A VIDA COMO ELA É
As pessoas gostam de fórmulas mágicas. Segredos mirabolantes são o tema mais recorrente em livros que acabam se tornando best-sellers. Penso que pelo menos um terço do mercado de revistas comuns faz uso dessa lógica também. Você olha para a prateleira e lê: “Emagreça 5kg em duas semanas”, “Suma com a celulite em dois dias”, “Pesquisadores Vislumbram a Cura do Câncer”, “Fique Rico sem Sair de Casa” etc. Loterias, tele senas, rifas e cassinos enriquecem graças a isso... Jogadores profissionais de poker também! Minhas contas são pagas graças à esperança que os meus adversários têm de que algo mágico aconteça e as coisas mudem.
Muitas pessoas jogam mal, não estudam e não se importam com isso. São displicentes em seus métodos. E você colhe aquilo que planta. Esses jogadores querem ganhar, mas não enxergam que, no longo prazo, o sucesso no poker praticamente independe da sorte ou do acaso, mas sim de trabalho duro e dedicação. Em teoria , Yevgeniy “Jovial Gent” Timoshenko joga melhor do que eu porque estuda o jogo mais do que eu, porque é mais experiente e porque, quando joga, consegue utilizar fazer uso mais conhecimentos do que eu em cada decisão. Portanto, se eu quiser ganhar tanto dinheiro quanto ele, preciso adquirir um volume de experiência igual ao dele, me dedicar tanto quanto ele à compreensão do jogo, e focar em jogar o meu melhor em todas as mãos que disputar, sem deixar que meu raciocínio se dilua em outras distrações, como televisão, internet ou preocupações cotidianas. Em resumo, o que faz com que ele ganhe o que ganha é a forma como aborda o jogo: e o mesmo vale para mim e para você, leitor. Ou seja, você ganha – ou perde – exatamente na proporção da qualidade do seu método de abordagem do jogo.
Quantas pessoas estão infelizes com seu aspecto físico? Elas consomem toda sorte de produtos estéticos, leem livros sobre dietas e receitas milagrosas, gastam fortunas com personal trainers, academias e por aí vai, quando no fundo elas sabem que isso de nada adianta se não tiverem hábitos alimentarem saudáveis e leves . Mas então, por que elas não fazem isso? Porque é um processo chato e doloroso. Aceitar a dor e abraçar a chatice como rotina diária é algo que apenas os mais obstinados são capazes de fazer.
Existe um dilema que ocorre numa fração de segundo dentro de nossas cabeças quando enfrentamos esse tipo de situação: “Devo admitir que não sou capaz de alcançar os meus sonhos porque sou fraco ou devo me fazer de bobo e sair em busca de uma fórmula mágica?” Quase sempre, eu, você e todos os seres humanos optamos pela segunda opção. É natural.
É extremamente difícil espezinharmos nosso ego, mas adquirir essa capacidade é o primeiro passo para o sucesso. Sem isso nós tendemos à estagnação, ao vício de fugir da vitória por temer as dificuldades do caminho. O “trono da glória” possui espinhos afiados – sentar-se nele é doloroso e incômodo, não é confortável. Sucesso e dor andam de mãos dadas: se você quiser vencer, precisa enfrentar o sofrimento.
Objetivamente falando, você quer ganhar dinheiro com o poker? Sim? Então, por mais insuportável, dispendioso e maçante que seja, leia todos os livros de poker que existem em português, de capa a capa, mais de uma vez se for preciso; abra seus hand histories e encare seus defeitos; desligue o som, a TV e o navegador quando estiver jogando; não tome decisões de maneira emocional e leviana. Enfim, discipline seus métodos. Só então você começará a trilhar o caminho do sucesso, o qual passa, inevitavelmente, pelo estudo da teoria.
O COMEÇO DA TEORIA: AS IMPLICAÇÕES DO INDEPENDENT CHIP MODEL (ICM) NA DINÂMICA DOS TORNEIOS DOUBLE-OR-NOTHING
Quem está mais familiarizado com a técnica do sit’n go já ouviu falar em Independent Chip Model, ou ICM. Nos DONs, esse índice tem relevância por causa da estrutura de premiação. Basicamente, a ideia do ICM gira em torno do seguinte axioma: ganhar fichas não significa propriamente ganhar dinheiro, entretanto, perder todas as suas fichas significa diretamente perder dinheiro. Como resultado do ICM, as relações risco/recompensa se tornam diferentes em cada espécie de torneio de acordo com o formato de premiação.
Nos DONs, o jogo se inicia com dez participantes, sendo os cinco últimos sobreviventes igualmente premiados. Assim, todos os jogadores a priori possuem uma chance de 50% de entrar na faixa de premiação. Se assumirmos que todos os jogadores possuam exatamente a mesma habilidade e a mesma quantidade de fichas, quando um jogador é eliminado, as probabilidades de os demais jogadores sobreviventes ficarem ITM aumenta para 5/9 (55,55%). Com dois eliminados, elas são de 5/8 (62,5%). Com três fora, elas vão para 5/7 (71,42%). E, finalmente, quando a bolha chega, as chances aumentam para 5/6 (83,33%).
Diante disso, percebemos que jamais deveríamos aceitar um confronto arriscando todas as fichas quando as nossas chances de vitória fossem menores do que a probabilidade de ficarmos ITM. Para esclarecer as coisas, vamos imaginar o seguinte: se estivermos na bolha e todos os jogadores possuírem exatamente a mesma quantidade de fichas, as chances de cada um se sagrar vencedor é, como vimos, de 83,33%. Estamos no big blind e a mesa roda em fold até o small blind, que empurra all-in. Temos K♣ K♠ na mão. Devemos pagar? Não, pois é provável que a chance de vencermos esse confronto se encontrem entre 70% e 80%. Nossa equidade de fold atual é de 83,33%. Trocando em miúdos, se déssemos call com os nossos cowboys e encontrássemos algo ruim como 7♥ 2♥, estaríamos cometendo o mesmo erro de de alguém que acha que 80 é maior do que 83 e, portanto, acaba jogando dinheiro fora. É exatamente isso: estamos trocando dois reais por um real simplesmente para saciar nossa vontade de confrontar um ladrão de blinds com par de reis.
Entendido esse conceito, vamos ao próximo degrau da nossa escada de raciocínio. Assim como na bolha, às vezes temos que fugir com par de reis quando há sete participantes restantes. E aceitar uma confrontação com AK também não é grande negócio. Abaixo, segue uma tabela de laydowns. Vejamos:
Como reflexo de toda essa lógica, há uma constatação também muito interessante, que é a de que o valor dos pares altos, com exceção de AA, é menor em torneios DON, quando comparado com os SNGs comuns ou com os MTTs. Geralmente, a chance de vitória de mãos como KK, QQ e JJ quando encontram resistência gira em torno dos 70% (por exemplo, Q♣ Q♠ versus A♦ 6♣). Assim, mãos como essas não são mais qualificáveis para se jogar até as últimas consequências se estivermos com um stack mediano e restarem apenas seis ou sete jogadores. Se estivermos com muitas fichas , possivelmente precisaremos dar fold se ainda restarem oito jogadores. Doloroso, concorda? Sim, é realmente desagradável largar essas grandes mãos, entretanto, não fazer isso é o mesmo que doar dinheiro aos adversários. Então, apesar de ser amargo, eu faço. Curiosamente, isso também é um motivo de grande alegria. Pouquíssimos jogadores são capazes de fazer esses laydowns e, justamente por isso, existe tanta equidade desperdiçada nos DONs. Em outras palavras, há um monte dinheiro grátis esperando para ser colhido por alguém capaz de dar esses folds bizarros. Eu comprei o carro dos meus sonhos à vista mês passado, graças à incontrolável vontade que meus oponentes têm de jogar com mãos “bonitinhas” como Q♣ Q♦, A♥ K♥ ou J♣ J♦.
IMPLIED ODDS: LENDAS, VERDADES E MENTIRAS
Eu gosto de classificar os torneios de uma maneira geral, mas especialmente os DONs, como se eles possuíssem três etapas distintas: o início, o meio-jogo e o final. O início ocorre enquanto os stacks estão deep e não há muitos atrativos em se atacar os blinds. O meio-jogo se dá quando os estoques já não são tão grandes, sendo atraente – mas não primordial – o roubo dos blinds. O final, por sua vez, acontece quando os stacks são tão pequenos em relação aos blinds, que o roubo se torna um elemento essencial.
Jogar bem a reta final é uma questão de análise de stacks e interpretação dos comportamentos do “Conceito de Gap” . Para quem não lembra, esse conceito foi criado por David Sklansky e diz respeito à diferença que há nas gamas de mãos para se abrir um pote e para se oferecer resistência a alguém já abriu o pote previamente. Em outras palavras, ele diz que para você “pagar” um raise, deve estar uma mão melhor do que teria se você fosse “dar o raise”. Assim, vemos que a gama de raise e gama de call mudam de acordo com as estruturas de pressão do jogo, dos pontos de inflexão.
No meio-jogo, a qualidade é regida principalmente pela capacidade de gerenciamento de defesa e ataque. Em outras palavras, o jogador bem sucedido nesta etapa é aquele que consegue identificar, com clareza, situações de perigo e situações lucrativas. Finalmente, a sua habilidade de jogo no início do double-or-nothing pode ser resumida, sobretudo, na capacidade de administrar os desdobramentos subjetivos e implícitos do jogo. Em bom português, quão bem você entende o conceito de implied odds. É isso que veremos agora, as vantagens implícitas.
Eu me arrisco a dizer que implied odds é o conceito mais mal compreendido e pior ensinado de todo o poker. O grande problema é que esse traz todo um universo de possibilidades e perspectivas complexas que acabam sendo resumidas em frases do tipo: “se eu conseguir uma trinca, posso fatiá-lo”. Esse tipo de simplificação conceitual atrapalha seu uso eficiente. As pessoas vão pagando apostas e quebrando todas as técnicas do jogo previamente concebidas sob a desculpa das implied odds . Como resultado, sua técnica acaba ficando pobre e desnorteada. Então, vamos tentar colocar tudo em seu devido lugar.
Primeiramente, um conceito eficiente: Implied odds são os lucros que você obtém por jogar melhor do que o adversário. Está surpreso? Pois é verdade. Phil Ivey ganha dinheiro porque as mãos com que ele joga possuem implied odds maiores. Guy Laliberté é o maior perdedor dos high stakes pelos mesmos motivos, ou seja, as cartas dele não possuem implied odds contra as pessoas com quem ele joga. O fator implied odds não diz respeito exclusivamente às cartas, mas também às pessoas. Trata-se de quão boa são as suas decisões comparativamente às dos seus oponentes. Na verdade, é o jogador que possui implied odds sobre outros, e não as cartas.
Você deve estar se perguntando: “E aquela história de que mãos como 33 possuem implied odds, é tudo mentira? Andres está ficando maluco?” Não, eu não enlouqueci. É verdade que os pares baixos possuem implied odds, mas talvez você não esteja entendendo muito bem o porquê. Algumas mãos no poker são mais fáceis de jogar do que outras. Então, utilizando o “dobre de caranguejos” (33) como exemplo, perceba que é uma mão muito simples de se jogar bem após o flop: se você não trincar, estará fora diante de qualquer aposta significativa – jogando assim você estará agindo bem. Simples, não? Se trincar, tentará construir um pote grande. Enfim, jogar com 33 após o flop é algo simples. Em contrapartida, enfrentá-los pode causar muita dor de cabeça. O oponente que encara uma sorrateira trinca de três está flertando com o perigo. A jogada correta para ele deveria ser check/fold. Entretanto, apenas um gênio mediúnico seria capaz de fazer isso quando estivesse segurando algo como TPTK (top pair top kicker). Então a questão é: quão mal ele jogará? Quão distante do check/fold serão as decisões dele? Provavelmente, a distância será enorme. Trocando em miúdos, ele jogará muito mal.
Agora imaginemos que um superpato esteja enfrentando um monstro sagrado como Johnny Chan. Chan tem TPTK e o superpato acertou uma trinca. Quanto de prejuízo Johnny terá? Digamos que seja $X. Agora, e se trocarmos os papéis? E se Chan tiver a trinca e o superpato tiver TPTK? Qual será o prejuízo dele? Provavelmente $10X. Perceba que essa diferença de valores é culpa das implied odds, que, por sua vez, são compostas tanto pelas características das cartas como pela qualidade do jogador. Quer ver um exemplo real? Digite “Daniel Negreanu An Other Interesting Read” no youtube.
Assim, se vantagem implícita é uma questão de habilidade na tomada de decisões, então implied odds é uma questão intrinsecamente ligada à posição? Sim, exatamente! Ter posição é tão importante no poker justamente por isso, porque aumenta as implied odds de todas as suas mãos, enquanto simultaneamente diminui as dos adversários. Se Daniel Negreanu enfrentasse um jogador amador decente em um confronto heads-up e sempre tivesse que jogar fora de posição, eu apostaria meu dinheiro no amador! Loucura? Não. O próprio Daniel, em seu livro More Wisdom for All Players, afirma a mesma coisa. Portanto, fique esperto: pagar uma aposta do button com 55 é bem diferente de fazer a mesma coisa quando se está no big blind. Nesta posição, um call com uma mão dessas significa melhores pot odds, uma vez que você já pôs algum dinheiro no pote; contudo, as implied odds desabam barranco abaixo. Com isso em mente, vamos adiante na estratégia para os blinds baixos dos torneios DON.
A maioria das apostas antes do flop tem como objetivo principal a conquista dos blinds. Parece que não, mas é verdade. Imagine que não houvesse nem small, nem big blind e nem ante. Faria algum sentido colocar uma aposta com algo que não fosse AA? Os valores postos pelos blinds é que instigam a ação. Quanto maiores eles forem, mais motivos se tem para apostar. Inversamente, quanto menores os blinds em relação aos stacks dos jogadores, menos se deve querer apostar. Então, como a sua estratégia de jogo deve se adequar a estes momentos? Simples, você não deve jogar procurando ganhar os potes padrão, mas sim os stacks inteiros dos jogadores. É preciso alinhar a sua maneira de jogar de modo a conseguir ganhar todas as fichas dos oponentes, mesmo que isso signifique uma queda de eficiência na conquista de potes. O que isso quer dizer na prática? Ardilosidade. São aqueles slowplays maldosos com KK e AA antes do flop, é entrar de limp com AK para que seus oponentes supervalorizem erroneamente mãos do tipo AX. Enfim, é jogar de modo a induzir seus oponentes a cometerem erros grandes, que custem todas as fichas deles, mesmo que isso signifique um desperdício de equidade ocasionalmente. Veja bem, apostar três big blinds com AA, ser pago, então colocar 2/3 do pote no flop e ser pago, e finalmente apostar no turn para o oponente desistir, significa lucro. Entretanto, quando estamos nos blinds 10/20 com 1.500 fichas no stack, o lucro dessa jogada não é grande o bastante para determinar sua vitória. Diante disso, é interessante jogar de forma mais arriscada e perniciosa. Mas cuidado para o tiro não sair pela culatra.
Na prática, eu gosto de jogar com todos os pares de todas as posições dando limp e pagando apostas de até 10% do stack efetivo. As únicas exceções são QQ, KK e AA, que eu jogo com uma mistura de 70% de bet/raise e 30% de limp/call. Com AK, faço uma mistura de 50% limp/call e 50% de bet/raise. Também entro com todos os suited connectors e todos os AX quando houver mais de dois jogadores no pote e eu tiver posição contra eles. Eu dedico especial atenção ao jogar com AQ, AJ, KJ, 99, TT e outras “mãos-armadilha”. Normalmente, essas são as mãos com que eu costumo vitimar meus oponentes, que frequentemente jogam da mesma forma ardilosa. Assim, procuro não cair no meu próprio repertório de truques.
ANTES DE SE MOVER, DESCUBRA SE SUA MÃO É ACIMA DA MÉDIA
Saber se sua mão é acima da média faz com que você tenha segurança e consiga efetuar um all-in sem peso na consciência. Eu utilizei um programa chamado Sit’n Go Power Tools para realizar estes cálculos e decorá-los. Contudo, seria exaustivo transmiti-los na íntegra aqui na revista. Em vez disso, prefiro mostrar a vocês como eu acabei memorizando todos esses dados e como raciocino quando estou jogando. Para tanto, desenvolvi as seguintes regras:
Regra da equivalência das mãos: Um par na mão possui a mesma equidade de push que uma mão naipada com ás e a segunda carta com valor mais alto do que o do par. Por exemplo, 4♣ 4♠ equivale a A♥ 5♥. Uma mão não pareada de mesmo naipe equivale a uma de naipes diferentes com a mesma carta alta e um kicker maior. Nesse caso, A♥ 5♥ equivale a A♦ 6♠. Finalmente, uma mão pareada de naipes diferentes equivale a uma de naipes iguais em que a carta alta é um kicker menor e a carta baixa, um kicker maior, comparativamente. Dessa forma, A♦ 6♠ equivale a K♣ 7♣. Conclusão: se você, em determinada situação, daria push com 7♣ 7♠, pode tranquilamente agir da mesma forma e empurrar com A♠ 8♠, A♠ 9♣, K♦ T♦, K♠ J♥.
Regra da equivalência das posições: Ir all-in com 4-4 contra um único adversário (típica situação de small blind versus big blind) possui a mesma equidade de empurrar todas as fichas contra dois adversários segurando 5-5 no button, que, por sua vez, equivale a empurrar com 6-6 do cutoff quando há três jogadores ativos esperando para agir, e assim por diante.
Levando em conta que a mão média é Q-8, podemos traçar as equivalências para dar push com mãos acima da média de qualquer posição da mesa. O raciocínio segue assim: Q♣ 8♠ equivale a Q♦ 7♦, que por sua vez é igual a K♦ 6♥, que é seguido por K♠ 5♠, que empata com A♥ 4♣ ou com A♣ 3♣, que tem a mesma equidade de 2♦ 2♣. Caminhando pela outra via, Q♣ 8♠ equivale também a J♦ 9♣ e a J♦ T♦ e por aí vai.
Assim, seu range de mãos para empurrar all-in com uma mão acima da média numa situação de small contra big blind deveria ser o seguinte: 22+, A3s+, A4o+, K5s+, K6o+, Q7s+, Q8o+, J9s+, JT. E quando você estiver no button? A gama ficaria em 33+, A4s+, A5o+, K6s+, K7o+, Q8s+, Q9o+, JTs. Particularmente, eu não memorizo todas as gamas, mas apenas o par dela, então, à medida da necessidade, enquanto jogo eu vou deduzindo as demais cartas. Na minha cabeça funciona assim, “do CO+1 eu dou push com 55+ e equivalências”.
Diego Sette, membro da comunidade PokerMania, no Orkut, converteu essa abordagem em uma fórmula matemática. Veja como ele fez: “Observei que, do small blind, deveriamos dar push com 22+, A3s+ etc, além das mãos supracitadas. Colocando isso com variáveis, poderia ficar o seguinte (admitindo como relação de mãos sendo XX+): A(X+1)s+, A(X+2)o+, K(X+3)s+, K(X+4)o+, Q(X+5)s+, Q(X+6)o+, J(X+7)s+, J(X+8). Admitindo-se para o small blind que X=2, e acrescendo X+1 a cada posição antes do SB. Por exemplo, do button seria X+1=3. Depois é substituir na parte das mãos”.
Eu sei que pode parecer um tanto complicado , mas acredite: foi a forma mais simplificada que encontrei. Então, esforce-se para aprender a utilizar as equivalências, e os lucros surgirão imediatamente.
ENTENDER COMO VOCÊ PERDE É A MELHOR MANEIRA DE COMEÇAR A GANHAR
Para se aperfeiçoar em torneios de poker é preciso, antes de tudo, estudar sua saída deles. Afinal, esse sempre será o desfecho e o curso para onde suas estratégias prévias, tanto de início quanto de meio, irão fluir. Sua eliminação de um torneio pode ser analisada separadamente, enquanto o início e o meio devem ser estudados unicamente com relação ao final.
Certo dia, um amigo veio me perguntar qual estilo de jogo eu gostava de aplicar no início dos torneios, e eu respondi que isso não era tão relevante. Ele se surpreendeu e insistiu: “Mas então como você se comporta nos níveis iniciais?” Respondi-lhe prontamente que quase todos os estilos de jogo são efetivos no início de um torneio.
A maioria dos livros de poker ou está equivocada ou parte de uma premissa que eu considero falsa: não se tanto importe com o estudo dos níveis iniciais, dedique-se mais ao final do torneio – ou melhor, ao final do seu torneio, às mãos que precedem sua eliminação. Estou certo de que você terá mais proveito assim.
Na época em que meu amigo me questionou sobre o assunto, eu tinha uns vinte anos. Ele, muito mais velho, não aceitou minha recomendação – provavelmente tomou-a como um conselho de garoto, sem experiência suficiente. No entanto, o resultado foi que ele nunca ganhou um torneio grande ou qualquer dinheiro relevante no poker, mas aprendeu muitas formas de jogar quando sua vida no torneio ainda era longa. Pessoalmente, devo acrescentar que minha habilidade de jogo, quando minha eliminação no torneio era iminente, me proporcionou muitas reviravoltas e vitórias ressonantes, tanto em SNGs quanto em MTTs.
Esse fato evidente tem sido posto de lado por quase todas as autoridades na matéria, com resultados nocivos para a grande maioria dos jogadores . Na verdade, há três premissas ruins das quais muitos autores partem:
1. Vincular a estratégia de jogo ao estágio do torneio, em vez de relacioná-la com o estágio da sua vida nele.
2. Estudar as etapas de um torneio de forma progressiva, ou seja, do início para o final, em vez de partir do final para o início.
3. Supervalorizar as táticas em detrimento da estratégia, obscurecendo o real objetivo do jogador, que é vencer o torneio, em vez de fazer o máximo possível de jogadas com EV positivo.
Muitos amantes do poker encaram os estágios finais da sua vida no torneio com desdém, como um momento monótono e encalacrado, no qual não há espaço para movimentos astutos, grandes blefes ou qualquer ação imaginativa. Se você prestar atenção e estudar os finais práticos, perceberá que esse estágio, além de extremamente complexo, dispõe de ideias originais em abundância: a habilidade e a capacidade de jogar de forma tática são essenciais para o sucesso no final.
Durante um blefe nos estágios iniciais e medianos da sua vida no jogo, a maior parte das suas fichas acaba sendo apenas observadora passiva do espetáculo. Um blefe na reta final, no entanto, exige a participação de todo seu stack, e um erro pode ser mortal. As fases inicial e intermediária possuem muitas possibilidades eficientes porque as consequências da imprecisão não são tão grandes, já os múltiplos finais em que você recorrentemente se encontrará exigirão meticulosidade. São as habilidades de se jogar bem nos estágios finais da sua vida em torneios que realmente determinarão a qualidade do seu jogo.
Para jogar de forma eficiente na sua reta final, você precisará olhar para todo o labirinto de possibilidades e encontrar uma saída, e então solidificá-la em sua mente e percorrê-la de forma astuta e cuidadosa toda vez que estiver com sua vida no torneio por um fio. Para auxiliá-lo nesta tarefa, construí uma metodologia que tem aplicação universal :
(1) Avaliação e Julgamento da Situação
(2) Escolha das Diretrizes Para o Plano de Recuperação
(3) Construção do Plano de Recuperação
(4) Consolidação do Plano em Ranges e Oportunidades de Ataque
(5) Reajuste e Reavaliação do Plano
Vejamos então, detalhadamente, o que essas etapas significam e como você deve percorrê-las: se deve percorrer cada uma dessas etapas:
AVALIAÇÃO E JULGAMENTO DA SITUAÇÃO
Nesta etapa, você vai construir a base de sustentação do seu plano de recuperação. Certamente, é a mais importante de todo o processo. Ela consiste no estudo, avaliação e julgamento da sua situação no torneio. Aqui, você precisa identificar suas deficiências e as dos seus oponentes, assim como o método de explorá-las. Também será necessário avaliar a sua força relativa contra cada um dos adversários, procurando descobrir quem são os oponentes mais pressionáveis, assim como os melhores métodos de pressão.
Para tanto, mapeie os estilos de jogo e os padrões de apostas dos seus adversários à procura das forças e das fraquezas. Pense em como você pode defender-se das forças de cada deles, depois julgue como deverá explorar as respectivas fraquezas. Esteja atento a cada indivíduo da sua mesa, pois você não saberá contra quem efetivamente acabará tendo que colidir. Observe quais stacks estão mais sujeitos à pressão, e qual seria a maneira mais eficiente de fazer isso.
Enfim, monte um diagnóstico mental de toda a situação. É nos estágios finais da sua vida em um torneio que as habilidades de rastreamento, refinamento e administração das informações da sua mesa se tornarão mais valiosas. Seu sucesso dependerá menos das suas cartas , e muito mais de sua capacidade de pesquisa e gerenciamento de informações.
ESCOLHA DAS DIRETRIZES PARA O PLANO DE RECUPERAÇÃO
Aqui, você vai traça a linha que regulará seu plano de recuperação. Será preciso definir o limite do risco a que você vai se expor. Traduzindo: o quão ousado será o seu plano de recuperação.
A fim de fazer isso, você terá que decidir se sua estratégia se baseará na espera e na exploração de equidades efetivamente positivas, ou se você percorrerá um caminho sustentado por equidades principalmente marginais (coinflips, semiblefes etc.), ou, ainda, se você procurará se agarrar a equidades ligeiramente inferiores.
Sua decisão será regida de acordo com os parâmetros obtidos pela sua “avaliação e julgamento da situação” (Etapa 1), assim como pela intensidade com que a pressão do jogo recai sobre você, ou seja, qual o ritmo de pressão que os blinds e adversários estão impondo ao seu stack. Talvez em algumas situações você precise se mover apenas uma vez por órbita, e em outras você perceba a necessidade de se movimentar três vezes a cada duas órbitas. Enfim, cada situação exigirá um volume de ação por órbita. No entanto, atente que equidades efetivamente positivas demoram mais para surgir do que oportunidades de equidades marginais e, ainda, que estas não serão tão frequentes quanto as equidades ligeiramente inferiores. Perceba também que uma decisão errada nesse ponto pode pôr tudo a perder, porque se esperar por mais tempo do que sua estratégia suporta, você sucumbirá. Por outro lado, se esperar tempo de menos, também sacrificará suas possibilidades, distanciando-se do plano ideal.
CONSTRUÇÃO DO PLANO DE RECUPERAÇÃO
Agora você precisará efetivamente construir um plano de recuperação para atingir seu principal objetivo: sair do estágio terminal e retornar para o intermediário. Com base nas suas avaliações e julgamentos da situação (etapa 1) e nas suas diretrizes estratégicas (etapa 2), você esculpirá seu plano, que poderá ou não ser dividido em planos menores, com cada etapa podendo suportar diferentes riscos. Ele consistirá na especificação de como e quando explorar as suas vantagens e as desvantagens dos adversários.
Por exemplo, você pode decidir escalonar o seu plano em três fases. A primeira pode consistir no objetivo de se recuperar de doze para mais de vinte big blinds, centralizando seu jogo em pushs do cutoff ou de uma posição melhor (BTN/SB), quando a ação chegar “no Gap” para você, enquanto paralelamente você efetuará flat-calls contra o jogador X, indo all-in depois do flop independente das cartas que foram abertas, e ainda jogará com suas mãos fortes e com todos os pares empurrando all-in de qualquer posição. A segunda fase pode ser reerguer-se de vinte para trinta big blinds, baseando-se principalmente em re-steals all-in contra os jogadores “Y” e “Z”, e ao mesmo tempo você irá all-in contra os blinds quando receber a ação “no Gap” no button ou no SB, e irá efetuar stop – check-raise – go (dar call pré-flop, check no flop, tomar c-bet e voltar all-in) contra os jogadores “W” e “V”, além de, claro, explorar suas mãos com valor. Uma terceira etapa pode consistir na recuperação de trinta para cinquenta blinds através de movimentos articulados e especulações contra jogadores que superestimam mãos marginalmente fortes.
CONSOLIDAÇÃO DO PLANO EM RANGES E OPORTUNIDADES DE ATAQUE
Hora de pôr a mão na massa e trazer para a realidade o seu plano de recuperação. Você precisará escolher especificamente os seus ranges de mão e as oportunidades em que vai utilizá-los concretamente. Note, contudo, que a velocidade do seu plano não necessariamente será importante, mas sim o ritmo dele. Pode-se muito bem construir um plano lento, desde que seu stack cresça proporcionalmente ao nível do blind, uma vez que, se assim for, as estruturas de pressão não se modificarão com o tempo. Frequentemente, você deverá efetuar planos de recuperação longos, pois quanto mais prolongado ele for, maior será a probabilidade de seus adversários acabarem errando, apressando-se em tentar eliminá-lo.
Por exemplo, suponha que você esteja com dez big blinds e venha permanecendo vivo com o mesmo tamanho de stack já há dois níveis de blind inteiros, sendo muito mais provável que seus adversários alarguem os ranges de mãos deles para eliminá-lo. Isso aumenta a probabilidade de que você consiga ação para dobrar com suas mãos grandes, e até mesmo um all-in com AX poderia acabar resultando em uma confrontação na qual você seria favorito, como num embate contra KT ou mãos similares.
REAJUSTE E REAVALIAÇÃO DO PLANO
Torneios de poker são dinâmicos, sendo normal que as condições mudem com o tempo. Algum jogador pode tiltar ou ser eliminado, você pode ser mudado de mesa, então tudo se altera. À medida que avança com seu plano, você vai precisar reajustá-lo de acordo com as mudanças na dinâmica da mesa, assim como quando as condições se distorcerem demais, você precisará reavaliar o seu plano de recuperação como um todo.
FECHA A CONTA E PASSA RÉGUA
Por hora, pessoal, é isso. Gostaria de ressaltar que tudo o que conversamos até agora, de certo modo, aplica-se também aos SNGs normais e aos torneios multitable. Estude atentamente esses conceitos. Dê o melhor de si. E espero que você tenha sucesso em sua carreira nos torneios double-or-nothing.
OS DEZ MANDAMENTOS DO DOUBLE OR NOTHING
1. No BSB só não morre quem atira. BSB é a sigla para “Button, Small e Big Blind”, e é utilizada para indicar aquelas situações em que todos os jogadores dão fold até o button, e o jogo se resume a essas três posições. Nessas situações, quando o pote inicial representar um incremento de pelo menos um sétimo do seu stack (M<7), a menos que algo esteja muito fora do lugar, ir all-in é uma jogada com uma equidade (em dinheiro, não em fichas) positiva, independente das cartas que estiver segurando. Portando, se você estiver no BSB e a ação chegar “no gap”, empurre a pamonha e aposte todas as suas fichas. Acredite, se alguém der call com AA e ganhar, você tomou uma bad beat!
2. Quando triplicar seu stack inicial, vá tomar um café.
Quando seu estoque atingir tais dimensões, 99% das vezes você chegará entre os cinco premiados – desde que não cometa suicídio. E a única forma de você se suicidar é jogando. Não permita que isso aconteça: acione o sit out, vá dar um passeio e esqueça o jogo por uns cinco ou dez minutos. Se depois desse tempo o DoN não tiver acabado, clique no botão “I’m Back” e volte para o jogo. Sim, eu sei que ver um par de ases reluzente ir para o ralo com um fold automático dói, mas esse é um mal necessário. Lembre-se que você não joga para pilotar grandes mãos ou eliminar adversários – joga para ganhar dinheiro, ponto.
3. Ser ganancioso é pecado. O primeiro e o quinto colocados ganham a mesma quantidade de dinheiro, então, jogar para ficar em primeiro é tolice. Sim, é legal ter uma infinidade de fichas, mas é igualmente arriscado e desnecessário. No longo prazo, isso não é lucrativo. Chega a ser irônico, mas é verdade: se você quiser ganhar uma grana no DoN, não seja ambicioso, não queira puxar todas as fichas disponíveis, não tente arrancar mais fichas do que necessita. Jogando assim você vai quebrar!
4. Seja rápido ao dar fold. Aproximadamente 60% das decisões que você toma em uma mesa de poker podem ser classificadas como “fold fácil”. Demorar para dar um fold fácil significa ter menos tempo para pensar nas decisões mais difíceis (isso se aplica somente se você joga várias mesas simultaneamente, ok?). Assim, quanto mais lento diante das situações de fold fácil você for, pior jogador se torna – sem tempo, a qualidade de tomada de decisões em situações complexas cai drasticamente. Conclusão: não perca tempo com inutilidades, como demorar para dar um fold fácil, isso é mais prejudicial do que você pode imaginar. Na mesma esteira e pelos mesmos motivos, não se distraia, não brinque no Orkut, não assista à televisão enquanto joga – deixe toda sua inteligência e capacidade de raciocínio à disposição, pois quando você menos esperar, uma situação complexa exigirá uma tomada de decisão mais difícil, e se você for pego distraído ou sem tempo nessa hora, vai perder dinheiro.
5. Energético “te dá ases”... e dor de cabeça. Atenção grinders de plantão: sim, os drinks energéticos fazem você jogar melhor e ganhar mais dinheiro! Você fica mais atento, sua agilidade mental aumenta e você ganha mais resistência para efetuar um grind mais extenso. Mas cuidado: fazer desse consumo um hábito é prejudicial. Primeiramente, porque os seus efeitos vão se tornando mais brandos a cada vez que consumimos. Depois, porque o esforço mental constantemente turbinado por energéticos durante dias seguidos pode causar dores de cabeça e de barriga. Consuma com moderação.
6. Às vezes você não precisa ganhar, mas apenas deixar seus adversários perderem. Isso pode ser fácil ou difícil – depende da sua personalidade. Muitas vezes, você se encontrará em mesas tão insanas, em que a briga é tão feia e caótica, que o melhor a fazer é cruzar os braços e esperar que seus oponentes acabem se matando, para que, sem tanto risco ou esforço, você discretamente entre no dinheiro. Parece fácil, mas perceber isso antes que ser vitimado por um xerife maluco que lhe paga com qualquer rei não é uma tarefa óbvia, requer faro e muito controle emocional, principalmente quando se está jogando 15 mesas ao mesmo tempo.
7. Pot odds é coisa do passado . Quando um torneio de poker acaba, você pode surrupiar algumas fichas e colocá-las no bolso para depois trocar por dinheiro da premiação? Óbvio que não. Portanto, o que significa uma jogada que tem EV de 10 fichas quando pensamos em nossas vidas? Você se tornará um cara mais rico em termos de grana de verdade, capaz de comprar um carro ou pagar a conta de luz? Não! Ou melhor, não necessariamente. Expected Value (EV), pot odds e toda uma pilha de bugigangas matemáticas fascinantes foram criadas para solucionar cash games, não torneios. Existem outras forças que regem os torneios, outros elementos, e a aglutinação de uma infinidade de fatores faz o mundo dos multitables ser muito mais caótico e instável do que o dos jogos a dinheiro. Uma jogada com EV positivo em cash game deve, necessariamente (salvo exceções estranhíssimas), ser executada. Nos torneios, o EV, de ordem imperativa, se rebaixa a um mero indicador de qualidade: ele passa a ser apenas mais um dos diversos componentes da forma ideal de se jogar. Nos DoNs isso também é verdade. Portanto, não atropele todos os conceitos em nome da matemática dos cash games, seja sensato e procure a melhor jogada através de mais de um único indicador. Mas, e os amantes dos cálculos, vão ficar chorando? Não, estude com mais afinco e vá além dos véus de simplicidade dos cash games – adentre o conceito de ICM (independent chip model) e comece a entender a verdadeira matemática que rege os torneios de no-limit hold´em.
8. Seja como um cachorro que ladra mas não morde. Como já foi dito, em torneios dobro-ou-nada você deve temer a confrontação. Entretanto, é preciso procurar explorar esse medo de confrontar que também afeta muitos dos seus adversários. Mas como seguir dois caminhos tão contraditórios simultaneamente? Como superar este paradoxo? A resposta é simples: pressione, mas não se comprometa; faça apostas pequenas, que pareçam perigosas, mas pule fora e aborte a missão diante do menor sinal de resistência. Jogando desse modo, você acumulará muitas fichas nessas mesas cheias de jogadores medrosos, enquanto dará a si próprio a oportunidade de identificar, sem muito risco, se há xerifes demais à mesa, impedindo que seja saudável a honesta profissão de ladrão de blinds.
9. Quando sua mão for decente, respeite menos os jogadores que têm muitas fichas. Jogadores com muitas fichas podem – e devem – jogar de forma mais solta do que o usual. Tenha isso em mente quando estiver decidindo sobre qual movimento é mais apropriado. Uma aposta de um jogador ligeiramente abaixo da média em fichas deve representar muito mais força do que uma aposta vinda de alguém com muitas fichas. Os jogadores com poucas fichas vão variar entre os dois extremos: jogarão apenas com muito valor, ou com quaisquer duas cartas. Uma boa dica para identificar de qual tipo ele é: observe seu nível de atividade durante a primeira órbita ocorrida depois que ele tomou a fatiada. Se ele atacou mais de uma vez na órbita em questão, rotule-o como sendo do tipo que aposta sem valor algum, caso contrário, respeite-o.
10. Na bolha, empurre seu all-in, mas guarde uma única ficha. Você deve estar se perguntando qual é sentido de se apostar todas as fichas exceto uma, não é? Aí vai a resposta: para poder dar fold caso coisas bizarras aconteçam, e também para aumentar a probabilidade de enfrentar um único oponente.
A ideia de aumentar a probabilidade de enfrentar um único oponente é a seguinte: você tem uma ficha para trás e ela não irá para o pote a menos que alguém aposte. Essa aposta necessariamente precisa ser no mínimo do tamanho de um mini-raise, ou de um big blind, e ambos os valores possuem mais capacidade de gerar fold equity contra os demais adversários do que a sua bet de uma ficha. Assim, os oponentes que estiverem afoitos para lhe eliminar, na verdade lhe ajudarão, ao efetuar uma aposta que restringirá o campo de adversários e impedirá que aconteça o check-down (quando todo mundo fica dando check) até o river.
Quanto a criar a possibilidade de dar fold diante de desfechos bizarros, permita-me explicar melhor. Imaginemos que, com os blinds de 200/400, você esteja no button e empurre all-in de 2.000 fichas com A♣ K♣ na bolha de um DoN. E, para sua infelicidade, acaba sendo pago tanto pelo small quanto pelo big blind, que apresentam, respectivamente, A♥ A♠ e K♦ K♠. Ambos possuíam 2.300 fichas e, ao final de tudo, nenhum milagre acontece e você amarga a sexta colocação. Agora imaginemos que, ao invés de empurrar all-in, tivesse apostado 1.999 fichas pré-flop. O que aconteceria? O jogador no small blind com A♥ A♠ provavelmente aumentaria (dar raise com AA quando o adversário tem apenas uma ficha para trás é algo irresistivelmente instintivo), então o big blind com K♦ K♣, se estivesse ligeiramente distraído (e muitos estão), daria insta-call, e você responderia a isso com um sorrateiro e ardiloso fold. Os ases superariam os reis, e você entraria na premiação como quinto colocado com apenas uma única ficha em seu stack. Bacana, não?
Andres "G3 Rock Lee" Carvalho se profissionalizou há dois anos. Ele é um dos jogadores mais lucrativos do mundo em Double-or-Nothing.