EDIÇÃO 60 » COLUNA NACIONAL

Um peso, medidas diferentes


Felipe Mojave

No artigo desta edição, vou analisar uma mão que joguei no maior torneio de poker do mundo: o Main Event da World Series of Poker . Sendo um torneio bastante deep – 30.000 fichas iniciais com blinds subindo a cada duas horas – muitas estratégias que geralmente não são usadas em MTT’s normais, passam a ser armas importantes nesse torneio, principalmente no Dia 1.

Eu estava no meio da mesa e tinha pouco mais que as 30.000 fichas iniciais. Com os blinds em 150-300, recebi K10 e aumentei para 650. O big blind – um senhor que gostava de ver flops e blefava e arriscava-se com frequência – pagou. Ele também tinha praticamente o stack inicial.

O flop veio K 7 4. Um ótimo cenário para mim, já que eu tinha top pair e flush draw. Meu adversário pede mesa. Eu aposto 825, e ele dá raise para 3.000.

Aqui, tenho a primeira decisão difícil. A princípio, me pareceu um aumento alto e que, normalmente, caracteriza um draw. Mas, nesse caso, ele poderia ter uma mão forte, como uma trinca de quatros – ou também estar em um completo blefe. Devido à estrutura diferenciada e valor do buy-in, essa não é um decisão padrão.

Obviamente que eu não desistiria da minha mão no flop sem nenhuma informação extra. Ali, eu tinha plena convicção que o melhor a se fazer era dar call e ver o turn em posição. Um aumento estava fora de cogitação. Isso faria com que ele largasse mãos piores que a minha, e eu perderia a chance de extrair valor. E é claro que ele poderia fazer outro reaumento, e então eu teria que dar fold.



Paguei, e o turn trouxe um 3. Sem hesitar, ele apostou 4.000. Apesar de saber que, se ele estivesse blefando, ele continuaria apostando, essa também seria uma aposta de quem tem uma mão forte, melhor que a minha. Com base na jogada do meu oponente, eu ainda não possuía as informações que eu queria, mas, pelo menos, eliminava a possibilidade de ele estar em um draw. Então, dou call novamente.

O river é um 2, que não melhora a minha mão, e o bordo fica assim: K 7 4 3 2. Mais rápido do que no turn, ele dispara 6.600. Para mim, essa aposta não poderia ser nada como K-Q ou K-J. Dificilmente ele jogaria dessa maneira com essas mãos. Ainda assim, a aposta parece ter valor, mas por que apostar tão rapidamente? Afinal, eu representei muita força ao dar call no check-raise no flop e na aposta no turn.

Existem várias questões a analisar, porém um fator em particular me chamou a atenção, e me deixou bastante propenso a desistir a ideia do fold – que em uma situação com essa, seria minha opção pelo menos uma vez a cada quatro mãos. O valor da aposta daquele senhor era exatamente 6.600. Ele ficaria para trás com 15.000, três fichas de 5.000. Ou seja, ele havia apostado todos os “trocados”, o famoso “all-in das pequenas”. Se, normalmente, ele não joga nenhum rei dessa maneira, esse tell das fichas me deixou bem propenso a pagar.



Se eu estivesse errado, ainda ficaria com 14.000, cerca de 40 big blinds (BBs). Em contrapartida, se minha mão fosse a melhor, minha situação no torneio seria muito confortável.

Resolvi confiar na minha análise, e paguei. Infelizmente, eu estava errado. Meu oponente tinha K7, dois pares.

Sei que foi uma jogada muito arriscada, mas, naquele contexto, eu acreditei que seria uma boa oportunidade para acumular fichas. É bom deixar claro que em um torneio regular, eu provavelmente desistiria no turn – já que eu ficaria comprometido com o pote no river.

É uma mão interessante, que parecer ser bem normal, mas os conceitos para o Main Event são tão diferenciados que as análises não devem seguir uma linha ortodoxa. Foi um erro que me custou caro, mas, no final do dia, conseguir avançar, e com 63 BBs.

Espero que essa análise tenha acrescentado algo de bom no jogo de vocês, e vamos à forra.





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