Na Edição 54 da Card Player Brasil, listei 14 fatores que podem levar jogadores, acostumados com os jogos onlines, ao tilt em torneios ao vivo. Como eu disse antes, tiltar nada mais é do que “cometer erros, que normalmente não são cometidos, por razões emocionais”.
Dito isso, vamos para os próximos sete itens de nossa lista.
FATORES QUE PODEM TE LEVAR AO TILT NOS JOGOS AO VIVO:
1. Jogos muito mais lentos
2. Erros de jogadores que não acontecem online
3. Erros de dealer que não acontecem online
4. Custos muito mais altos
5. Impossibilidade de jogar sua modalidade preferida
6. Barulho e demais distrações
7. Socialização excessiva
8. Pressão para controlar sua linguagem corporal
9. Pressão para ler a linguagem corporal do oponente
10. Pressão para conseguir informação que lhe era dada online
11. Limites muito mais altos
12. Efeitos mais visíveis da variância
13. Jogos muito mais loose
14. Bad Beats muito piores
BARULHO E DEMAIS DISTRAÇÕES
Em casa, jogando online, você está no seu próprio espaço. Um bom ambiente. Uma cadeira confortável. Um lugar silencioso. Poucas interrupções.
Nos clubes, as cadeiras podem ser menos confortáveis. Nos cassinos, existem aquelas infernais máquinas de caça-níquel, garçonetes servindo coquetéis, pessoas e jogadores conversando o tempo todo etc.
Você pode se perguntar, “Por que ele está discutindo sobre cadeiras? Quem liga para elas?”. A resposta é: “Você”. Você provou isso ao comprar aquela cadeira confortável para jogar. E todos os momentos de stress, até mesmo algo pequeno como uma cadeira desconfortável, pode aumentar a tensão e a probabilidade de tilt.
Barulho, conversas, garçonetes e televisões são ainda piores. Distrações que reduzem a sua concentração e te levam a cometer erros. Errar por estar distraído pode ser extremamente irritante – e tenho certeza que você sabe bem o que é isso. Isso pode até a te levar a pensar: “Eu nunca cometeria esse erro idiota jogando na minha casa!”.
SOCIALIZAÇÃO EXCESSIVA
Em jogos ao vivo, você não pode simplesmente fechar o chat e ignorar seus oponentes. As conversas em excesso te irritarão – mais ainda quando o jogo ficar lento por causa disso.
Haverá momentos que você terá vontade de dizer, “cale a boca e jogue poker” ou ficará irritado porque os dealers não forçarão os jogadores a agir rapidamente – afinal, eles trabalham por gorjetas. Irritante? “Tiltante”, talvez.
“É sua vez de falar”, dirá você educadamente, e, muitas vezes, a resposta não será nada agradável: “Você está com pressa?”. Tudo que você disser será errado. Se insistir no assunto, será visto como “sério demais”, “antissocial” ou o “cara chato da mesa”. Se ficar quieto, ficará irritado – ou seria tiltado? – com o jogador, com o dealer... com o mundo.
Sempre haverá também aqueles jogadores que puxarão conversa com você. Eles vão querer conversar sobre política, esportes e, claro, poker. Os mais fracos costumam ser os mais sociáveis. Eles jogam por diversão, e socializar aumenta seu divertimento. Alguns jogos menores podem parecer um verdadeiro coquetel em que o as cartas são meros atrativos.
Não importa se você está ali para jogar. Compulsoriamente ou por educação, você terá que se socializar. Se fizer isso demais, irá perder o foco e cometerá erros que normalmente não cometeria.
PRESSÃO PARA CONTROLAR SUA LINGUAGEM CORPORAL
Você não pensava em linguagem corporal quando jogava online, certo? Mas, no live, terá que controlá-la. Se seus oponentes conseguirem ter qualquer leitura sua, você não terá chances. E pior: muitas vezes, você vai perceber que não conseguirá controlar sua linguagem corporal. Nesses casos, sua frustração será ainda maior.
PRESSÃO PARA LER A LINGUAGEM CORPORAL DO OPONENTE
Observar seus oponentes para pegar algum tipo “tell” é algo que consome tempo e energia. Mas, se não fizer isso, deixará passar informações que podem ser decisivas em uma jogada. A “leitura corporal” é muitas vezes imprecisa e tomará energia que você normalmente utilizaria em outras tarefas. Fatalmente, você errará, e, quando isso acontecer, a pressão sobre seus ombros poderá se tornar insustentável.
PRESSÃO PARA CONSEGUIR INFORMAÇÃO QUE LHE ERA DADA ONLINE
Online, você tomará decisões baseadas em ferramentas que coletam dados de seus oponentes. Por exemplo, um Hold’em Manager pode lhe mostrar contra quais oponentes é melhor atacar os blinds ou aplicar um reraise blefando. Sites como Sharkscope e Poker Rankings podem apontar quais são os jogadores bons e os ruins de sua mesa.
Porém, ao vivo, você terá que se esforçar bastante para conseguir essas informações. Sem auxílio de máquinas, erros são mais frequentes. Errando mais, você também ficará mais frustrado.
LIMITES MUITO MAIS ALTOS
Se na internet você estava acostumado a entrar em jogos que os limites máximos eram por volta de R$ 50 ou R$ 100 por jogador, esqueça isso quando se sentar numa mesa aqui fora.
Ao vivo, você terá que desembolsar pelo menos $300 ou $400 para conseguir ganhos consistentes. E pode se acostumar com raises fora dos padrões que vão te tirar da sua zona de conforto a todo o momento, algo como 10 ou 12 vezes o valor do big blind.
Para profissionais de torneios, o cenário ainda é pior. Para conseguir ganhar tanto quanto na internet, será necessário desembolsar buy-ins cinco ou dez vezes mais altos.
Ou seja, na maioria das vezes, você sentirá a pressão do dinheiro. E quanto mais altos os limites, maior será o stress e pior o seu rendimento.
EFEITOS MAIS VISÍVEIS DA VARIÂNCIA
Se você jogar jogos mais caros, passará por fases ruins mais estressantes e mais duradouras. Seu bankroll também deverá ser mais gordo. Mas haverá dinheiro suficiente, sabendo que jogos ao vivo são bem mais caros, em menor volume e, portanto, com uma variância maior?
Todos conhecem as consequências quando não se respeita o bankroll, mas, ainda assim, muitos se arriscam. E quando isso acontece, é porque está tiltado, deixando suas emoções levarem você a cometer erros gravíssimos.
Isso pode ficar ainda pior dependendo do tamanho de suas perdas. “Pode levar-se meses para se levantar uma sólida construção, mas apenas alguns instantes para colocá-la abaixo” – tome cuidado, isso é o que acontece também com o bankroll.
E mesmo que você tenha muito dinheiro, ainda há o que chamo de “bankroll psicológico” – a quantia que você perderá sem ser afetado emocionalmente. E ele pode não ser bom o suficiente para que você se recupere de um grande baque. Lembre-se que seu “bankroll real” é muito maior que o seu psicológico. Você pode ter R$ 15.000 para jogar, mas ficar uma noite inteira sem dormir depois de perder R$ 1.500.
Quando você passar do seu limite psicológico, as coisas provavelmente vão ficar feias. Você pode resolver comprar mais e mais fichas por pensar: “Tenho que ficar no zero a zero”. E essas são as palavras mais idiotas do poker. Uma vez que você esteja pensando assim, estará fadado ao fracasso. Já vi muitos jogadores talentosos se arruinarem ao chegar nesse estágio.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Lembre-se que as frustrações se acumulam. Qualquer uma delas pode lhe colocar em tilt. Deixe mais de uma te afetar e isso será mortal. Você pode ser capaz de relevar essa ou aquela irritação, mas o impacto cumulativo de todas elas pode lhe levar rapidamente ao seu limite.
O tilt é, obviamente, um perigo muito maior do que você imaginava. Nas próximas edições, aprenderemos como nos proteger dele e, também, vamos abordar os dois últimos itens da lista.
NESTA EDIÇÃO