Em outubro, tive o prazer de fazer parte da seleção brasileira de poker que foi a Londres disputar o campeonato mundial por equipes, a Nations Cup. O Brasil ficou com a medalha de prata, um grande resultado. Agora, compartilho com vocês alguns momentos marcantes dessa experiência inesquecível.
O torneio na capital inglesa foi o primeiro evento organizado pela International Mind Sports Association junto com a International Federation of Poker, depois que o poker foi reconhecido como esporte mental, em 2010. Portanto, aquela foi também primeira seleção brasileira oficial de poker. Por si só, já era um marco, independentemente do resultado que o time conseguisse. E o clima entre os jogadores o melhor possível, parecia uma reunião entre amigos. Mas, apesar do ambiente descontraído, a equipe estava levando tudo muito a sério.
Depois de mais de dezesseis horas de viagem, chegamos a Londres e fomos direto a uma reunião. Lá, Igor Federal, presidente da CBTH, nos passou uma mensagem muito positiva sobre o que o evento representaria para todos nós. Ele cobrou empenho, sobretudo por acreditar que tínhamos uma das seleções mais fortes entre as doze que disputariam a Nations Cup. Em seguida, Bill Castro, secretário executivo da Confederação, explicou como funcionaria o evento.
O próximo a falar foi o técnico da seleção, Marcos Sketch. Mesmo cansados, começamos a trabalhar questões estratégicas para o torneio do dia seguinte. Foi um papo bastante técnico, mas democrático, bem ao estilo do treinador. Analisamos o perfil das outras seleções e seus integrantes, jogador por jogador. Só depois dessa preleção nós saímos para jantar. E o dia seguinte seria longo.
Já recuperados da viagem, nosso primeiro evento do dia foi um seminário da IMSA, em que houve inclusive um discurso, em inglês, do Igor Federal. Depois, fomos uma festa de boas vindas para as seleções (incluindo a produtora de games online Zynga, considerada uma “nação digital”...) de todas as modalidades dos esportes da mente. Só então ação de verdade começaria.
Aconteceriam dois torneios de poker. Um nos moldes tradicionais, individual, e outro por equipes, no formato “duplicate”. Funciona mais ou menos assim: cada jogador teria posição e cartas pré-definidas pela organização. Ao final de 72 mãos, os stacks seriam convertidos em pontos para sua respectiva seleção. A ideia é ver como cada um se sai em determinada situação, já que em todas as mesas seriam disputadas as mesmas mãos, e a habilidade individual seria o diferencial.
Assim que as partidas terminaram e o resultado foi anunciado, vimos que o Brasil não tinha se classificado para a final. A sensação foi de grande decepção, mas também de perplexidade, pois a contagem não estava batendo com a que fizemos internamente. Conversando com a jogadora da seleção inglesa Liv Boeree, ela teve a mesma sensação com relação aos pontos da Inglaterra.
Tudo estava impecável. Eu nunca tinha visto um evento com aquela estrutura. Entretanto, a organização errara mesmo na contagem e decidiu anular o resultado daquele dia. Ao que parece, houve um problema na conexão de internet na “London Eye”, aquela famosa roda gigante de Londres. Como as partidas de várias modalidades estavam sendo disputadas em suas grandes cabines, inclusive o poker, a contagem ficou prejudicada.
Fato é que jamais soubemos se o Brasil tinha ou não se classificado para o dia seguinte. E já não importava. Nossa meta agora era rever os erros e lapidar a estratégia. Certamente, as outras seleções fariam a mesma coisa.
E muita coisa acabou mudando em nossa estratégia, por mais que eu a julgasse acertada. Refinar sempre é interessante. Nessa nova rodada classificatória, novo sufoco: conseguimos avançar para a final por um ponto apenas. Isso mostrou que cada ponto era valioso, e que um erro de contagem poderia comprometer toda a competição. No Duplicate Poker, o melhor jogador acaba sendo tanto o que ganha mais quanto o que perde menos, e cada mão têm um resultado diferente, mesmo sendo disputada apenas por profissionais. Essa modalidade deixou claro que, mesmo entre grandes jogadores, há aqueles que são diferenciados.
Classificados entre os seis melhores países, fomos com tudo para a grande final. Ficamos em segundo lugar, apenas dois pontos atrás da Alemanha, campeã da Nations Cup. Para se ter uma ideia de como foi apertado, se o Brasil tivesse ganhado apenas uma mão a mais contra os alemães, faria o mesmo número de pontos, e o chip count seria o critério de desempate. Foi exatamente isso o que aconteceu conosco em relação à França, terceira colocada.
Apesar da frustração por deixar escapar o título, comemoramos bastante o nosso resultado. Viver aquele momento e fazer parte desse time foi algo realmente especial. Foi um grande momento para o poker do Brasil, que teve sua força reconhecida lá fora. Mas a maior vitória para todos nós foi ver o poker ser reconhecimento pela sociedade brasileira como esporte da mente, graças a sua organização e seus resultados. Para todos nós, esta foi a maior conquista.
Quero parabenizar a todos os meus companheiros nessa luta, começando pela CBTH, com Federal, Bill e Juliano Maesano. Muito obrigado pela oportunidade. Agradeço também ao grupo, que teve, mais do que jogadores, amigos: André Akkari, Alexandre Gomes, Thiago Decano, Caio Pimenta, Christian Kruel, Daniela Zapiello e o nosso técnico Marcos Sketch. A toda comunidade do poker brasileiro, muito obrigado pela torcida e por encarar esses desafios junto com a gente.
Foi uma grande honra representar o meu país no campeonato mundial do esporte ao qual me dedico. Espero ter essa oportunidade novamente. Podem estar certos do que vou trabalhar para isso.
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