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Erik Seidel entra para o Hall da Fama do poker

Rebelde sem causa, o adolescente Erik Seidel pichava metrôs em Manhattan e invadia áreas restritas para fugir da polícia. Quem poderia imaginar que um sujeito assim se tornaria um dos mais tranquilos e educados jogadores do circuito internacional – e agora, membro do Hall da Fama do Poker.


Stephen A. Murphy

Com oito braceletes da World Series e mais de $10,3 milhões ganhos em torneios, é incrível que Erik Seidel ainda não tivesse sido conduzido ao Hall da Fama. Com serenidade e determinação, ele tem um dos currículos mais impressionantes da história do poker.

Ainda assim, muitos fãs do jogo não sabem quase nada sobre ele. Indiferente aos holofotes, Seidel simplesmente joga o jogo que ama, evita controvérsia e fala bem de seus colegas. Ele não perde a linha quando é vítima de uma bad beat, nem se gaba de seus talentos como tantos dos jogadores atuais.

Após mais de duas décadas no mundo dos high-stakes, com resultados espetaculares antes e depois do boom do poker, não há como negar que ele é um dos maiores nomes do jogo. Algumas décadas atrás, porém, enquanto Seidel crescia na cidade de Nova York, ninguém diria que ele estava predestinado à glória.

Perdido e Problemático
Durante boa parte da infância, Seidel cresceu sem uma figura paterna. Ele viu sua mãe criar dois filhos praticamente sozinha na cidade grande. “Até hoje, eu sinceramente não sei como ela conseguiu”, afirma. “Felizmente, ela tinha uma confiança enorme na educação, e se certificou de nos colocar em boas escolas apesar das dificuldades. Isso foi fundamental”.

Mesmo com um bom ambiente escolar, Seidel estava mais interessado no que os garotos da vizinhança faziam, como pichação e outras atividades escusas. “Eu provavelmente não chegaria longe”, pondera.
Mas, felizmente, sua vida estava prestes a mudar – tudo por causa de um jogo.

Encontrando Motivação na Vida, Graças a um Jogo
Do nada, um jogo que existia há muito tempo emergiu graças à mídia. Os jovens começaram a se interessar, e alguns inclusive resolveram abandonar a faculdade para jogar torneios em Las Vegas e outras cidades. Soa familiar? Bem, esse não foi o boom do poker nos anos 2000 – foi a explosão do gamão nos anos 70.

Como muitos garotos da sua idade, Seidel ficou fascinado com tudo aquilo. Para sua felicidade, ele morava na capital mundial do gamão.

“Na época, Nova York tinha os melhores jogadores do mundo”, disse. “Eu estava no lugar certo para aprender”.

À medida que se interessava mais e mais pelo gamão, Seidel ficava menos e menos interessado na rebeldia sem causa.

“Eu ainda era bem imaturo, e ao chegar a esse mundo passei a conviver com muita gente mais velha e muita gente mais inteligente; para mim, essa foi minha educação superior”, falou. “Tenho muita sorte de ter sido resgatado pelos jogos”.

A Mágica do Mayfair
O Mayfair Club é reverenciado por muitos dos grandes nomes do poker da atualidade. Era a cardroom underground de poker mais prestigiada de NY até ser fechada em 2000. De lá vieram monstros como Stu Ungar, Howard Lederer e Dan Harrington.

Antes de se tornar a cardroom mais famosa da Big Apple, o Mayfair era apenas um clube de bridge. Com a popularização do gamão, passou a ser lá o local que algumas das maiores mentes do mundo dos jogos discutiam estratégia e apostavam alto.

Com tantos galáticos ao seu redor, Seidel evoluiu no jogo e logo começou a ganhar um bom dinheiro. À medida que o dinheiro entrava, ele se tornava menos e menos interessado em sua graduação na universidade. “Tudo que perdi na faculdade, ganhei passando tempo com todas aquelas pessoas inteligentes no Mayfair Club”.

Embora um jovem conseguisse viver de gamão, o jogo não era tão lucrativo quanto o poker é hoje. Seidel estima que os melhores jogadores ganhavam cerca de $50.000 por ano. Muito pouco, se comparado aos milhões ganhos anualmente hoje em dia. Então, quando percebeu que poderia ter um trabalho em tempo integral graças ao Mayfair, ele agarrou a oportunidade.

O Tédio do Trabalho e um Novo Jogo na Cidade
Graças aos seus contatos, Seidel começou a trabalhar no setor de hipotecas de uma grande empresa, mas se sentia frustrado por achar que não tinha o perfil e que ganharia sempre pouco, apesar do seu bom desempenho.

Resolveu, então, trabalhar em Wall Street – foi nessa época que ele começou a aprender um jogo novo, o poker. “Eu estava em Las Vegas para o Campeonato Mundial de Gamão Amador”, disse Seidel. “Por sugestão de [Paul] Magriel, eu peguei um livro de [David] Sklansky sobre limit hold’em. Eu li e tentei jogar na mesa $1-$2, e milagrosamente consegui ganhar. Isso despertou meu interesse”.

Não demorou muito para que Seidel ficasse popular no Mayfair. “Nós apostávamos pouco, com fichas de gamão”, disse. “Foi assim que o poker no Mayfair se desenvolveu”.

Ele começou a ganhar dinheiro com o novo hobby e, com a quebra da bolsa de valores em 1987, Seidel se viu desempregado. Resolveu levar o poker um pouco mais a sério para continuar pagando suas contas. “Fui cauteloso no início – jogava apenas quando a mesa estava muito boa”, disse. Algum tempo depois, ele estava na $25-$50 com os melhores de Nova York. Não demoraria muito para que seus amigos o convencessem a ir à World Series of Poker.

O Vice-Campeão Mais Famoso da História do Poker
1987 foi um marco para os parceiros de poker do Mayfair. Quatro de seus jogadores ficaram entre os onze mais bem colocados no Main Event da WSOP naquele ano, com dois – Lederer e Harrington – chegando à mesa final e caindo em quinto e sexto lugar, respectivamente.

Foi Lederer quem primeiro “pilhou” Seidel para ir à WSOP de 1988.

Lisonjeado, mas ainda não convencido de que estava pronto, Seidel de início resistiu. Mas depois de uma ótima fase, com ganhos astronômicos (para os padrões da época), ele resolveu tentar a sorte.
Ainda conservador com seu dinheiro, ele resolveu “cavalar” 70% do buy-in. Ironicamente, Lederer não foi um dos que o patrocinaram.

Como se sabe, Seidel ficaria em segundo lugar, perdendo apenas para Johnny Chan em uma mão derradeira imortalizada no filme Rounders (Cartas na Mesa, EUA, 1998).

Ganhando a Vida e Sustentando a Família
Depois de receber 280 mil dólares no Main Event, sua boa fase continuou. Menos de um mês depois, ele derrotou um jovem desconhecido chamado Phil Hellmuth e ganhou outra premiação de seis dígitos – de 1992 a 1994, Seidel cravou um evento da WSOP por ano.

Em 1995, com o apoio de sua esposa, ele se mudou para Vegas, decidido a jogar em tempo integral. E seu sucesso foi ainda maior: Seidel acabou se dando bem em cash games – especificamente em uma mesa pot-limit Omaha com Doyle Brunson e Chip Reese – e continuou colecionando braceletes, vencendo eventos em 1998, 2001 e 2003.

Mesmo assim, ele sempre temeu a variância: “Sempre tive medo de quebrar. Não sei se, em algum momento da minha carreira, esse sentimento passou”, afirmou. “A pressão de ter uma família e jogar poker é muito diferente de ser solteiro e poder simplesmente ganhar ou perder. Quando minha segunda filha nasceu, eu enlouquecia pensando se realmente conseguiria sustentar duas crianças jogando poker”.
Apesar dos seus medos – e ao contrário de muitos profissionais de renome – Seidel jamais quebrou. E depois do boom da indústria em 2003, ficou claro que isso jamais aconteceria.

O Jogo Hoje
Embora Seidel admita que prefere a situação atual do poker, que é muito mais lucrativa, ele sente saudade dos velhos tempos.

“Eu gostava de quando você chegava para jogar um torneio e conhecia todo mundo”, disse. “Não havia TV, nem pessoas pulando e gritando. Se você jogasse bem, ganhava dinheiro. Não havia celebridades em busca de exposição”.

Uma coisa que Seidel adora no mundo do poker moderno é o desafio e o influxo de mentes brilhantes chegando. Embora admita que o jogo está ficando mais difícil, ele insiste que o poker permanece “vivo” porque ainda há muito a se aprender. Sem citar nomes, ele acredita que vários profissionais famosos da atualidade não sobreviverão no longo prazo.

Quando perguntando sobre jovens jogadores que ele realmente respeita, Seidel começou com um bastante popular: “Eu acho o Tom Dwan fantástico. Ele é criativo e brilhante. É agressivo demais, mas é tão inteligente que não isso não o prejudica. Pessoas que não jogam no nível dele – o que inclui todo mundo exceto, talvez, Phil Ivey – não sobreviveriam se tivessem o mesmo grau de agressividade”.

Seidel também mencionou Phil Galfond, Scott Seiver e Andrew Lichtenberger como jovens profissionais que ele admira.

O Que o Futuro Reserva Para Seidel
As conquistas de Seidel o colocaram em quarto lugar na lista de mais braceletes ganhos na WSOP, empatado com Phil Ivey, e oitavo na lista de mais dinheiro ganho. E ele ainda pode chegar ao topo dessas listas, mas não conta muito com isso.

 “Obviamente, seria ótimo, mas não acho que seja saudável pensar em coisas assim”, disse Seidel. “Seria legal ultrapassar Phil [Hellmuth], mas eu não acho que isso vá acontecer, ou pelo menos acho que Ivey chegará lá primeiro, com certeza”.

Mesmo hoje, com uma carreira de sucesso que lhe rendeu mais de $10 milhões em torneios, Seidel permanece humilde. Quanto ao seu futuro no jogo, ele diz que vai simplesmente continuar jogando, desde que continue gostando do que faz.

“Espero continuar gostando do jogo por muito tempo, gostar de competir e ser capaz de competir, pois o poker está ficando mais difícil e mais dinâmico”, afirmou Seidel. “Eu simplesmente espero que daqui a cinco ou dez anos eu ainda seja bom o bastante para competir e ainda tenha interesse pelo jogo. Caso contrário, vou procurar outra coisa para fazer”.

Nova Era, Mais Sucesso
Muitos jogadores de sucesso tiveram dificuldade em se ajustar ao poker depois do boom de 2003, com a vitória de Chris Moneymaker no Main Event.

Erik Seidel, ao contrário, tornou-se membro do Team Full Tilt e continuou fazendo sucesso. Confira seus principais resultados na Era Moderna do poker:

2004
Festa al Lago
1º no evento de US$3.000, prêmio de US$217.839
1º no evento de US$2.500, prêmio de US$175.347
3º no Main Event de US$10.000, prêmio de US$165.000

2005
WSOP
1º em um evento de no-limi de US$2.000, prêmio de US$611.795

2006
WSOP
Nove ITMs

2007
WSOP
1º no evento 2-7 Lowball, prêmio de US$538.835
Aussie Millions
2º no High Roller, prêmio de US$400.000
WPT
8º no Spanish Championship, prêmio de US$71.426

2008
WPT
1º no Foxwoods Poker Classic, prêmio de $992.890
Aussie Millions
2º no Main Event, prêmio de US$880.000

2009
WSOP
8º no evento H.O.R.S.E de $50.000, prêmio de US$162.382.
WPT
6º na Bellagio Cup de $15.000, prêmio de US$162.618

2010
Aussie Millions
1º no evento de Pot-limit Omaha, prêmio de US$107.085
NBC
2º no Heads-Up Championship, prêmio de US$250.000
WSOP
5º no evento PLO Hi/Lo de US$5.000, prêmio de US$85.800
6º no 2-7 Draw Championship de US$10.000, prêmio de US$41.270
ITM em outros dois eventos

 

‘ACTION DAN’ ENTRA PARA O HALL DA FAMA
Por Justin Marchand

Mestre em xadrez, ex-campeão de gamão, advogado, escritor e superestrela do poker: esse é Dan Harrington. Nada mal para quem nunca se não se dedicou ao poker em tempo integral.

Na verdade, ele passou toda sua vida transformando suas habilidades competitivas em sucesso financeiro. Acumulou mais de $6 milhões ganhos em torneios, boa parte na WSOP

Também é verdade que “Action Dan” jogou pouco nos últimos 15 anos. Ele foi revelado em 1995, ao ganhar dois braceletes da World Series, incluindo o do Main Event.

Surpreendentemente, ele então “se aposentou” do poker. De 1996 até 2003, ele passou o tempo transformando seu negócio, a Anchor Loans, na maior instituição de empréstimos para aquisição imobiliária dos Estados Unidos. Depois de assistir ao poker na TV em 2003, ele não se aguentou e pensou: “Eu me lembro como se joga no-limit hold’em. Sei jogar melhor do que esses caras”, e resolveu voltar à ativa.

E ele realmente não estava para brincadeira: Dan Harrington chegou à mesa final do Main Event em 2003 e 2004, terminando em terceiro e quarto lugar, respectivamente.

Embora suas conquistas nos feltros o tenham qualificado para entrar no Hall da Fama, suas contribuições longe das mesas também abriram portas. Um dos critérios do Hall é que o candidato “tenha contribuído para o crescimento e sucesso do jogo de poker com positividade indelével e resultados duradouros”.

Embora Harrington não atue como embaixador do jogo viajando o mundo e participando de eventos de poker, suas publicações não têm rival na área. Devido ao seu alcance, Harrington deu exposição global ao Texas Hold’em e deixou como legado um sofisticado estudo do jogo.

Em 2004, ele sacudiu o mundo editorial do poker com sua trilogia Harrington no Hold’em. O tratado, escrito com a ajuda de Bill Robertie, tornou-se uma bíblia para todos os jogadores sérios de torneios. Parabéns, “Action Dan”, o Hall da Fama do Poker também é seu.





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