EDIÇÃO 38 » FIQUE POR DENTRO

Showdown: O (nem tão) Grande Dinamarquês

Como o gênio dos torneios virou um pato do poker online?


Pedro Nogueira

Em Cartas na Mesa, o personagem de Matt Damon, um jogador talentosíssimo de Nova York, abre o filme com uma fala memorável. “Se você não descobrir quem é o pato da mesa na primeira meia hora”, diz ele, “então você é o pato”. Que exatidão, que exatidão! A frase de Damon (ou do roteirista) merecia ser aplaudida como uma prima donna em final de ato. Com direito a coroa de flores, assobio e o diabo. Realmente, sempre que alguém puxa uma ficha na mesa de poker, algum parceiro a está perdendo. Ou seja, se não existissem os patos, não existiriam os campeões. E dito isto, está dito tudo.

O leitor há de concordar. Se não concorda, paciência. Mas como um Phil Ivey pagaria a conta de luz não fosse por esses simpáticos jogadores, sempre dispostos a dar um call na hora errada? Ou como um Patrick Antonius ganharia nove milhões de dólares no high stakes da internet, em um ano, não houvesse alguém dando fold com a mão vencedora?

(Eu disse “high stakes” e já retifico. Lembrei que, agora, essas mesas são chamadas de “nosebleed stakes”, os cacifes que causam hemorragia).

Pois bem. Durante um tempo, eles tiveram o patrocínio do bilionário canadense Guy Laliberté, o dono do Cirque du Soleil. Dizem que Laliberté perdeu 25 milhões de dólares no Full Tilt, em 2007 e 2008, usando cinco contas diferentes. Mas, para a decepção dos parceiros, ele sumiu dos panos no ano seguinte. Certamente, não foi pelo dinheiro. Um sujeito que está entre os 400 homens mais ricos do mundo, segundo a Forbes, com a fortuna avaliada em 2,5 bilhões de dólares, não precisa se preocupar com cifras dessa dimensão. Provavelmente, se cansou do poker e arrumou outro hobbie. Talvez squash ou FarmVille ou viagens espaciais. Quem sabe.

Mas eis que, súbito, surge a figura de Gus Hansen. Com três títulos do World Poker Tour e mais de 7,5 milhões faturados em torneios ao vivo, o Great Dane (“Grande Dinamarquês”, como é chamada a raça do Dogue Alemão nos Estados Unidos) decidiu se aventurar nos nosebleed do Full Tilt.

Má ideia.

Segundo o site highstakesdb.com, Hansen teve um prejuízo de 730 mil dólares em 2007, e de 620 mil dólares em 2008. No ano seguinte, fez um bom começo de temporada – e ganhou mais de 2 milhões de dólares num só mês. Mas, tal qual um cavalo paraguaio, daqueles que começam a corrida num fôlego excepcional e travam a perna ainda na primeira volta, Hansen tomou um tombo formidável. Hoje, as suas perdas no Full Tilt são estimadas em cerca de 9 milhões de dólares, 3 milhões dos quais foram perdidos apenas em agosto de 2010.

Um célebre general inglês, o Duque de Wellington, comandante das tropas aliadas que derrotaram Napoleão Bonaparte em Waterloo, disse certa vez uma belíssima frase. Em resposta a um homem que o abordou na rua e falou “Sr. Jones, acredito eu?”, o Duque de Wellington disse: “Se você acredita nisso, acredita em tudo”. E penso na frase do Duque de Wellington enquanto leio uma entrevista que o site pokerlistings.com fez, no ano passado, com Gus Hansen. Ao ser questionado pelo repórter sobre seu prejuízo monstruoso, Hansen afirma: “Eu não sou um pato do high stakes”. Quem acredita nisso, acredita em tudo.




NESTA EDIÇÃO



A CardPlayer Brasil™ é um produto da Raise Editora. © 2007-2024. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução total ou parcial do conteúdo deste site sem prévia autorização.

Lançada em Julho de 2007, a Card Player Brasil reúne o melhor conteúdo das edições Americana e Européia. Matérias exclusivas sobre o poker no Brasil e na América Latina, time de colunistas nacionais composto pelos jogadores mais renomados do Brasil. A revista é voltada para pessoas conectadas às mais modernas tendências mundiais de comportamento e consumo.


contato@cardplayer.com.br
31 3225-2123
LEIA TAMBÉM!×