EDIÇÃO 10 » MISCELÂNEA

Oráculo


Roy Winston e Michael Binger

Esta é minha primeira coluna para a revista Card Player. Eu gostaria de agradecer a todos você que têm acompanhado meu blog em CardPlayer.com. Discutiremos aqui mãos interessantes e um pouco controversas, tanto de torneios quanto de cash games. A coluna apresentará pontos de vista distintos de diferentes jogadores profissionais. Estarei em colaboração com Michael Binger, que discutirá a análise matemática de cada mão. Além disso, o jogador envolvido na ação irá falar sobre sua jogada. Essa mão foi disputada por Noah Schwartz, que começou como jogador online (ele ganhou o PokerStars Sunday Million ano passado) e tem se dado muito bem em eventos ao vivo.

Schwartz Flopa uma Trinca, mas Não Faz Slowplay
Pré-flop:
O jogador under-the-gun abriu o pote com raise de 23.000. Schwartz estava duas posições depois, recebeu 1010 e pagou. O big blind também deu call. 

Percentagem de Vitória
Antes do Flop: 78,1%
Depois do Flop: 75,3%
Turn: 38,6%

Percentagem de Vitória
Antes do Flop: 21,3%
Depois do Flop: 23,8%
Turn: 61,4%

O big blind pediu mesa, o under-the-gun também, Noah apostou 60.000, o big blind pagou e o jogador under-the-gun deu fold.

O big blind apostou 80.000 e Noah foi de all-in, com 340.000 a mais; o big deu insta-call.

Leitura de Noah Schwartz
Meu raciocínio pré-flop quando eu vi dois dez vermelhos, e levando em consideração o fato de que o pote foi aumentado por um jogador relativamente tight que estava under the gun, foi simplesmente pagar. Ele tinha disputado apenas outro pote durante os dois últimos níveis, e estava lentamente perdendo por causa dos blinds. O pote que ele disputara havia acontecido duas mãos antes, quando abriu com 96.000 da posição cut-off com K-J. Eu estava no small blind com A-K e paguei, mas acabei perdendo. Restavam vários stacks grandes para falar depois de mim, incluindo Erik Seidel e Erick Lindgren, então eu decidi que poderia facilmente sair da mão antes do flop caso alguém aumentasse muito. Eu então paguei os 23.000, a mesa rodou em fold até o big blind, que completou com mais 15.000. Então, no flop, havia 83.000 no pote. Com um flop contendo J107, os oponentes pediram mesa até mim, e eu dei raise de 60.000, que correspondia a quase três quartos do pote. O big blind apenas pagou, e o jogador under-the-gun deu fold. O turn foi o 2, e o big blind apostou 80.000 no pote de 200.000, o que no momento me pareceu peculiar, pois ele tinha a tendência de dar overbets, o que havia feito repetidas vezes contra Erick Lindgren. Portanto, eu tinha concluído que, se ele começasse apostando, eu iria fingir ter um monstro, dando a ele uma boa fold equity com 320.000 em fichas restantes. Ele instantaneamente pagou meu all-in, e vi que estava em maus lençóis: eu tinha 17 outs com apenas uma carta por vir. Mas o 3 no river acabou com meu torneio.

Análise de Michael Binger
Pré-flop: Tendo em vista o tamanho dos stacks, dar call é a melhor jogada contra um jogador tight que aumenta do under-the-gun. Um reraise simplesmente transformaria sua mão em um blefe e lhe colocaria em uma situação muito difícil se ele voltasse all-in. Analisemos isso em detalhes. O jogador under-the-gun abriu com 23.000, portanto, um reraise padrão para Noah seria de cerca de 70.000. Digamos que o UTG só voltasse all-in se tivesse J-J, A-A e A-K. Ao se deparar com esse all-in, Noah precisaria pagar 155.000 para ganhar 316.000, com equidade de 34% contra o all-in do jogador under-the-gun. Sob uma perspectiva puramente de equidade de fichas, Noah pagaria o preço justo com o call. Contudo, como o EV (expected value, ou valor esperado) das fichas de um torneio é mais alto do que o EV de dinheiro real, a melhor jogada para Noah seria dar fold diante do all-in do under-the-gun. Como suas cartas não seriam mostradas, 10-10 se tornaria um blefe.

Agora mostrarei porque um reraise pré-flop por parte de Noah é uma jogada de EV negativo. O under-the-gun é descrito como tight, o que nos leva a concluir que a gama de mãos com as quais ele aumenta dessa posição seja 8-8 ou maior, A-K, A-Q, A-J e K-Q. Com isso, o UTG irá voltar reraise all-in (RA) com uma probabilidade P(RA) = 0,396, e o EV do reraise de Noah é: EV = P(RA) x (-70k) + [1-P(RA)] x (+44k) = -1.148. Como o EV das fichas é ligeiramente negativo, o EV em dinheiro real será definitivamente negativo. Portanto, dar fold pré-flop [EV(fold) = 0] é melhor do que voltar reraise com 10-10! Contudo, pagar a aposta de 23.000 é a melhor opção, com um EV positivo que dependerá das conclusões a que você chegar durante o jogo pós-flop.

Além disso, quando você paga pré-flop, pode enfrentar um stack pequeno que porventura entre na ação, enquanto um reraise lhe deixa vulnerável não apenas ao jogador under-the-gun que aumentou, como também a qualquer um depois de você que tenha uma grande mão.

Flop: Eu concordo com a ação de Schwartz aqui. Uma aposta de 60.000 no pote de 83.000 parece ser a quantia apropriada. Quando você consegue uma trinca no flop, quer que mais pessoas paguem: você não quer assustar todo mundo. Teoricamente, alguém que possua A-J, K-J ou Q-J, pode achar que tem a melhor mão e que você está tentando roubar o pote. Além disso, você tornaria muito caro o call com um draw.

Verifiquemos essa afirmação calculando o EV do big blind no flop, e provando que ele é negativo. O big blind tem 8/45 chances de acertar um flush no turn. Ainda que consiga, Noah pode acertar um flush maior (sete outs) ou um full house (dez outs) no river. Isso significa que a probabilidade de o big blind ganhar o pote é de apenas 8/45 x 27/44 = 11%. Quando a carta do flush aparece no turn, X representa a aposta do river que Noah paga quando o river não traz nada, Y representa a aposta do turn que o big blind dá check-call quando o river traz uma quarta carta de ouro, e Z representa a aposta do turn que o big blind dá check-call quando o river vira um par no bordo. Com tais definições, descobrimos que o EV do big blind é igual a 37/45 x (-60) + 8/45 x [27/44 x (82 + 60 + 80 + X) + 7/44 x (-60 - 80 - Y) + 10/44 x (-60 -80 -Z)]. Com os valores razoáveis de X = 0, Y = 0 e Z = 120.000, o EV do big blind é de -39.600. Quaisquer outras conclusões plausíveis para X, Y e Z também levam a um EV negativo para o big blind, o que justifica a afirmativa segundo a qual a aposta de Noah de 60.000 no flop colocou, de forma eficiente, um preço desproporcional para que o big blind pagasse com lucro se tivesse um draw.

Turn: Pagar a aposta de 80.000 do big blind é muito melhor do que entrar de all-in. Eu asseguro que essa afirmação tem embasamento matemático que compara o EV do call versus o EV do all-in, mas vou poupar vocês dos detalhes. A conclusão é: quando o big blind está blefando ou semi-blefando, você não tem muito a ganhar indo de all-in, pois quando o big blind acerta um flush (geralmente o caso), você se arrisca a perder tudo, a não ser que consiga completar o draw no river. Como o big blind foi suficientemente gentil ao apostar apenas 80.000 em um pote de 200.000, você recebe o preço justo para simplesmente dar call.

Análise de Roy Winston
Pré-flop: Na maioria das vezes, eu não voltaria reraise. Par de dez é uma mão muito boa, o pote foi aumentado e, com os antes, blinds e raise de 23.000, ela possui valor suficiente. Eu levaria em conta, na minha leitura, também o jogador que abriu o pote.
 
Flop: Eu não gosto da aposta do flop de Schwartz; ele colocou muito pouco, talvez esperando que o turn não trouxesse uma carta de ouros, para então inflacionar o river. Embora matematicamente ele tenha tornado caro o call, o big blind pagou, e fez isso valer a pena quando viu a carta de que precisava virar no turn. Binger queria o valor máximo, já eu preferiria levar o pote aqui com um bordo como esse. 

Turn: Meu maior problema com a mão foi o all-in de Schwartz. Se você se propõe a jogar uma mão de forma menos agressiva, deve ser capaz de largá-la. Quando surgiu uma carta de ouros, eu vi para ele apenas duas opções: call ou fold. Se ele pagasse, esperaria que virasse um par no bordo. Com aquele flop, eu teria dado raise do tamanho do pote, pelo menos, para tornar caro o flush draw do oponente. Não esqueçamos que 9-8 forma uma seqüência, e é uma mão possível, embora improvável.

Em torneios o que importa é a sobrevivência. Schwartz precisaria estar acima da média em fichas se tivesse desistido da mão no turn, e um pouco acima da média se apenas pagasse a aposta do turn e percebesse que, derrotado, teria de dar fold diante de uma aposta no river. Além disso, com um flush de 5 como carta mais alta, se um par viesse no river, Schwartz levaria o pote? Eu creio que não, mas não há como ter certeza, já que o próprio Schwartz pagou acima do preço ao big blind depois que ele acertou seu flush.

River: Faça virar um par no bordo: utilize os poderes mentais de um Jedi, suplique ao “Senhor do Baralho”, faça o que for preciso, se vire.

A Incoerência de Noah Schwartz: Eu concordo com a análise de Roy sobre a mão, no sentido de que com o reraise pré-flop, em vez de lidar com a mão de maneira mais passiva, especialmente na reta final de um torneio, forçaria o fold de uma mão como 5-4 do mesmo naipe. Com a textura e conexão do bordo, eu teria apostado mais no flop, para evitar dar ao big blind as implied odds para pagar com um flush draw de 5 como carta mais alta.

Conclusões dos Profissionais

Michael Binger: Schwartz pagou corretamente pré-flop, pagou corretamente o montante apostado no flop (60.000), e devia ter pagado a aposta de 80.000 no turn, e não ido de all-in.

Roy Winston: Schwartz devia ter levado em consideração um reraise pré-flop, e o flop poderia ter sido jogado de forma mais agressiva. Se você pretende executar um slowplay, deve estar preparado para largar a mão quando necessário.




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