De vez em quando, eu esqueço meu poker. Não “o que ganha do quê?” é claro – eu ainda me lembro que um flush derrota uma sequência. Em vez disso, esqueço o que me trouxe ao jogo para começo de conversa, como fui fisgado por ele e por que sempre fui tão entusiasmado a respeito dele. Sempre que isso acontece, eu volto à minha fonte e bíblia para do jogo, o primeiro livro de poker que li, o inimitável tomo de John Fox, Play Poker, Quit Work and Sleep Till Noon! (Jogue Poker, Saia do Trabalho e Durma Até o Meio-Dia!)
Se você nunca ouviu falar nesse livro, isso não me surpreende, porque ele foi (auto) publicado nos idos de 1977, na época das trevas do poker, e como tratava inteiramente de draw poker, quando o hold’em dominou a cena, ele foi sumariamente deixado de lado por todo mundo, exceto por loucos e nerds como eu. Mas é o livro que me trouxe para o jogo, e eu o releio periodicamente, apenas para voltar para minha fonte. Play Poker... tem agora mais de 30 anos, mas algumas de suas observações são atemporais — tão úteis para jogadores de poker ao redor do mundo hoje como eram para os habitantes degenerados de Gardena para quem Fox originalmente escreveu a obra.
Fox abre o livro notando os efeitos negativos do cansaço sobre a habilidade no poker. “O melhor jogador do mundo com um cérebro temporariamente entorpecido”, ele escreve, “não é páreo sequer para um jogador mediano usando toda sua concentração”. Todos nós sabemos disso, é claro — ou achamos que sabemos. Mas o problema com o julgamento enfraquecido é que seu julgamento de seu julgamento é o primeiro julgamento a desaparecer. Então Fox nos lembra — e, admita, nós sempre precisamos ser lembrados — nunca jogar quando estiver cansado, doente ou excessivamente agitado. Ele guarda sua observação mais incisiva, contudo, para os jogadores que bebem.
Uma bem-humorada nota para os bebedores — estudos mostraram que, se você for um jogador muito ruim para começo de conversa, beber provavelmente não vai afetar muito seu jogo. Para o resto das pessoas, uma dose é demais, duas doses são ridículas.
Pense nisso da próxima vez que estiver em Vegas e uma garçonete sussurrar: “A casa vai lhe pagar uma bebida”. Você quer mesmo parecer ridículo aos olhos de John Fox?
Ao considerar que hora do dia e mês jogar, Fox oferece um longo e confiável (“o autor possui estatísticas obtidas em um períodos de vinte anos”) tratado que conclui que de 3h às 6h da manhã é o melhor porque “bêbados e esquisitos em geral tendem a chegar tarde da noite depois que os bares fecham”. Cara, eu adoro ganhar dinheiro de esquisitos em geral. Fox depois opina: “A primeira parte do mês é melhor porque jogadores fracos que recebem seus pagamentos ou pensões no dia primeiro ainda não foram eliminados. Perto do fim do mês, apenas os jogadores melhores e mais tight tendem a permanecer”. Alguém poderia dizer que essa observação não é mais válida — nós não vivemos mais em uma sociedade de “primeiro dia do mês” — mas ela não se traduz bem para torneios de poker, em que o dinheiro morto é um fato para os competidores, e parte de nosso trabalho é capturar estoques mal defendidos antes que eles vão para jogadores outros e melhores? Esse é o verdadeiro lado bom da sabedoria de Fox: sua interpretação literal pode não ser mais relevante, mas geralmente há uma pérola escondida se você souber procurar.
Às vezes, é verdade, você tem que procurar debaixo da pedra da própria tolice de Fox. Ele aconselha, por exemplo, tentar jogar em mesas com mulheres bonitas, porque “Mulheres bonitas tendem a jogar muito mal — mesmo para mulheres”. Bem, isso não é verdade. Basta perguntar a Annie Duke, que deve estar querendo bater em Fox por causa de sua opinião Neanderthal. Fox vai além, contudo, e diz que mulheres bonitas “tendem a atrair homens para suas mesas... que tendem a jogar de forma loose e irresponsável para ‘se exibir’”. Negar que a testosterona é o combustível do poker é negar a realidade. Era verdade em 1977 e ainda é verdade hoje. Então mesmo quando Fox está errado (ou no mínimo politicamente incorreto), ele geralmente está certo.
Às vezes ele simplesmente faz você morrer de rir — como quando, por exemplo, recomenda jogar contra oponentes tatuados. “Qualquer um que seja idiota o suficiente para ser convencido a fazer uma tatuagem deve ser qualificado como loose para todo o resto”. Nós não podemos, é claro, entender a “tell da tatuagem” literalmente, mas há mérito em saber se seus inimigos tomam decisões ruins em suas vidas e fazem escolhas “loose” em seus comportamentos pessoais, pois a mesa de poker é um microcosmo do macrocosmo: se eles cometem erros longe do jogo, é provável que cometam erros nele também (não que fazer uma tatuagem necessariamente seja um erro — embora o Calvin e Hobbes nas minhas costas...).
Roedores de unhas, fumantes compulsivos, pessoas ricas, pessoas jovens, jogadores nervosos, jogadores supersticiosos e “moradores do gueto” todos são alvos frutíferos para Fox. Seus raciocínios são em geral duvidosos (“Roedores de unhas são fáceis de ler e suas decisões apertadas em geral são erradas”), mas o conceito de traçar o perfil do inimigo ainda tem muito valor hoje. Mesmo que tenhamos separados nossos adversários em categorias não menores do que bêbado e sóbrio, tight e loose, previsível e traiçoeiro, nós nos colocamos na frente da competição indiscriminada. E não nos esqueçamos da observação de Fox: “Por alguma razão, os tipos jovens, barbudos e de cabelos longos que você poderia achar que são jogadores loucos ou radicais são com frequência muito bons”. Olhe aí, Chris Ferguson.
“Não jogue contra oponentes excelentes”, aconselha Fox, e mais uma vez isso pode parecer óbvio, mas há algo de profundidade eterna em sua lógica subjacente. “Lembre que você não está tentando mostrar o quão bom é — você está tentando ganhar dinheiro. Não entre em uma batalha de egos com um bom jogador”. Nesse momento, eu percebo o quanto eu sou profundamente influenciado por Fox, tanto quanto jogador quanto como escritor. Uma das minhas primeiras “descobertas” no poker foi: “Não desafie jogadores fortes, desafie os fracos. É para isso que você está aqui”. Então, descobri isso, ou apliquei inconscientemente os pensamentos de Fox? Não sei. Isso foi há muito tempo. Mas eu o redescobri agora — mais uma vez — e tenho a sensação de que 1977 tem muito a dizer a 2009. Ao longo das próximas colunas, nós vamos ir mais a fundo na sabedoria e tino estimado de John Fox. Tenho certeza de que vai valer à pena. ♠