de mãos por hora em Limit era de 35/h em média, enquanto em No-Limit não passa de 25/h. Também joguei um pouco de No-Limit e vi que é bem diferente da realidade automática de “check-or-bet” do Limit: em No-Limit, às vezes uma simples mão demora cinco minutos para acabar, hipótese impensável nas mesas de Limit nas quais jogo aqui em Vegas.
Falo isso num momento em que tenho nutrido uma paixão por Limit comparável à que já senti por sit-and-go, mas ao mesmo tempo acredito que os clubes que já experimentaram o Omaha (e muitos tiveram sucesso em São Paulo), modalidade que está se espalhando pelo Brasil, poderiam tentar adotar o Limit também – e aposto que não se arrependeriam. Não pode ser à toa que quase todos os cassinos de Vegas têm mesas de Limit, e que, em algumas hipóteses, é o único jogo disponível na madrugada.
Em quais os cassinos tenho jogado? Basicamente em cinco. Limites de $2-$4 e $3-$6 ficam inviáveis de se ganhar por serem baratos demais, e porque rake proporcional é altíssimo. Em uma mesa $3-$6 no Caesar´s ou no MGM, por exemplo, a taxa custa 10% por mão (máximo cobrado por aqui em tempos normais, mas não sei se eles inflacionam durante a WSOP), limitada a $4 – a mesma usada na $4-$8 que temos todos os dias nos cassinos onde jogo. Falando nisso, para quem resolver jogar Limit aqui em Vegas, aqui vão os lugares que recomendo.
Bellagio
O “grande point”. Luxuoso e conhecido por muitos. As mesas variam de tight a loose com velocidade incrível, e é o cassino com maior número de profissionais, gente que só joga por lá mesmo. Mesa “boa” para se jogar (loose ou super-loose, em minha opinião) depende muito do dia e do momento. Um problema bem grave que ocorre é na administração das mesas de Limit: os organizadores relutam demais em abrir novas mesas, e entrar em uma para jogar nunca demora menos de 30 minutos, não importa a época, dia e hora que você chega. É o único cassino que não tem “players club”, uma espécie de rake-back dos cassinos, em que você recebe vouchers que podem ser utilizados nas “praças de alimentação” do lugar.
Venetian
O hotel-cassino preferido dos brasileiros tem também a melhor card-room de Vegas. A comida é boa, o serviço é excelente, e nunca tem fila para jogar Limit. Às vezes a mesa fica six-handed, mas logo chegam mais “clientes”. O jogo avança madrugada adentro, só parando depois das seis da manhã, repleto de turistas que joga para perder pouco e de apostadores desesperados para recuperar o que perderam no cassino e no poker. É minha cardroom favorita, apesar de a action violenta ficar no...
Winn
De longe, onde há mais ação nas mesas. O cassino fica na strip, mas distante o suficiente para não atrair tanta gente na cardroom, que é um pouco menor. O jogo na madrugada é enlouquecedor. Canso de ver horas seguidas de tilt coletivo na mesa, com montanhas de fichas jogadas por mão, e todo mundo entrando no golpe com qualquer porcaria na mão. É a card-room perfeita para quem não tilta e suporta mais variações. O ambiente não é dos melhores: gente bêbada, gritando e até cantando sem parar, mas para quem quer $$ e não liga para nada disso, é perfeito.
Palace Station
Fica em frente à casa onde estou em Vegas, na Avenida Sahara. É um cassino mais para “gente local”, onde acontece uma $4-$8 bem interessante, com jogadores péssimos em todos os sentidos. Leia-se “calling stations” que viram “maníacos”, e vice versa. Zero de profissionais, e quase todos os jogadores moram em Las Vegas mesmo.
Gold Coast
Outro cassino de “locais”, em que rola uma $4-$8 que é um sonho, e com mais action do que o Palace Station. Fica perto do Hotel Rio, as mesas de Limit nessa época do ano pegam fogo e são a única opção de jogo na madrugada.
Não vou ficar em Vegas em julho. Fiz uma opção consciente de permanecer três meses aqui, e evitar o verão do deserto de moto. Portanto, tenho mais umas poucas semanas neste “elo perdido”, e vou aproveitar o máximo possível nas mesas de jogo. Quando todo mundo estiver chegando, estarei saindo – feliz da vida, provavelmente. Abraço a todos!