Neste mês, vamos conversar sobre um movimento que considero bem interessante para tornar seu jogo ainda mais imprevisível: o call–all-in, também conhecido como “stop-and-go”.
O call–all-in é um recurso muito interessante em torneios, principalmente em estágios avançados, mas é preciso pescar o momento certo de utilizá-lo com sucesso. Antes de realizá-lo, pense muito bem acerca da quantidade de fichas do jogador que abriu o raise em relação a sua quantidade de fichas, pois esse é o dado fundamental para uma boa execução da jogada.
Esse move é executado sobretudo quando se está nos blinds, já que, para utilizá-lo, é preciso ser o primeiro a falar depois do flop. Ele consiste basicamente no seguinte: você decide pagar um raise pré-flop e, “independente” o flop, dar all-in antecipadamente. O termo está entre aspas porque suponhamos você decidiu fazer essa jogada com um 87s e o flop veio 6-5-4. Nesse caso, é claro que você abandonaria sua estratégia inicial e daria check para tentar maximizar sua mão. Agora, esquecendo as exceções, na maioria dos casos, o flop não vai ter sido bom pra você, e são exatamente nesses casos que se deve dar all-in e jogar contra o flop do seu adversário.
Obviamente essa jogada só é utilizada quando se está apertado em fichas e, principalmente, quando você sabe que seu takedown pré-flop é muito pequeno caso você volte all-in ali mesmo. Para explicar melhor, vamos ver dois exemplos que aconteceram comigo em torneios
No primeiro, os blinds eram 4000-8000 e eu tinha 64.000 fichas – me encontrava bem abaixo da média do torneio. Eu era big blind e havia pingado 8000 fichas. Outro jogador, muito agressivo, e que vinha dando raise em todos os meus big blinds, abriu raise de 22.000. Eu tinha T9 e parei pra pensar: “se eu der all-in aqui mesmo, ele tem que colocar mais 42k fichas para disputar um pote de mais ou menos 135k, e como ele está com cerca de 250k fichas, a chance de não completar é mínima. Então, meu takedown pré-flop é quase zero”. Por outro lado, na minha atual situação, um T9s era uma mão forte e poderia me trazer fichas. Assim, largar não era uma boa opção. Só que, indo para o all-in pré-flop, seriam enormes as chances de ele ter uma high-card melhor que a minha e ir como favorito na mão, por isso decidi utilizar o call-all-in nesse momento.
O flop veio A 7 3 .
Sinceramente, não achei ruim. Pois, como eu disse, o jogador vinha dando raise demais – e principalmente no meu big blind, já que eu não tinha tantas fichas – e nada garantia que ele tivesse um ás na mão ou qualquer outro jogo forte. Então, finalmente empurrei o all-in de 42.000 tendo apenas T9s (ou seja, nada). A questão é que, aqui, minhas cartas não interessavam mais, e sim as dele. Nesse caso a jogada funcionou, e ele rapidamente deu fold: levei um pote de 93k, o que significou ter aumentado meu stack em quase 50%.
O que deve ficar claro sobre esse conceito é que, ao jogar dessa forma em determinados momentos do torneio, você aumenta muito sua taxa de sobrevivência. Outros casos clássicos ocorrem quando se tem um par baixo ou um Ax. Agora, lembre-se de que essa jogada deve ser utilizada quando, no seu entender, o takedown ao voltar all-in pré-flop é praticamente zero. Portanto, nessa mão, a diferença ao ganhar essas fichas extras não será tão vantajosa quanto o aumento do percentual de vitória utilizando o stop-and-go.
Temos aqui outro exemplo em que eu me encontrava bem abaixo da média do torneio (tinha 10.600 em fichas, e os blinds estavam em 600-1200), num estágio decisivo da competição. Eu era o big blind e recebi 33. Todo mundo deu fold, até que um jogador muito agressivo abriu raise de 3x o blind do gap. Nessa hora, resolvi que seria o par de três que decidiria meu destino no torneio. Então, eu tinha duas opções aqui: voltar all-in e provavelmente ir para um coinflip ou optar pelo call-in-all, que foi minha escolha, e era a jogada mais interessante nesse caso.
Vamos entender a razão disso: acreditando que meu takedown pré-flop é zero (considerando que meu adversário estava deep stack), por que não mixar o jogo e fazer uma aposta forte no flop, e desse modo não dar a ele a chance de ver as cinco cartas “de graça”? Com essa jogada, passava a ter uma taxa de takedown no flop, ou seja, um percentual de vitória em cima das vezes que ele não pagasse minha aposta.
Para ilustrar, vamos imaginar que meu adversário tivesse QJo. Nesse caso, seu eu fosse all-in pré flop, teria 51% contra 49% dele. Logo, em 49% das vezes, eu seria eliminado do torneio, e em 51% iria para 23K. Executando o call-all-in, reduzimos para aproximadamente 30% os flops em que ele iria seguir na mão. Desse modo, em 70% das vezes eu iria para 16K e nos outros 30% ainda ganharia algumas fichas quando ele pagasse com queda para seqüência que não batessem, como flops do tipo T-9-2, K-T-5, etc. Então, com essa jogada, eu consigo reduzir minha chance de ser eliminado de 49% para algo em torno de 27 a 30%.
A partir desse raciocínio, vemos toda vez em que a diferença do que se iria ganhar num all-in pré-flop (no exemplo acima, 23k; e fazendo o call-all-in, 16k) for pequena, esse movimento passa a ser a mais interessante no longo prazo.
Logicamente, o call–all-in é uma jogada ousada, mas se você analisar bem o cenário em que se encontra, escolher seu adversário e tiver um bom “timing” de jogo, esse move pode lhe salvar em algumas situações de aperto num torneio. ♠