EDIÇÃO 78 » COLUNA NACIONAL

Estratégias básicas por faixa de stack - Parte I

Jogando Short-stack


Fábio Eiji
Este é o 10º artigo que escrevo para a CardPlayer Brasil e me sinto muito orgulhoso por isso. Confesso que quando recebi o convite do Marcelo Souza, editor da revista, eu não tinha um plano definido para a sequência de temas e encarava como um exercício de sistematização e descrição dos conhecimentos teóricos e práticos que adquiri nesses anos como jogador profissional de poker. Ao mesmo tempo, está sendo um desafio para mim, quero dizer, trazer isso de uma maneira acessível a todos os níveis, me aprofundando apenas o necessário para ajudar os jogadores iniciantes — e alguns intermediários — a entenderem melhor os conceitos e funcionamento do jogo e, consequentemente, melhorarem seu nível. Hoje posso dizer que a experiência foi bem-sucedida, tanto em termos de produção dos textos como em respaldo dos leitores. Isso me anima a continuar.
Para comemorar os dez artigos, estou lançando uma série de três textos explicando, de maneira resumida, as estratégias e fundamentos básicos para cada faixa de stack, começando pelos stacks curtos. Afinal, os torneios são, acima de tudo, jogos de stacks.
 
Estratégias short-stack
Consideramos um stack curto aquele até 20 big blinds. É a faixa de stack na qual temos menos espaço para o jogo pós-flop, levando a grande maioria dos potes a ser decidido ainda pré-flop, aproveitando a fold equity que ainda nos resta. É muito comum nos encontrarmos nessas situações em retas finais de torneios, em que os erros custam muito mais caro. 
 
O manual clássico do jogo short-stack sugere o seguinte:

Stacks até 10 bbs: situação crítica. Não há espaço para nada além do push (all-in) ou fold.
Stacks entre 12 e 15 bbs: sinal de alerta ligado. Não devemos desperdiçar fichas abrindo raises com mãos fracas. Praticamente não há raise-fold pré-flop.
Stacks entre 16 e 20 bbs: modo resteal. Faixa de stack perfeita para explorar quem está “roubando” demais, pois ainda temos fold equity, ou seja, o vilão não está comprometido com o pote quando dá raise e enfrenta um all-in do Herói [sobre resteals, consultar o artigo "Ladrão Que Rouba Ladrão", edição 71].

Raise-fold com stacks curtos

Com o desenvolvimento constante do jogo, essas regras, antes encaradas como dogmas, foram, aos poucos, superadas. Isso significa que conceitos-chave, como pot odds, fold equity e análise de ranges, foram esquecidos? Não, muito pelo contrário, eles estão sendo explorados em seu limite. 
 
Hoje, se aceita que, em determinadas situações, com um range formado principalmente por blockers (mãos que contenham cartas que “bloqueiam” a frequência de grandes mãos a agir — por exemplo, se temos um Ás, reduzimos em 50% a chance de um A-A pela frente), seja possível abrir mini-raise e fold contra uma 3-bet ou shove (all-in). Por exemplo, em uma mesa tight ou nas quais há pressão pelos saltos de premiações. A grande vantagem é que essa jogada é difícil de ser explorada, pois não há espaço suficiente para uma 3-bet light que não se comprometa com o shove do Herói. 
 
3-bet light com 18 a 20 bbs
 
Outra ferramenta adotada pelos regulares em geral é a 3-bet light com 18 a 20bbs. É uma boa estratégia para manutenção do stack contra jogadores muito agressivos. Matematicamente, o Herói não fica comprometido com o pote. Vejamos um exemplo:
 
Herói no BTN com 20 bbs.
Vilão em MP com 40bbs.
 
Vilão loose-agressive (LAG) abre mini-raise, Herói com A5 no BTN faz uma 3-bet de 4,2 bbs. Caso o vilão vá all-in, o Herói teria que pagar 15,8 bbs pra um pote final de 42,5 (contando blinds e antes). Isso significa que o Herói precisa ter pelo menos 37% de equidade para o call ser break even (não trazer lucro nem prejuízo no longo prazo). Supondo que o Vilão vá all-in com o seguinte range: 88+, ATs+, AQo+, KQs e KQo (8%); o A5 tem apenas 36,6% de equidade, ou seja, não tem o necessário nem para o zero a zero, quanto mais para um call com expectativa de valor positivo.
 
Como o Herói investe 4,2 bbs com a intenção de ganhar um pote de 8,25, se ação terminar pré-flop, a 3-bet tem que passar apenas 50% das vezes para ser, por si só, vencedora no longo prazo. Um vilão LAG tende a abrir raise com uma frequência em torno de 30% das mãos. Se ele reagir apenas com aquele range, de 8%, significa que muito mais da metade das vezes que ele fizer o raise vai acabar dando fold para a 3-bet do Hero.
 
Principais erros dos jogadores inciantes
Em primeiro lugar, é preciso deixar claro que, apesar dessas novas ferramentas serem necessárias no arsenal de todo bom jogador, os stacks curtos ainda devem ser jogados de uma maneira tight. É necessária precisão cirúrgica nas ações, pois um raise representa uma parte valiosa do stack. Se temos 12 bbs e fazemos mini-raise, colocamos 16,6% do nosso stack em jogo. Quantas vezes faremos raise-fold até estarmos em uma situação totalmente crítica?
 
Mas o pior erro que um jogador pode cometer é jogar de maneira passiva. É preciso evitar ao máximo o flat call (apenas pagar um raise), principalmente com mãos marginais, como pares pequenos e suited connectors, pois, dessa forma, ficamos muito dependentes da textura do flop e não temos espaço para desenvolver a mão até o river. 
 
Assim encerramos o assunto short-stack. Na próxima edição, tratarei sobre o jogo com stacks médios, aqueles entre 25 e 40 bbs, que é a faixa de stack em que jogadores de torneios estão mais habituados a jogar — porém é onde cometem mais erros. 
 



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