EDIÇÃO 13 » MISCELÂNEA

Oráculo


Roy Winston, e Michael Binger

Erica Schoenberg ganhou quase $600.000 em torneios nos dois últimos anos. A ex-membro do MIT Blackjack Team é um rosto conhecido sempre que joga em um evento. A mão a seguir ocorreu no Caesars Palace, num torneio preliminar de $1.000 do World Series of Poker Circuit em abril deste ano, e fornece um exemplo de um “call heróico” em ação.


O “CALL HERÓICO”
Pré-flop: O jogador que vinha sendo extremamente loose, parecendo jogar sem pensar a respeito da posição ou da situação, aposta 3.000 da posição under the gun. Erica apenas paga com A J, e todo mundo desiste.

Flop: O jogador under the gun pede mesa, Erica aposta 5.000, o under the gun ameaça desistir, mas muda de idéia e aumenta para 9.000, totalizando 14.000. Erica pensa durante um instante e volta all-in, recebendo um insta-call. Esperando ver uma trinca ou A-K na pior das hipóteses, ela o vê apresentar 2-2. O turn e o river não trazem ajuda alguma e, como às vezes acontece no mundo do poker, a burrice é recompensada.

Leitura de Erica Schoenberg
Em regra, eu respeitaria alguém que aumentasse do under the gun; contudo, esse cara jogou muitos potes e era bem fácil de ler, e eu tinha certeza de que ele estava bastante fraco. Parecia, para mim, que ele não tinha sido beneficiado pelo flop, pois, no passado, ele ficava animado e apostava quando tinha alguma coisa. Portanto, tomei a iniciativa e abri raise de pouco mais da metade do pote. Eu estava certa de que ele queria desistir e, quando ele mudou de idéia, considerei por um momento se aquela não seria uma tell inversa, mas eu tinha plena certeza de que se tratava de inexperiência. Eu achei que ele poderia ter um par baixo ou um ás com um kicker fraco que não melhorou, e achei que ele desistiria se pressionado; e se ele desse call, eu teria outs para conseguir o nuts. Portanto, quando ele pagou meu all-in, eu tinha certeza de que veria uma trinca, mas fiquei chocada ao ver 2-2. Ele disse: “É, eu achei que fosse isso que ela teria”. Eu acho que tinha muitos outs para ganhar a mão, mas fui vítima de um “call heróico”.

Análise de Roy Winston
Eu também disputei esse torneio do Caerars e fiquei chocado com o nível do jogo. Tendo acabado de jogar os eventos que antecedem o World Poker Tour Championship, achei que os participantes fossem ser similares, mas não foi o caso. Eu também fui vítima de “calls blefando” bastante insanos nesses torneios. Eu acho que, ao assistir a uma mesa final com três participantes na TV, alguns têm a impressão de que se joga daquela maneira ao longo de todo o evento, ou em uma full table: burros vêem, burros fazem — ou seriam macacos? Em condições normais, eu não teria gostado do call de Erica com A-J, diante de alguém que aumentou da posição under the gun, embora “seja do mesmo naipe”. No entanto, nesse jogo que chamamos de poker, leituras são tudo, e eu respeito Erica como uma jogadora sólida capaz de afugentar um oponente dessa forma. No flop, ela estava certa mais uma vez em sua análise da situação. Meu único questionamento é que talvez não fosse o melhor momento para comprometer suas fichas. Eu costumo dizer que em torneios o que importa é a sobrevivência e, sem fichas, não há torneio, então, antes de comprometer uma grande quantia de meu estoque em uma mão, eu me pergunto: “Esse é o momento ideal?” Freqüentemente isso me salva, embora haja vezes em que eu poderia ser mais agressivo e dou um fold ruim, mas meu mantra é: “um fold ruim é melhor que um call ruim”. No entanto, Erica não pagou – ela empurrou. E você sabe quem pagou e ganhou. É impressionante para mim que o “call heróico” tenha se tornado o padrão por meio do qual os jogadores se analisam. Erica tinha 15 outs duas vezes, que infelizmente não se materializaram, mas eu deixarei a matemática para Mike.

Análise de Michael Binger
Com os blinds em 400-800 e ante de 100, cada órbita custa 2.100 para se jogar. Dividindo esse número pela sua quantidade de fichas chega-se ao que se denomina seu “M”. Sendo assim, Erica tinha um M de 18, e o oponente tinha um M de 14, o que, relativo aos blinds, dava a ambos uma quantidade decente de jogo, especialmente para um torneio com buy-in menor. Portanto, Erica podia se dar ao luxo de confiar em sua leitura e pagar 8% de seu estoque pré-flop com A-J do mesmo naipe contra um jogador loose, fraco e de fácil leitura que aumentou under the gun (UTG). Contra muitos oponentes, você desistiria de A-J do mesmo naipe pré-flop, posto que, com muita freqüência, você estará dominado por alguém que aumenta under the gun e em geral não sabe onde está na mão se for beneficiado pelo flop. Contudo, ambas essas preocupações são dissolvidas em face de um oponente como o descrito por Erica. Quando o flop trouxe duas cartas de ouro e o jogador under the gun pediu mesa, Ela tinha de levar em consideração apostar. Com um pote de 8.100 e estoques efetivos de 27.000 (o jogador UTG tem 27.000 e Erica 35.000), a situação é complicada. Você não quer apostar e pagar caro caso se depare com um aumento. Por exemplo, se Erica apostar 5.000 e o jogador under the gun for de all-in com mais 22.000, ela terá de pagar 22.000 para ganhar 40.100, o que dá a ela menos de 2-para-1 sobre seu dinheiro e torna errado o call, a não ser que ela ache que tenha mais de nove outs. Na mão em análise, Erica apostou 5.000 e o jogador under the gun aumentou mais 9.000, ficando com apenas 13.000 restantes. Normalmente, esse seria um aumento muito assustador, representando uma seqüência, A-K ou A-A. Contudo, Erica foi capaz de fazer uma boa leitura de seu inexperiente oponente e deduziu corretamente que ele não estava forte, então voltou all-in. De modo impressionante, o jogador under the gun pagou o all-in com um par de dois e ganhou, embora Erica tivesse a melhor mão, com 54,4% de chances de ganhar. Agora, analisemos o tamanho da aposta de Erica. Nós vimos que apostar 5.000 a colocou numa posição difícil quando seu oponente fez um check-raise. Portanto, as outras opções seriam: (1) Pedir mesa também. Eu faria isso se achasse que havia uma probabilidade decente de o jogador under the gun estar tentando me colocar em uma armadilha. (2) Apostar um montante maior, o que em geral eu não gosto, pois encarece e faz com que você tenha que pagar um all-in quando normalmente está perdendo. Por exemplo, fazer uma aposta do tamanho do pote lhe daria 2,3-para-1 se o jogador under the gun apostasse, uma situação marginal que você deve evitar. (3) Apostar uma quantia estranhamente baixa, como 2.000 ou 3.000, obter uma leitura de seu oponente, e agir a partir daí.

Réplica de Erica Schoenberg
Em retrospectiva, eu gostaria de ter jogado a mão mais devagar. É sempre fácil dizer: “Eu deveria ter feito isso ou aquilo” depois do fato, mas às vezes a jogada certa ainda fornece o resultado errado. Às vezes cometo o erro de focar demais no resultado, quando deveria focar na jogada correta. Portanto, embora minha leitura tenha sido perfeita, eu acho que a jogada certa seria ir mais devagar. Com os estoques de ambos os jogadores em cerca de 40 big blinds, aliado ao fato de que eu tinha posição, creio que ter visto a carta de graça no flop seria uma jogada muito melhor. Quando um 10 apareceu no turn, dando a mim uma queda para a gaveta, além de meu flush e outs grandes, eu poderia ter sido compelida a aumentar no turn se ele aumentasse. Contudo, pedir mesa no flop manteria o pote menor e me daria mais opções nas streets posteriores.

Conclusões dos Profissionais
Winston diz: Erica jogou a mão agressivamente e talvez tenha arriscado sua vida no torneio quando não precisava. Dito isso, eu meio que gostei da jogada dela, mas ela precisa aprender a controlar o turn e/ou river melhor. Binger diz: Eu teria pedido mesa também ou apostado baixo, caso achasse que o jogador under the gun estava forte ou não. Nessa mão, não posso culpar Erica, pois ela colocou bem seu dinheiro no pote.




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