EDIÇÃO 32 » COMENTÁRIOS E PERSONALIDADES

Psicologia dos Nosebleed-Stakes


Alan Schoonmaker

Jogadores de poker ao redor do mundo estão fascinados com as batalhas ultra-high-stakes no FullTiltPoker.com. Alguns jovens gênios já jogaram heads-ups de no-limit hold’em e pot-limit Omaha com blinds de até $1.000-$2.000. Potes já excederam $1 milhão, e já houve vários ganhos e perdas multimilionários.

Você pode conferir isso nos artigos publicados na CardPlayer Brasil desde o ano passado. Eu responderei apenas quatro perguntas:

• Quão talentosos eles são?
• Quais são as motivações deles?
• Quão realisticamente eles percebem a própria situação?
• O que você deve aprender com eles?

Quão Talentosos Eles São?
Eles são excepcionalmente talentosos. Jogadores da idade deles nunca foram tão respeitados. Apesar de ter apenas 23 anos, Tom Dwan foi indicado para o Hall da Fama do Poker, uma honra que geralmente só é cogitada após décadas de realizações notáveis. Phil Ivey acabou de completar 34 anos, e muitos grandes jogadores já o consideram um dos melhores do mundo, se não o melhor. Acredito que os outros tenham menos de 30 anos – e já que eles conseguem se manter firmes, devem ser muito bons.

Eu fico abismado com a velocidade do raciocínio deles. Doyle Brunson, Stu Ungar e outros imortais podiam demorar muito mais para tomar suas decisões. Como os jogadores de nosebleed-stakes estão em várias mesas online simultâneas, eles têm apenas alguns segundos para tomar decisões complexas envolvendo fortunas.

A maioria dos “multitablers” joga com base em fórmulas, mas você não pode fazer isso contra grandes jogadores. Eles logo vão “decifrar o código” e desenvolver estratégias eficientes de contra-ataque. Arthur Reber, autor de The Dictionary of Psychology (O Dicionário da Psicologia), disse que a velocidade deles advém de dois fatores: sua juventude e os milhares de horas jogando vídeo games e várias mesas online.
Pessoas jovens pensam muito mais depressa do que as mais velhas, e esses jogos aceleram suas reações. Como eles jogam em múltiplas mesas online simultaneamente, todos já disputaram bem mais mãos do que qualquer um que não jogue online. Depois de participar de milhões de mãos, eles já se depararam repetidamente com a maioria das situações e não precisam pensar muito para analisar as coisas e decidir como agir.

Quais São As Motivações Deles?
Alguns deles (ou talvez todos) podem discordar da minha opinião: As motivações deles são pelo menos em parte irracionais.

Em todas as atividades econômicas, inclusive no poker, “racional” significa pensado logicamente para maximizar lucros, e todos eles cedem a pelo menos três desejos parcialmente irracionais:
• Provar quão bons eles são
• Tornar-se famosos
• Sentir a adrenalina no sangue

Provar Quão Bons Eles São: Esse desejo já destruiu o bankroll de inúmeros jogadores, e reduz os lucros imediatos de qualquer um que ceda a ele.

Como todos eles são bons demais, ninguém tem uma vantagem muito grande. Se eles realmente quisessem maximizar seus lucros, deveriam seguir o conselho de Barry Greenstein: “Você deve jogar com caras ricos e ruins, pois essa é a melhor maneira de ganhar mais dinheiro. Eu percebi que muitos jovens jogadores querem provar o quão bons são e, por causa disso, não selecionam bons jogos... Para mim, no poker não é importante provar que eu posso derrotar todo mundo. O importante é pagar as contas”

Pessoas jovens frequentemente ignoram esse tipo de conselho, em parte porque acham que podem fazer tudo. Por exemplo, Dwan ofereceu odds de 3-1 para qualquer um, e “Isildur1” jogou contra Dwan, Patrik Antonius e Ivey simultaneamente.

Dwan pode ser um pouco melhor do qualquer um, mas ninguém é favorito em 3-1 contra os melhores do mundo. Isildur1 pode ter uma vantagem contra Dwan ou Antonius ou Ivey, mas ninguém tem uma vantagem contra os três ao mesmo tempo. Ele teve sorte daquela vez, mas a CardPlayer Brasil reportou que “ele perdeu entre $2 milhões e $3 milhões ao todo em 2009”. Ele agora parece estar jogando em mesas bem mais baratas, supostamente porque perdeu a maior parte de seu bankroll.

Isso não me surpreende. Minha primeira coluna na Card Player foi “Arrogance, the Biggest Bankroll Buster” (“Arrogância, a Maior Destruidora de Bankrolls), em 13 de setembro de 2002. A arrogância faz com que os jogadores corram riscos estúpidos que lhes custa o bankroll.

Tornar-se Famosos: Muitos profissionais de cash games escondem suas habilidades para maximizar seus lucros. Se as pessoas soubessem como eles são bons, dariam menos ação a eles. Como a televisão tornou os grandes jogadores famosos, alguns jogadores de cash games passaram a querer se tornar celebridades, e o Full Tilt os ajudou a alcançar isso.

Eles naturalmente adoram ler sobre si mesmos, ser reconhecidos por estranhos e ser entrevistados. Celebridades também conseguem patrocínios e contratos, o que faz com que esse desejo se torne um pouco menos irracional. Além disso, como celebridades, eles ocasionalmente podem conseguir mais ação (em jogos live). Algumas pessoas ricas vão querer jogar com eles apenas para poder contar aos amigos: “Você precisava ter visto o grande blefe que eu fiz contra Doyle”. Eles em regra esquecem que perdem muito.

Sentir a Adrenalina no Sangue: Eles são um tanto “viciados em ação”. Esse termo geralmente é usado para designar os perdedores que apostam de forma insana, mas também se aplica a eles. Antonius já chegou a afirmar que fica entediado quando joga com blinds de “apenas” $200-$400. A necessidade deles de sentir adrenalina faz com que joguem sem uma vantagem e além do que seus bankrolls suportam.
Muitos jogadores high-stakes têm uma necessidade similar, mas os mais velhos se controlam melhor. The Professor, The Banker, and The Suicide King citou Doyle Brunson: “É preciso ser um pouco doente para jogar como nós. Estou convencido de que somos todos apostadores compulsivos. Nós apenas conseguimos ganhar”. Howard Lederer concorda: “A maioria de nós, talvez todos nós, tem um pouco de doença dentro de si. [...] Os caras que acabam nos maiores jogos são aqueles que têm um desejo maior de apostar, mas eles sabem usar isso para sua própria vantagem” (páginas 10-11).

Quão Realisticamente Eles Percebem a Própria Situação?
Em “Vencedores São Brutalmente Realistas” escrevi que muitos jogadores negam a realidade sobre si mesmos, seus oponentes e o sobre o jogo. Os jogadores de nosebleed-stakes superestimam suas próprias habilidades e subestimam seus oponentes.

A primeira World Series of Poker nos trouxe um divertido exemplo dessas tendências. O diretor to torneio pediu que os participantes votassem no melhor jogador. Todo mundo votou em si mesmo. Para desempatar, ele pediu para que votassem no segundo melhor jogador.

Eles também negam uma realidade essencial do poker: como a sorte tem grande efeito no curto prazo, a maioria deles (ou todos eles) não têm um bankroll grande o suficiente que lhes garanta que não vão quebrar.

Já que os jogos deles são tão diferentes de qualquer coisa que tenhamos visto antes, as regras para estimar os requisitos de bankroll não se aplicam automaticamente. Mas a lógica dessas regras certamente se aplica: você precisa de um bankroll maior, pois as diferenças de habilidade se tornam menores e os jogos, mais voláteis. Como todos são mais ou menos igualmente talentosos, e o heads-up em multitable é incrivelmente volátil, alguns deles jogam acima de seus bankrolls.

Na minha próxima coluna, irei discutir os vários aspectos de desafiar os melhores e colocar seu bankroll em jogo: você não pode atingir todo seu potencial sem enfrentar adversários superiores, e muitos dos melhores jogadores do mundo já quebraram várias vezes. Nela, também descreverei as lições que esses jogadores podem lhe ensinar.

Nota do autor: eu gostaria de agradecer Lou Krieger, David Sklansky, Arthur Reber, Barry Tanenbaum, Nick Christenson e Matt Lessinger pela ajuda.

O Dr. Schoonmaker é PhD em psicologia ocupacional e autor da Trilogia da Psicologia do Poker, disponível em português pela Raise Editora.




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