EDIÇÃO 79 » COLUNA NACIONAL

Estratégias básicas por faixa de stack - Parte II


Fábio Eiji
Certa vez, um aluno me disse o seguinte: “O meu problema é que eu até consigo construir um bom stack no começo, mas chega ali, na metade do torneio, quando temos entre 25 e 30 big blinds, eu me sinto muito preso e meu stack vai derretendo igual a um sorvete de flocos num dia de sol. Quando percebo, estou em push/fold”. Bem, a parte do sorvete de flocos, eu mesmo adicionei. Mas de uma coisa tenho certeza: muitos dos leitores se identificaram com a fala do aluno. 

Essa é a faixa de stack em que a agressividade é mais importante. Aqui, o arsenal de movimentos é mais amplo e complexo do que no jogo short-stack. Sentar e esperar as melhores mãos está longe de ser a estratégia mais correta. Os bons jogadores, mesmo aqueles com tendências tight, sabem explorar as situações que se apresentam, utilizando todas as ferramentas disponíveis — se aproveitando de sua imagem, é claro. 

No artigo desta edição, trataremos das principais noções estratégicas para o jogo com stack médio, ou seja, aquele entre 25 e 40 bbs, bastante comum em momentos decisivos dos torneios.

3-bet e 4-bet Light
Os stacks entre 25 e 30 bbs são ótimos para a 3-bet light. Isso porque, de maneira geral, deixamos o oponente sem espaço para reagir. Imagine uma situação em que temos 30 bbs de stack efetivo. Nosso oponente abre raise de 2 bbs e fazemos a 3-bet do button para 5 bbs. Agora, analisemos as possibilidades do oponente:

– se ele der call, terá que jogar pós-flop fora de posição. O pote no flop será de mais de 10 bbs, com 25 bbs pra trás, ou seja, não há espaço para muitas manobras.

– se fizer a 4bet, que será entre 10x e 12x (tamanhos mais utilizados pelos jogadores), estará investindo de 30% a 40% do stack.

– se for all-in, terá que investir seus 30 bbs pra ganhar um pote que está em aproximadamente 9,5 bbs. É o movimento mais comum quando um jogador resolve reagir dentro dessa faixa de stack.

Podemos concluir que fica muito difícil reagir a uma 3-bet. O call leva a uma situação desfavorável pós-flop, e a 4-bet custa uma parte muito grande do stack. Ir all-in é a melhor forma de reagir, porém, como pode custar o torneio, é preciso ter um cuidado extra pra esse movimento. É justamente esse conjunto de fatores que favorece a efetividade da 3-bet light com 30 bbs.

Já os stacks próximos aos 40 bbs são ótimos para 4-bet light. Vamos a outro exemplo para esclarecer a ideia. 

No botão, em gap, e com 40 bbs de stack, abrimos raise de 2 bbs. O BB, com o mesmo stack, faz uma 3-bet para 5 bbs. Aplicamos uma 4-bet para 10bbs. O que acontece?  

– se o vilão der call, terá o velho problema de jogar um pote grande fora de posição. O pote terá 20 bbs e o stack efetivo será de 30 bbs. Nada a fazer a não ser torcer para acertar o flop.

– se o vilão optar pela 5-bet, terá que ser all-in. 

Fica fácil visualizar quão reduzidas são as possibilidades que o oponente tem de reagir.

Set Value e Suited Connectors
Sobre pares pequenos, escrevi anteriormente sobre isso [edição 76 ou blog do Eiji]. Então, com stacks até 40 bbs, será difícil encontrar uma situação em que teremos implied odds boas o suficiente para jogar para trincar (set value). Além disso, abrir raise em posições iniciais e medianas também não é aconselhável, já que se trata de uma mão que não traz possibilidades boas para o jogo pós-flop. 

Os suited connectors têm outro problema. Eles dão a ilusão de serem boas mãos para jogar pós-flop em posição. Porém, não fazem top pair com uma frequência boa. Quando um K-X ou A-X acerta um top pair, eles têm uma equidade muito boa no flop, mesmo contra ranges fortes, diferente dos suited connectors, pois não teremos espaço pós-flop para grandes manobras. Mas nada impede de utilizarmos algumas dessas mãos no nosso range de 3-bet light, principalmente em posição.

Flat Call
É preciso ter um range de flat call com esses stacks, tratando-se de posições finais e blinds. Para essa ação, são boas as mãos que façam top pair e/ou consigam bons draws. Uma coisa é ter um flush draw com 76 no flop T23. Outra é ter com KQ.

O range de flat call que sugiro é composto basicamente de broadways (combinações de cartas entre 10, J, Q, K e A), principalmente as do mesmo naipe. K-Q, A-J, A-T, Q-J, J-T e outras mãos do tipo conseguem ainda ter implied odds favoráveis, pois dominam uma parte do range do vilão, que tende a abrir mãos como J-9, K-9, K-T, Q-T, Q-9 etc.

No pós-flop, como os stacks geralmente não serão muito grandes em relação ao tamanho do pote, devemos jogar agressivamente os draws, pois, dessa forma, somamos a equidade da mão às vezes em que forçamos o vilão a desistir.

A vantagem de ter um range forte de flat call é que dificilmente estaremos mal em um flop. Quase sempre haverá uma possibilidade de melhorar a mão: um backdoor flush ou straight, ou simplesmente as overcards, fator que favorece jogadas simples e básicas como o float e o raise na continuation bet (explorando a tendência de jogadores que usam a c-bet mais vezes do que deveriam).

Principais erros dos jogadores iniciantes
De longe, e nem preciso pensar muito para chegar a essa conclusão, o erro mais comum que observo nos jogadores iniciantes com stacks médios é, novamente, jogar muito passivamente. Desperdiçam fichas importantes fazendo muitos calls pré-flop e pagando apostas com draws até o river. Além disso, é comum ver jogadores se precipitando com pequenos pares, abrindo ou pagando raises em situações ruins.  

Seguindo essa tendência passiva, não ter um range de 3-bet light, hoje, pode ser considerado uma falha, pois torna seu jogo muito previsível e fácil de ser explorado.
 
Há muito mais o que falar sobre o jogo com stacks médios. As particularidades dos torneios e oponentes que enfrentamos nos obrigam a fazer ajustes importantíssimos. Dependendo do nível do jogo, por exemplo, não há necessidade de um range de 3-bet light, pois os adversários não procuram explorar essa falha e não sabem reagir corretamente.
 
Na próxima edição, o último artigo da série: o jogo deep stack.



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