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Kaiser Holz - O Novo Imperador do Poker Mundial


Marcelo Souza

Apontar quem é o melhor jogador de poker sempre gera bastante polêmica. Em um esporte com tantas variáveis e tanta variância, melhor é um superlativo perigoso a ser usado. Mas desde o início do ano passado, é possível afirmar, sem medo de errar, que alguém ocupou o posto de melhor jogador do mundo, pelo menos nos dias atuais: o alemão Fedor Holz.

Fedor tem apenas 23 anos e nos últimos 20 meses ele ganhou US$ 19.676.642 em torneios ao vivo. Isso sem falar no seu mais recente feito, o vice-campeonato no Super High Roller (SHR) da principal série de poker online do mundo, o WCOOP 2016, em embolsou mais de US$ 1 milhão. 

Mas o mais impressionante foi que em um espaço de apenas dois meses, durante a World Series of Poker e o European Poker Tour Barcelona, ele chegou ao 3-handed de sete torneios SHR e venceu cinco, sendo que um deles lhe rendeu seu primeiro bracelete da WSOP.

Ao redor do mundo, todos se questionavam se Fedor havia feito alguma descoberta no poker que os outros deixaram passar batido. Onde estaria a variância, que deveria ser enorme em torneios desse tipo? Afinal, maioria dos fields dos SHRs é composto dos melhores jogadores de cash games e torneios do mundo.

Em entrevista exclusiva à Card Player Brasil, Fedor falou sobre sua vida, André Akkari e Global Poker League, a polêmica aposentadoria e, claro, poker.

Marcelo Souza: Como você começou a jogar poker?

Fedor Holz: Eu comecei a jogar quando eu tinha 17 anos. Comecei com um pequeno grupo de amigos, jogávamos cash games com blinds de um e dois centavos e eu apenas perdia (risos). Era apenas por diversão.

MS: E quando a coisa ficou séria?

FH: Bom, alguns amigos jogavam nos limites médios e me ensinaram algumas coisas. Aos 18, comecei a jogar online. Eu fazia Ciências da Computação e percebi que eu realmente amava jogava poker. Eu fui jogando cada vez mais e estudando cada vez menos (risos).

MS: Qual a origem do seu nickname, “CrownUpGuy”?

FH: Eu sempre tive amigos mais velhos. Sempre fui o mais novo da turma. Quando eu tinha 16, eles tinham 18, 19, 20 anos, então eles sempre brincavam dizendo: “Você precisa crescer, cara” [em inglês, “grow up, guy”]. E foi a primeira coisa que veio à minha cabeça na hora de criar o nick, mas resolvi brincar com as palavras e usar “CrownUp”, que seria equivalente a coroar-se (risos).

MS: Logo após você vencer o SHR da WSOP, você disse que se aposentaria, mas continua jogando. O que você realmente quis dizer com aposentadoria?

FH: Isso apenas significa que eu não jogo mais poker para viver, mas por diversão. Eu era um jogador profissional nos últimos quatro anos e agora jogo apenas quando sinto vontade. Não vou fazer tantas viagens e não vou gastar diversas horas online. Antes, eu jogava em torno de 2.500 horas por ano, agora eu jogo apenas umas 400. Não quer dizer que não vou jogar mais, mas vou jogar bem menos. Veja, um jogador amador, que corre circuitos. Ele não precisa disso para viver. Joga quando quer. É o que acontece comigo hoje.

MS: Quais eram os seus métodos de estudo para continuar evoluindo?

FH: Para mim, a melhor maneira de aprender é conversar com pessoas. Conversar com alguém é melhor do que usar programas. Pessoas são mais rápidas e espertas. Quando você conversa com alguém, você aprende muito mais. Eu sempre tentei conversar com o máximo de jogadores. Se você tem amigos que são bons no que você faz, vocês poderão aprender uns com os outros e a curva de aprendizado será muito maior.

MS: Seus resultados têm causado espanto na comunidade do poker. Afinal, você descobriu alguma coisa que o mundo não sabe? Quero dizer, você não está derrotando amadores, mas os melhores jogadores do mundo. A vantagem entre vocês não deveria ser mínima?

FH: Acredito que a grande diferença está na parte mental. Há três anos, eu comecei a trabalhar minha mente. Contratei um “Life Coaching” para trabalhar isso. Em novembro do ano passado, comecei a trabalhar com Elliot Roe [famoso “Coaching Mental” especialista em poker. Já trabalhou com nomes como Brian Rast, Gabriel Goffi e Jonathan “Apestyles”]. Ele é sensacional no que ele faz. Ele me motiva muito e trabalha muito a parte da concentração, inclusive usando técnicas de hipnose. Esse é o meu segredo e minha diferença para os outros. Existem muitos jogadores bons, mas que não conseguem jogar bem o tempo todo. Isso porque muitas vezes, suas mentes estão em outros lugares. Ficam preocupados com downswings, problemas em casa etc. Quando você trabalha com ele, tudo isso some e você apenas dirige seu foco para o poker.

MS: E quanto ao coaching do Holz. Há um preço?

FH: Acho que sempre há um preço, mas, no momento, não acho que seja um preço que as pessoas estejam dispostas a pagar. No entanto, se eu acho que uma pessoa é interessante, eu gosto de ajudar, conversar com ela, ajudar a descobrir o que é melhor a se fazer. A verdade é que não gosto de dar treinamento em troca de dinheiro. No momento, só quero ser feliz e aproveitar a vida.

MS: Como alguém que já fez “Life Coaching”, acredito que você conhece a famosa frase de Jim Rohn: “Você é a média das cinco pessoas com quem passa mais tempo”. Qual sua opinião sobre isso?

FH: É muito verdadeira. As pessoas que eu passo mais tempo são grandes amigos e eu admiro cada um deles. Todos eles são muito bons em alguma coisa. Alguns em matemática, ler pessoas etc. Cada pessoa que é próxima de mim, me ensina muito, e eles também aprendem comigo. Acho que muitos jogadores de poker não enxergam que eles podem ser bons em outras áreas e se aprimorarem como seres humanos, o que ajuda muito não só no poker, mas também na vida. 

MS: A Global Poker League (GPL) reuniu os melhores jogadores no mundo. Muitos brasileiros perguntaram ao capitão do São Paulo Mets, André Akkari, por que ele não escolheu você para o time. Mais tarde, ele disse que isso foi um pedido seu. Qual a razão?

FH: Eu não quero que os brasileiros pensem que foi porque não gosto do Brasil. Veja bem, eu gosto muito do Brasil e de todos os brasileiros que conheci até hoje. Acontece que a Maria Ho, capitã do LA Sunset, é uma grande amiga minha. Para essa primeira GPL, acho que era muito importante ter essa conexão com o seu time. A GPL não é sobre fazer dinheiro. Eu apenas achei que se entrasse em um time que eu conhecesse as pessoas bem, o desempenho seria o melhor possível. Eu nunca havia conversado com o André antes, mas pelos cinco minutos que conversei com ele, ele me pareceu um grande cara e levou tudo numa boa.

MS: E como funcionou para você a GPL. Você joga por milhões de dólares a todo momento e, de repente, está jogando um torneio que não paga nada. Dá para levar a sério?

FH: É a competição. Enfrentar os melhores. Estar na TV. Eu amo poker, mesmo sem dinheiro. Gosto das pessoas, da comunidade, da atmosfera. Se você se diverte, você joga bem e quer ganhar.

MS: Falando em competição, quando você venceu o One Drop da World Series of Poker, você estava usando a camisa do time de Counter-Strike EnVyUs. Qual sua relação com os esportes eletrônicos (e-sports)? Você também joga?

FH: Na verdade, não jogo muito (risos). Prefiro assistir a jogar. Sempre que jogo algo, uma hora é o limite. Eu dedicava tanto tempo ao poker que era difícil jogar outra coisa. Mas eu admiro muito os profissionais de e-sports. Eles têm paixão pelo que fazem. Mesmo que a pessoas não levem a sério, para mim, é incrível que as pessoas persigam seus sonhos — e esses caras fazem isso. Eles são o símbolo de que você pode ter sucesso fazendo aquilo que ama. Quanto ao EnVyUs, sou um grande amigo do capitão do time, Nathan "NBK-" Schmitt, um cara incrível. Ele me mandou a camisa e decidi usá-la na mesa final.

MS: Por que você bloqueou seu nickname em sites de estatísticas como o Pocket Fives, Shark Scope e OPR?

FH: Principalmente porque a situação do poker aqui na Europa, financeiramente falando, não é clara. Então, para nós, jogadores, é melhor não deixar essas informações soltas por aí.

MS: Dá para ser vencedor no poker sem estudar muito a matemática do jogo?

FH: Com certeza. Na verdade, não existe toda essa matemática para estudar. Há muita matemática envolvida, claro, mas o poker é também um jogo de lógica. Eu nunca fiz muitos cálculos. Obviamente, eu estudava muito, mas nada como pegar contas complicadas e tentar resolver o jogo. Na maioria das vezes, é apenas lógica.

MS: Você tem apenas 23 anos e já é um dos mais famosos jogadores de poker do mundo. Mesmo sem intenção, você é um embaixador do poker. Como carregar esse fardo tão jovem? Isso acelerou o seu amadurecimento?

FH: Realmente, há muita pressão. Muitas pessoas formam opiniões sobre você, algumas boas, outras nem tanto (risos). Há muita exposição e isso às vezes acontece de repente. Um dia, ninguém lhe conhece, no outro, você ganha um grande torneio e todos sabem quem você é. Em alguns momentos é difícil. Isso me deixa cansado de vez em quando. Sua privacidade acaba, as pessoas falam com você e sobre você o tempo todo. Mas eu realmente amo o poker. Se alguém falar mal do poker, minha voz aparecerá na multidão para defender o jogo. E eu sempre vou mostrar para as pessoas o meu ponto de vista sobre jogo. E acho que todos deveriam fazer o mesmo, serem embaixadores a suas maneiras. Mas mais do que falar, você precisa mostrar isso com ações. 

MS: Poucas pessoas têm tanta propriedade para falar de poker online e ao vivo como você. Então, quais as principais diferenças entre um e outro?

FH: Acho que a grande diferença é que você tem muito mais vantagem no poker ao vivo. Você joga apenas uma mesa, portanto, seu foco será bem maior. O online está ficando gradualmente mais difícil. Não há muito mais dinheiro entrando, até por causa da Black Friday, e os jogadores estão cada vez melhores. 

MS: Se lhe pedissem uma lista com os melhores jogadores de poker do mundo, quem estaria na sua?

FH: Em cash games online, eu colocaria “OtB_RedBaron” no topo e em torneios online o “bencb789”, que me venceu no heads-up do Super High Roller do WCOOP neste ano. Ao vivo, acho que Daniel Colman é definitivamente o melhor.

MS: Falando em Dan Colman, há dois anos, logo após vencer o The Big One for One Drop, ele disse que o poker é um jogo sombrio. O que você acha disso?

FH: Eu acho que ele disse aquilo no calor do momento, mas eu concordo essa frase dentro da minha interpretação. No poker, para você vencer, alguém tem que perder. Não existe a situação “win-win” (todos vencem). Na maioria das outras profissões, se você ganha, a outra pessoa também ganha. Eu pago por um pedreiro para construir minha casa e ganho um lar em retorno. Eu pago por um bom restaurante e sou alimentado. Você ganha, o dono do restaurante ganha, o pedreiro ganha e todos ficam felizes. Você não vai sentir totalmente realizado, porque é apenas receber, receber e receber. Você dá nada ou quase nada em retorno. Então eu entendo o que ele quer dizer.

MS: Há uma maneira de compensar esse lado do poker, de “dar um pouco de volta”?

FH: É bem difícil. Porque tem que ser algo natural. Não é fácil jogar poker e ter projetos paralelos. Por exemplo, apenas doar para a caridade não é algo que conta. Isso é meio que mecânico e uma maneira de aliviar sua consciência. Acho que tudo tem que ser natural. Ser uma boa pessoa, respeitar os outros, a sociedade, essa é uma maneira de retribuir o que o poker fez por mim.

MS: Como é o Fedor fora das mesas?

FH: Eu sou uma pessoa muito positiva, sempre querendo fazer algo. Gosto de jogar futebol, acabei de comprar um apartamento em Viena, na Áustria. Vou comprar um cachorro e também viajar para conhecer o mundo. Quero fazer as coisas que sempre quis. O poker me exauriu muito. Às vezes, eu jogava sem querer. Agora é hora de focar em coisas que eu desejo mais do que jogar.

MS: Como é ganhar tanto dinheiro? Como as pessoas lhe tratam?

FH: É complicado, principalmente com os amigos. Já fui enganado e toda semana alguém me pede dinheiro emprestado. O dinheiro lhe coloca em muitas situações estranhas. Você nunca sabe se alguém está se aproximando por sua causa ou por ter ganhado milhões. Mas ainda bem que tenho verdadeiros amigos para me ajudarem a lidar com tudo isso.

MS: Você poderia deixar uma mensagem para os brasileiros?

FH: Eu estive no Brasil há dois anos. Os brasileiros foram sensacionais comigo. Eles têm uma forma muito positiva de levar a vida. Mas a mensagem que quero realmente deixar para todos é: “Vamooooss, Brasil” (risos).




5 DICAS DE FEDOR HOLZ PARA SE DAR BEM EM TORNEIOS

1. PREPARAÇÃO

Você deve planejar o que for jogar. Se alimentar bem, dormir bem. Muitos jogadores, apenas sentam em frente ao computador e começam os registros. Organizar-se é fundamental.

2. EVOLUÇÃO

Assista vídeos, converse com amigos e pense por você mesmo. Pense sempre cada jogada e, caso tenha dúvidas, revise-as à exaustão.

3. CONHECIMENTO

Se você conhece seus adversários, então saberá reagir. Principalmente online, quando você joga contra os mesmos caras, tome notas e use ferramentas auxiliares, como o Hold´em Manager ou Poker Tracker.

4. INDEPENDENT CHIP MODEL (ICM)

Se você quiser ser vencedor, você precisa realmente entender o conceito de ICM. Muitos jogadores sabem o que significa, mas não sabem realmente como utilizá-lo.

5. SEJA COMO ÁGUA

Você precisa aprender a se adaptar às retas finais. Principalmente na mesa final, você tem que saber como jogar short-handed e também heads-up. É impressionante como tantos bons jogadores fazem um torneio perfeito e depois ficam completamente perdidos quando chegam no heads-up.




OS 7 PRÊMIOS MILIONÁRIOS DE FEDOR HOLZ NO POKER

DATA -BUY-IN (USD) - TORNEIO - POSIÇÃO - PRÊMIO (USD)

Julho/2016 - $111.111 - High Roller for One Drop da WSOP - 1º - $4.981.775

Maio/2016 - $300.000 - Super High Roller Bowl - 2º - $3.500.000

Janeiro/2016 - $200.000 - Super High Roller do WPT Filipinas - 1º - $3.463.500

Dezembro/2015 - $100.000 - WPT Alpha 8 - 1º - $1.589.219

Agosto/2016 - $55.800 - Super High Roller do EPT Espanha - 1º - $1.473.127

Setembro/2014 - $5.200 - Main Event do WCOOP do PokerStars - 1º - $1.300.000

Setembro/2016 - $102.000 - Super High Roller do WCOOP do PokerStars - 2º - $1.067.639





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