EDIÇÃO 72 » ESPECIAIS

Daniel Negreanu E O Fim De Um Tabu


Julio Rodriguez

Tradução e adaptação: Marcelo Souza
Em pouco mais de quatro anos, ele esteve 43 vezes entre os premiados, alcançou 20 mesas finais e embolsou mais de US$ 5 milhões em prêmios. Números obtidos entre dezembro de 2008 e março de 2013. Números que deixariam qualquer profissional do poker extasiado – principalmente em uma época que manter-se no topo por tanto tempo, enquanto o jogo evolui em velocidade meteórica, tornou-se tão difícil –, mas não o principal representante da marca PokerStars (se não da "marca" poker): Daniel Negreanu.

Mesmo com números tão sólidos, nesse período de pouco mais de quatro anos, ele não conquistou nenhum título importante. Foram várias traves, e o canadense admitiu que foi difícil não deixar que a dúvida apossasse de sua mente.

No entanto, no último mês de abril, o homem conhecido como "Kid Poker" finalmente quebrou o jejum. No Main Event da World Series of Poker Asia Pacific 2013, ele superou 404 adversários, conquistou o seu quinto bracelete da WSOP e o primeiro prêmio de US$ 1.087.160.
Agora, já com 38 anos, e pronto para reivindicar o título de melhor jogador de torneios do mundo, que já foi seu em 2004, ele concedeu uma entrevista exclusiva à Card Player.

Você já tem quase 40 anos. Quando vamos parar de chamá-lo de "Kid Poker"?
Veja bem, quantos anos tem o "Kid Rock"? 50? Isso não é sobre a minha idade, mas sobre a minha aura. Eu sou um cavalheiro de espírito jovem, e isso sempre será assim [nota do editor: Robert James Ritchie, o Kid Rock, tem 42 anos].

Depois de muito tempo, você voltou a vencer um grande torneio. É correto dizer que o sentimento é mais de alívio do que de felicidade?
Eu definitivamente usaria a palavra alívio. Eu bati tantas vezes na trave, a principal delas foi a derrota para o Barry Shulman na WSOPE 2009. No geral, estive muito bem, ganhei mais de um milhão de dólares nos últimos dois anos, mas a vitória não vinha, era um fardo. Com o título na Ásia, estou confiante novamente. Agora sinto que não há tarefa impossível e que isso acontecerá de novo.

Falando de 2009, quando você esteve perto de ganhar dois braceletes, quais os efeito que aqueles dois resultados tiveram sobre você e sobre a motivação para jogar torneios?
Minha motivação para jogar torneios nunca foi afetada. Sou apaixonado por isso. O que houve foi apenas uma frustração. No final dos anos 90, quando comecei a jogar torneios, as 12 vezes em que cheguei entre os cinco finalistas, eu fui o campeão. Sempre que eu chegava longe em um torneio, eu vencia. Não havia segundos ou terceiros lugares. Foram 12 de 12. Quando isso acontece, você se sente confortável. No entanto, quando não acontece, a incerteza toma conta, e você começa a se preocupar. Foi bom colocar essa incerteza "para descansar".

O que tem sido mais difícil para você nos últimos anos, selar a vitória ou chegar às retas finais dos torneios?
Provavelmente selar a vitória. O que nós vemos nos últimos anos são adversários muito mais fortes. Quando eu era jovem e estava apenas começando, os oponentes não eram tão bons em jogar a fase shorthanded [com seis ou menos jogadores] do torneio. Hoje, quando restam cinco jogadores, acabou aquela coisa de "tirar doce de criança". Já não é possível pressionar esses caras até que eles "me deem o torneio".

Em 2004, você foi o Jogador do Ano da WSOP e da Card Player. Você venceu quatro torneios, fez 11 mesas finais e ganhou cerca US$ 4,5 milhões. Seu números mostram que você era o melhor jogador da época. Você acredita que o Negreanu de 2013 poderia derrotar o de 2004?
Eu olho para o Negreanu daquela época e penso que poderia destruí-lo. O que acontece é que, naquele tempo, a diferença de habilidades entre o resto do mundo e eu era bem grande. Hoje, não mais. Há centenas de bons jogadores por todas as partes. Então, mesmo sendo muito melhor atualmente, minha vantagem já não é tão grande.

E sobre o seu estilo small ball de hoje? Ela funcionaria em 2004?
Sim, funcionaria. Esse meu estilo de jogo não é algo que surgiu recentemente. Tenho feito isso por anos. Eu era uma das poucas pessoas a utilizar o small ball, consequentemente, o poker ficou fácil. Não só por que os jogadores não usavam o small ball, mas também por que eles não sabiam se defender contra esse tipo de estratégia.

Em 2009, quando você se tornou o jogador que mais ganhou dinheiro na história dos torneios de poker, você revelou o quanto isso era importante. Hoje, você é o sexto colocado da lista. Devido ao grande número de high rollers e super high rollers que acontecem atualmente, isso ainda é importante para você?
Bem, se você olhar algumas outras listas, você verá que ainda sou o número um. Há rankings por aí, como o Hendonmob.com, que mostra os ganhos em torneios com buy-ins menores do que $50.000. Essa lista não é mais tão importante para mim. Não que haja algo errado com ela, mas, se buscamos por credibilidade, ela fica meio distorcida devido ao número de high rollers jogados a cada ano. Antonio [Esfandiari] venceu o Big One For One Drop, torneio com buy-in de um milhão. Claro, aquilo foi incrível, mas torneios como esse fazem com que a lista seja mais sobre um bom momento do que sobre as realizações de uma carreira. O que impediria dez bilionários de organizarem um sit-and-go com buy-in de $5 milhões, com o vencedor levando tudo? Tecnicamente, quem quer fosse o campeão se tornaria o jogador que mais ganhou dinheiro da história em torneios de poker.

Se perguntarmos aos fãs do poker para identificarem qual a principal habilidade de Daniel Negreanu nas mesas, eles certamente diriam "a habilidade em ler mãos". Isso é verdade, ou você tem uma outra habilidade mais importante?
Concordo que a leitura de mãos, principalmente pós-flop, é a grande força do meu jogo. Também acredito que a maior fraqueza que as pessoas tendem a apontar em mim é o meu jogo pré-flop. Antes do flop, faço várias coisas que me colocam em algumas situações esquisitas, coisas que deixariam a maior parte dos jogadores com dificuldade, mas eu me sinto bem com isso. Posso jogar com algo como 65 em um flop Q-9-5, por exemplo. Eu sei o que estou fazendo lá. Sei como representar certas mãos de acordo com a próxima carta do bordo e sei como conseguir o máximo de fichas quando acerto a minha mão. Isso pode deixar outros jogadores desconfortáveis, mas eu tenho bastante confiança na minha leitura para jogar dessa maneira.

Junto com outros dez, você é o 12º no ranking de braceletes da WSOP, tendo cinco ao todo. É importante para você terminar a sua carreira no topo dessa lista ou você já entregou os pontos a Phil Helmuth, que te tem 13 braceletes?
Eu não estou satisfeito com o meu número de braceletes. Sinto que eu deveria ter seis ou sete a essa altura. No final da minha carreira, espero ter uns 20 braceletes. Mas se houvesse alguém que eu apontaria para ocupar o topo seria Phil Ivey [09 braceletes]. Hellmuth tem sido fantástico nos últimos anos, mas acredite, o cara que perseguirei na próxima década será Phil Ivey. Ele está a anos-luz do resto do field que disputa os pequenos eventos de mixed-games. Não me espantaria se ele conseguisse, pelo menos, um bracelete por ano.

Em algum momento você se cansou de todas as tarefas que cercam um embaixador do poker? Nunca lhe ocorreu de voltar à rotina de grinder, ir ao cassino, ganhar o dinheiro e ir embora para casa?
Definitivamente, em alguns momentos da minha vida, tudo que eu queria era jogar poker. É a velha mentalidade de grindar para viver: jogar à noite no Bellagio, nunca ter que viajar e viver um vida normal. Mas acredito que venho me saindo bem. Consigo equilibrar as atribulações de um embaixador, os estudos para melhorar o meu jogo e ainda ter uma vida social. Especialmente depois da Black Friday, meu dever como embaixador se tornou ainda mais importante. A indústria sofreu um duro golpe em sua imagem. Penso que sempre fiz um bom trabalho guiando o poker pelo caminho certo – e é importante que eu continue assim.

No final da sua carreira, você vai querer ser lembrado pelas suas habilidades nos feltros ou pelos seus esforços para a popularização do jogo?
Eu jamais vou querer ser o cara que é bom para o jogo, mas que não sabe jogar. Depois que eu parar, espero que as pessoas se lembrem de mim tanto pelo meu papel fora das mesas quanto pelos meus resultados. Mas se houvesse espaço para apenas um inscrição na minha lápide, eu preferiria ser lembrado como um cara legal que ajudou o poker a se tornar um coisa muito grande.

AS TRAVES DE DANIEL NEGREANU ENTRE 2009 E 2012
Ano Torneio Buy-in Colocação Prêmio
2012 High Roller do EPT Monte Carlo €25.000 2º $791.649
2012 Super High Roller do EPT Monte Carlo €100.000 6º $409.727
2012 Super High Roller PCA $100.000 5º $250.900
2011 High Roller do WPT Five-Star World Poker Classic $100.000 3º $448.320
2011 Super High Roller PCA $100.000 2º $1.000.000
2010 EPT Viena €5.000 4º $244.178
2009 Main Event da WSOPE €10.000 2º $783.061
2009 Omaha Championship Hi/Lo da WSOP $10.000 4º $130.401
2009 Evento #14 da WSOP [Limit Hold'em, Six Handed] $2.500 2º $138.280




NESTA EDIÇÃO



A CardPlayer Brasil™ é um produto da Raise Editora. © 2007-2024. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução total ou parcial do conteúdo deste site sem prévia autorização.

Lançada em Julho de 2007, a Card Player Brasil reúne o melhor conteúdo das edições Americana e Européia. Matérias exclusivas sobre o poker no Brasil e na América Latina, time de colunistas nacionais composto pelos jogadores mais renomados do Brasil. A revista é voltada para pessoas conectadas às mais modernas tendências mundiais de comportamento e consumo.


contato@cardplayer.com.br
31 3225-2123
LEIA TAMBÉM!×