Vanessa, você esteve no Brasil em 2008, na primeira etapa da história do LAPT, no Rio de Janeiro. Desde então, a indústria do poker mudou bastante. Como um todo, você considera o atual cenário melhor ou pior do que o daquela época?
Bem, eu olho para o mundo do poker e faço uma analogia com o velho oeste. Quando os primeiros peregrinos chegaram, não havia organização, e a disputa entre caubóis e índios continuou por muito tempo antes que os EUA se tornassem o que é hoje. A mesma coisa aconteceu com o poker. Era tudo muito caótico, até que se consolidassem empresas do porte do PokerStars, que começaram a colocar ordem na indústria.
Hoje, o poker se parece com a América do início do Séc. XX, na época em que surgiram o automóvel e o telefone. Ainda há muito a crescer, organizar e gerenciar. Nos últimos três anos, sobretudo, a legislação tornou-se mais clara, principalmente a respeito o poker online. Isso, no mundo inteiro. Em alguns lugares mudou para melhor, em outros, para pior.
E com relação ao jogo em si, você vê alguma modificação significativa nesse período?
Numa perspectiva mais abstrata, enxergo o poker de maneira evolucionista, como uma criatura que se desenvolve constantemente, incluindo, aí, as estratégias, os adversários etc. Isso força você a evoluir também, de forma que estamos sempre tentando nos aproximar cada vez mais de uma “estratégia ideal” – apesar de eu acreditar que não chegamos a esse ponto ainda.
Sem falar que a estratégia que hoje seria considerada ideal, em 2008 seria algo completamente diferente. É o caso da frequência de 3-bet pré-flop, que atualmente é muito mais alta.
Você é uma estudiosa da chamada “Teoria dos Jogos”, um ramo da matemática com ênfase na análise de situações estratégicas. De que forma isso pode ajudar os jogadores, na prática?
É preciso ter em mente que não se trata de algo simples de se aprender É uma estratégia complexa, ou melhor, uma filosofia complexa. O foco da Teoria dos Jogos é analisar a interação entre os seres humanos – algo frequentemente complexo – e reduzi-la a modelos e equações, na tentativa de simplificar o comportamento e otimizar o curso das ações.
A partir disso, temos dois tipos de estratégia para o poker: a que podemos chamar de “otimizada”, que é aquilo de devemos fazer se o oponente estiver jogando de forma perfeita, considerando o que se entende por “um jogo perfeito” em determinada sociedade; e a estratégia de “exploração”, que leva em conta o fato de que nossos adversários não são perfeitos e, a partir disso, considerando os erros que cada um deles tende a cometer, tirar proveito dessas falhas. É dessa forma que se maximiza o lucro no poker.
Se você joga de forma otimizada, terá lucro no longo prazo, mas não o maior lucro possível. Para tanto, é preciso alternar entre a estratégia ideal e a de exploração daqueles que não jogam idealmente. O “pulo do gato” é que, para explorar os adversários, você mesmo não pode jogar de maneira ideal, ainda que isso lhe deixe vulnerável a ser explorado por outros oponentes.
Como funcionaria tudo isso em uma situação real de jogo?
Por exemplo, você sabe que o big blind nunca defende o blind sem uma mão que esteja entre as 10% melhores. Dessa forma, quando você estiver no button, vale a pena aumentar a aposta todas as vezes para que ele dê fold, não importa o que aconteça. Isso não é o ideal, não normalmente, pois é preciso mixar o jogo para manter a credibilidade da jogada. Mas se o sujeito no big blind sempre comete o mesmo erro, deve-se dar raise sempre.
Por outro lado, para explorar o big blind, você passa a jogar de maneira não ideal. Agora, o small blind pode tirar vantagem de você, voltando reraise toda vez que vir seu raise do button, pois é provável que a mão que você tem não seja forte o bastante para se defender.
É aqui que surge o problema de otimizar o nosso comportamento, que acaba se tornando uma análise do nível em que você está, de quem na mesa está no nível mais alto, e do nível em que seus adversários estão exatamente.
Essas não são informações fáceis de obter, logo, é complicado saber quem vai explorar e quem vai ser explorado. É mais ou menos assim que enxergo a estratégia do poker sob a ótica da “Teoria dos Jogos”.
Há alguns anos, publicamos uma edição em que a capa era você com a sua Lamborghini Gallardo. Poucos meses depois, veio a notícia de que o carro estava à venda. Você continua sendo uma apreciadora de carros de luxo?
Sim, na verdade eu tenho dois carros agora, um Bentley Continental GT branco, e um Ford Thunderbird 1957 conversível, completamente restaurado, com bancos de couro vermelho. Adoro dirigir esse carro. Ah, e o rádio é original (risos).
Vanessa, você é uma jogadora profissional bem-sucedida, bonita, feliz e proprietária de carros de fazer inveja a qualquer um. Você acha que isso de alguma forma intimida os pretendentes?
Engraçado você ter me perguntado isso. Estou solteira há mais de um ano, e é curioso porque, quando estava casada, era automático eu dar o fora nos caras – até porque sabiam que eu era casada, então não tinha nenhum problema com relação a isso. Agora que estou solteira, a coisa mudou. Não sei dizer se eles se sentem intimidados, mas sei que foram poucos os que tentaram algo nesse sentido. Talvez estejam, sim, intimidados, mas como não tenho medo de ficar “encalhada” (risos), então, tudo bem. E se algum pretendente tiver interesse, pode falar comigo também pelo facebook, que eu respondo (risos).
Obrigado pela entrevista, Vanessa. Gostaria que você deixasse uma mensagem aos seus fãs do Brasil.
Em primeiro lugar, eu adoro o Brasil. Essas têm sido as 36 horas mais incríveis da minha vida – e olha que só dormi três horas desde que cheguei. É um País com uma energia sensacional, uma cultura maravilhosa, de pessoas maravilhosas. Espero poder voltar o mais rápido possível.
Sonha em conquistar os prêmios Esso, Jabuti e Pulitzer, mas por enquanto não consegue nem soletrar o nome da revista em que trabalha. Coleciona sucessivos vexames em competições internas contra colegas de trabalho.