EDIÇÃO 62 » COLUNA NACIONAL

Las Vegas 2012 - Balanço e análise (Parte II)


Thiago Decano
Continuando minha saga por Las Vegas, vou falar sobre minha trajetória no tão cobiçado Main Event e analisar uma mão bem interessante em que acabei largando um full house.

A mão em questão aconteceu no evento#36 da WSOP [$3.000 Shootout], em que fiz mesa final. Nesse torneio, apenas o campeão de cada mesa passa pra próxima fase. De cara, como eu disse em meu último artigo, enfrentei jogadores excelentes, casos de Jonathan Duhamel e Michael “The Grinder” Mizrachi.

A MÃO

Os blinds estão em 100/200 e a mesa tem sete jogadores. Eu recebo 7-7 no UTG e aumento para 500. No small blind, um jogador loose agressive paga.

O flop vem J-10-6. Ele pede mesa. Aqui não há motivos para apostar. Esse é um bordo que acerta bastante o range de call dele e eu tenho uma mão com valor. Então, dou check atrás.

O turn é excelente, um 7. O vilão aposta 800. Eu prefiro apenas pagar. Desse modo, escondo o valor da minha mão, dou a chance para que ele blefe o river em cima de draws que não bateram e o faço acreditar ele tenha grande valor na mão caso segure alguma mão com um J ou até mesmo um A-T.

O river é ótimo, um 6, que me dá o full house. Ele aposta 1.800. Eu penso por uns 15 segundos e aumento para 4.800. Fico com 7.500 para trás, ele pensa por um pouco e vai all-in.

Esta foi a minha análise: estou perdendo para J-J, T-T e 6-6. Mãos que ele jogaria da mesma forma. O fold se torna mais difícil pelo fato de que não apostei no flop, o que me faria perder bastante valor, já que, como disse antes, o bordo acerta muito o range de call do oponente. Então, dificilmente eu estou no topo do meu range.

Ou seja, ele representa três mãos fortíssimas de valor. Para o meu oponente, eu posso ter 7-7, 7-6 e, na maioria das vezes, apenas o 6. Por essa linha, ele sabe que eu largaria apenas a trinca – até por isso, eu acho que ele não iria all-in com 7-6 por valor.

Porém, fora dos cash games, é muito difícil encontrar jogadores capazes de executar essa jogada blefando, com essa velocidade de raciocínio, levando em conta que não havia metagame entre a gente. Eu poderia ser um jogador fraco. Alguém que não largaria sequer a trinca.

Alguns jogadores me perguntaram: “Você não acha que com J-J e T-T ele não daria reraise pré-flop?”. Acho muito difícil, já que, além de não ter ante, a 3-bet contra um raise do UTG é uma jogada muito forte, e assim ele estaria transformando a mão em blefe.

Diante desse cenário, optei dei um fold “chorado”. Abri o 7-7 pra ver sua reação e ele me mostrou A-Q. Uau! Ele realmente foi capaz. Méritos a ele. O importante é que depois consegui me recuperar e jogar meu melhor jogo, cravando a mesa e ganhando muita confiança para os dias seguintes.

O MAIN EVENT
O último torneio da WSOP, o Main Event de US$ 10.000 é com certeza a cereja do bolo série. Além de enfrentar os melhores jogadores do mundo, também é preciso desviar das bad beats e do cansaço. Entre a frustração e a glória, detalhes: o turn, o river, uma jogada ruim...

DIA 1
Com já era esperado, minha primeira mesa era relativamente fácil. Porém, segui  minha estratégia de jogar muito mais por valor. Tentei um blefe não muito bom contra o brasileiro Marcos “Pimba”, que me pegou “no pulo”. Consegui dobrar meu stack, mas novamente o Pimba me pegou blefando.

Depois de ele abrir raise, eu reaumentei em posição com 4-5 do mesmo naipe. Em geral, é uma mão que prefiro apenas pagar em posição, mas preferi dar raise, pelo metagame e para ser o agressor.

O flop trouxe um 10 como carta mais alta e meu flush draw. Eu aposto, e ele paga. O turn é excelente, um K, que não completa meu flush, mas é uma ótima carta para blefar. Aposto novamente, e sou pago. O river é uma carta irrelevante. Eu empurro all-in, e ele vai para o tanque. Ele paga e mostra J-10 de naipes diferentes – novamente, uma bela fatiada no meu stack.

Com esses dois blefes, além das fichas perdidas, minha imagem ficou péssima, e eu precisaria de algum valor para crescer. Isso não aconteceu. Jogando mais tight, na última mão do dia, meu par de damas segurou contra um A-K e avancei para o Dia 2 com 25.800 fichas.

DIA 2
Comecei exatamente como no Dia 1: péssimo. Duas situação relativamente boas, eu perdi potes que me deixaram apenas com 13 BBs. O divisor de águas foi quando me trocaram de mesa. Logo no início, já trinquei um cinco e voltei para o jogo. Tudo começou a fluir quando me esqueci das mãos que havia perdido e me foquei totalmente nas que estavam por vir. Até o astral e a energia mudaram.

No meio do dia, Sam Farha veio e se sentou à minha direita. Apesar de ser um perigoso oponente, conseguimos ótimas situações contra ele. Aumentando meu stack gradativamente, terminei o dia com 142.000 fichas.

DIA 3
Um dia de altos e baixos. Consegui alavancar o meu stack para quase 300.000 por duas vezes, mas após uma sequência de potes perdidos, eu tinha 84.000.

A situação poderia ter sido pior, se um adversário não tivesse jogado uma mão muito mal contra mim. Ele acertou uma sequência no flop contra a minha trinca e, não sei por que, deu check/call nas três streets. Ele vacilou e eu sobrevivi. Novamente, meu Main Event estava em risco.

DIA 4
Com 15 big blinds, eu precisava dobrar urgentemente. Para complicar, na minha mesa estavam: Sorel Mizzi, à minha esquerda, com 738.000 fichas. Além dele, eu teria que enfrentar Huck Seed, com seus cinco braceletes e seu stack de 137.000, e o campeão do Evento #2, Brent Hanks, com quase 230.000.

Infelizmente, a árdua missão não terminou com sucesso. Caí antes do cabalístico número de jogadores ITM: 666.

O cutoff abre raise e eu, com 2-2, empurro meus 15 BBs do small blind. Ele pensa bastante, paga com A-8 e acerta a sequência máxima no river. Fim do sonho para mim. Acho que caí na 690ª colocação.

Eu brinco que, para um jogador de poker, o dia que você cai do Main Event WSOP é o pior do ano.  Mas bola para frente. Quem quiser acompanhar minha carreira, mandar perguntas, sugestões ou ser meu aluno, é só entrar em contato pelo meu twitter ou pelo site www.thedecano.com, feito em parceria com a Card Player Brasil.



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