Estou em Paris, depois de uma semana no navio MSC Poesia, onde aconteceu o Party Poker Million 2008. Infelizmente, só avancei até o dia 2 do torneio e não tive muitas oportunidades para crescer; quando as tive, acabei não levando o pote. Enfim, faz parte da profissão.
Mas, se o torneio no navio não foi bom, o cash game durante a semana foi excelente. Consegui resultados expressivos. Vou descrever algumas situações que considero interessante dividir com vocês:
A mesa era NL €10-20, com buy-in mínimo de 3 mil euros. Alimentando o jogo, estava o famoso Mike Sexton, conhecido como “Embaixador do WPT”, e mais quatro russos milionários. As duas jogadas que vou descrever aconteceram contra o mesmo oponente da Rússia, que era disparado o jogador mais fraco no navio.
Estávamos numa mesa cheia, com 9 jogadores. Mike Sexton deu “straddle”, que significa pingar o dobro do big blind no escuro (nessa mão, em vez de os blinds serem 10-20, eram 10-20-40). O UTG deu fold, um russo maníaco entrou de limp $40 e tivemos outro fold. Aumentei para $240 com A-9, pois tendia a ser favorito contra o range de mãos com que o czar entraria de limp. E o principal é que, com esse raise, era provável que eu fosse o último a falar, pois dificilmente tomaria call de algum jogador depois de mim – me isolei para ter posição na jogada. O small blind, um profissional canadense, pensou muito antes de pagar os $240. Todos os outros jogadores saíram da mão, menos o russo, que também completou os $240. O flop veio A-Q-8 rainbow. O small blind deu check, o russo também, e eu apostei forte, $600. O small blind pensou e deu fold, mas o russo pagou. No turn veio o 7♣, gerando possibilidade para flush. Pensei muito se existiaria value ou não na minha bet, mas, como já havia um belo pote e era meu primeiro dia na mesa, preferi dar check para não criar um bolo grande demais sem que eu tivesse certeza de estar ganhando. O river trouxe um 9 vermelho e o russo antecipou $1500: com certeza não existiria value em um raise meu, apesar de eu achar que, com aquele 9, dificilmente estaria perdendo. Paguei os $1500 e esperei pelo showdown. Ele abriu K-J, em outras palavras, pagou no flop com a queda para a gaveta no dez. Essa jogada foi importante, pois me deu boas leituras contra esse oponente durante toda a semana.
A segunda mão aconteceu contra esse mesmo russo, e foi a última do cruzeiro. Naquele instante, jogávamos um short-handed de quatro jogadores. O UTG deu fold e eu, com 8-7 e sendo o button, dei raise de $55 no big blind do russo. O small blind largou e o cossaco, que adorava alavancar pré-flop, voltou reraise de $175. Essa agressividade, sinceramente, não me assustava muito, pois a gama de mãos com as quais ele faria isso, mesmo fora de posição, era gigantesca. Tirando minhas cartas, que eram medianas, essa situação era tudo que eu queria: eu, em posição, contra o russo. Passei a semana inteira jogando as situações, muito mais do que as cartas em si. Assim, completei o raise rapidamente e tivemos um flop com 9-7-6, sendo duas de ouros. Diante daquele adversário, era como flopar uma trinca – aliás, se você tiver 8-7, um flop desses é um sonho contra qualquer oponente. Eu tinha o segundo par e duas pontas para seqüência, o que me dava muitas outs para um bom desenvolvimento da minha mão no turn e no river (nessa situação, dificilmente você não terá cerca de 50% de chance ao ver as duas últimas cartas). Nosso Rasputin deu check e eu apostei $305. Ele rapidamente fez tudo $850. Então parei e pensei: – “Ele deu esse raise muito rápido e olhou para os lados... A semana toda ele fez isso quando queria me ver fora da mão...”. Por pouco não dei all-in logo no flop, o que, contra vários adversários, provavelmente seria o movimento mais correto no longo prazo. Mas eu estava numa semana tão confiante que resolvi dar call, fazendo slowplay, pois algo me dizia que se eu desse all-in no flop ele já largaria, mesmo com todo retrospecto da jogada. Lógico que, dessa maneira, eu dava a chance de ele acertar o turn, mas aí, paciência: eu queria era tirar todas as fichas dele. Achei bem provável que tivesse errado tudo, com mãos como AT, AJ AQ, AK e, caso não fosse uma dessas, e ele realmente estivesse forte, teria uma trinca, um par alto ou duas overcards mais flush draw, ou seja, as fichas iriam para o centro da mesa de qualquer forma. Portanto, com o call, eu acreditava que maximizaria minha eqüidade naquela situação no longo prazo – talvez estivesse errado, mas foi assim que pensei.
O turn trouxe um 3 preto e rapidamente o russo deu all-in de quase 3 mil! Internamente, eu já estava decidido a pagar, acreditando no meu feeling. Mas, mesmo assim, parei e pensei mais ou menos tudo isso que descrevi para vocês. Depois de uns dois minutos eu falei: – “CALL”. Ao contrário dos torneios, no cash game as cartas não são viradas, e o river veio com um T preto! BOOM ! Que river dos sonhos...
Tentei não me exaltar e mostrar as cartas antes, afinal, como ele era o big blind, queria esperar ele mostrar o jogo para adquirir mais experiência e ver se meu raciocínio tinha sentido ou não, além de ganhar o pote... Porém, o russo demorou e ficou olhando para aquele dez com um ar desolado, o que eliminava as chances de ele ter um par alto, porque, se fosse assim, tenho certeza de que esfregaria as cartas na minha cara, sentindo-se absoluto, quase o Lênin. Trinca, então, 0,0% de chance, pois ele faria o mesmo, só que com mais força. Assim, resolvi mostrar minha seqüência – até por uma questão de etiqueta – pois a demora demonstrava que ele sabia que não tinha ganhado aquele pote... Quando virei minhas cartas ele só falou algo do tipo: – "This Brazilianos...”.
Bem, não vi sua mão, mas apostaria que estava com AT ou maior, ou com um flush draw... Após esse grande pote o russo se levantou, e a semana do navio havia acabado por ali. Agora era hora de ir direto para a boate, comemorar.