EDIÇÃO 29 » COLUNA NACIONAL

Pavimentando a estrada

Um Balanço de 2009


Leo Bello

Nunca escrevi um artigo com esse tipo de tema. Aliás, sempre achava meio chato quando, durante a infância, via aqueles longos programas de retrospectiva do ano que passavam na TV: por que cargas d’água alguém pararia para rever o que aconteceu há 12 meses? Notícia boa é aquela fresquinha, que você sabe antes de todo mundo. Dessa maneira, me parece muito mais interessante escrever um artigo sobre o que eu acho que vai acontecer em 2010, e quais são as “inside information”que eu já tenho (e eu realmente já tenho) sobre o que vai acontecer em 2010.

Só para vocês terem uma ideia, acho que o próximo ano entrará para a história como o ano em que o poker brasileiro vai nascer para o grande público no Brasil.

Só que, para isso acontecer, 2009 teve que ser um ano diferente. Esse sim foi um ano que pavimentou a estrada para a caravana passar. Falar que o BSOP foi um sucesso, falar do 750K, falar do título do Alê Gomes no WPT, dos sucessos do PokerStars, do PCA no início do ano e da invasão brazuca na WSOP é chover no molhado, porque na realidade 2009 foi muito mais do que isso.

O grande segredo de 2009 foi tirar o poker das mãos de pequenos amigos ou “astros” do poker nacional e fazer o leque crescer. Até o momento, eu até brincava, pois Leandro Brasa tinha sido primeiro em muita coisa:

- 1o campeão paulista
- 1o campeão brasileiro
- 1o mesafinalista da WSOP, em 2007
- 1o Triple Crown do Pocket Fives
- 1o campeão de um torneio de 1 milhão garantido no Full Tilt
O Alê Gomes do mesmo modo:
- 1o campeão da WSOP
- 1o campeão do WPT
- 1o a chegar na mesa final do EPT (PCA Bahamas)

Então veio 2009, e o primeiro brasileiro a ganhar o Sunday Million era pouco conhecido. E logo atrás dele vieram outros. E, de repente, nos rankings nós tínhamos mais do que aquele mesmo punhado jogadores ganhando.

Todos os grandes torneios ao vivo do país – o BSOP, o 750K, o Tower, o 500K – tiveram campeões que até então ninguém conhecia no cenário nacional.

Antes nós fazíamos o BSOP pensando em como recepcionar aqueles 70 a 100 amigos chegados, que viajavam com o poker para todos os lugares. Agora a Série Brasileira movimenta 400 pessoas em média, a grande maioria chegada ao poker nos últimos 12 a 24 meses, ou seja, que não fazem parte daquela leva que era conhecida e determinava o rumo das coisas.

Ao escrever, lembrei-me de um episódio que ocorreu no primeiro ano do BSOP, quando um grupo de amigos, em que estavam Victor Marques, Vinicius Marques, Marcelo Carabina, Eric Mifune e outros, resolveu fazer um boicote a uma etapa do BSOP. Na época, aquela atitude me preocupou, pois o que eles tinham a dizer era relevante para o destino e sucesso do torneio. Existia um pequeno grupo que era sim, formador de opinião e extremamente importante para o poker. Aliás, esse tipo de união foi fundamental na época para que o poker crescesse e não virasse apenas o fruto das vontades de um ou dois, mas sim se aproximasse do senso comum de um grupo maior de pessoas.

Essa era uma época em que, para participar de um torneio, você podia pagar a sua inscrição ou conseguir se inscrever através de um dos diferentes métodos que demonstravam seu grau de amizade com o organizador, tipo emitir um vale, transferência pela Internet, cheque pré-datado, amigo que dava a palavra que o outro iria pagar, e por aí vai.  Também era uma época em que certas pessoas jogavam até de graça, em “pacotes” dados pelos organizadores que depois geravam problemas para pagar prêmios (já vimos esse filme, não é?).

Faltava profissionalismo. Para que houvesse crescimento, acho que o público precisou exigir uma postura mais profissional e competente, então as leis de seleção natural entrariam em ação.

Isso começa, por exemplo, em ter um regulamento unificado, que pudesse ser utilizado como base para todos os torneios no Brasil em relação à conduta dos jogadores, a regras para o desenrolar do torneio, a direitos e deveres dos competidores etc. Foi então que surgiu a ADTP (Associação dos Diretores de Torneios de Poker), criada por Devanir “DC”Campos, Juliano Maesano e EltonCZ. Pronto, a partir de então, quem quisesse fazer um torneio pelo Brasil, tinha pelo menos uma referência disponível.

Em 2009, saiu do papel, embora ainda de forma tímida, a CBTH (www.cbth.org.br). A Confederação Brasileira de Texas Hold’em foi finalmente formada, conquistou seu CNPJ, seu espaço na Internet, e começou a produzir os primeiros laudos que defendem o nosso esporte como jogo de habilidade. Ela vai brigar pela regulamentação do poker no Brasil. No primeiro ano trabalhou-se para colocar ordem na casa, mas, já em 2010, o BSOP será oficialmente um torneio da CBTH, e parte de cada inscrição irá direto para a Confederação, para que esta possa continuar sua briga para conseguir os elementos necessários na briga pela legalização. A CBTH não pertence a nenhuma empresa ou grupo específico. Ela é democrática e aberta às federações pelo país. E está também se organizando internacionalmente, se filiando as organizações latino-americanas e mundiais, ou seja, participando da briga de forma global. E 2009 viu tudo isso acontecer.

Eu acho que, além das iniciativas externas terem se profissionalizado, o público se modificou. Aquele pequeno grupo hoje não tem mais a mesma representatividade, pois, por exemplo, no BSOP, um grupo de 20 jogadores do Amazonas esteve presente em todas as etapas, viajando pelo Brasil. Como não dizer que o pessoal lá de Manaus tem uma voz ativa no que está acontecendo? E o pessoal do Sul? Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul parecem estar sempre envolvidos em fazer torneios gigantescos. Ok, o titulo foi para o Rio, com 641 jogadores no maior torneio em público da América Latina, no BSOP em setembro. Por outro lado, dá para negar a força de São Paulo, que foi sede do torneio com a maior premiação do Brasil, o 750K em outubro? E quem diria que Goiânia faria um BSOP com maior público do que o recorde do ano de 2008? Salvador repetiria o mesmo feito. Ou seja, espalhou-se pelo Brasil inteiro a força desse novo público de poker. Os jogadores foram a força motriz que impulsionou o poker em 2009.

É claro que quem quisesse continuar provendo os serviços precisou se profissionalizar também. Portanto, tudo cresceu. Escolas de poker online como o TVPokerPro e a Universidade do Poker têm o mesmo nível de escolas internacionais como o Poker XFactor e o CardRunners. Nosso fórum mais famoso, o MaisEV, tem discussões boas como nos primórdios do TwoPlusTwo. As nossas revistas (CardPlayer Brasil e Flop) melhoraram sua qualidade de edições a olhos vistos. Os portais de poker proliferaram, e o Superpoker.com.br se consolidou como um grande portal de informações.

E, é claro, tivemos as surpresas. Quem diria que no Brasil teríamos uma estrutura como a do MeBeliska, que está conseguindo transmitir em tempo real, por streaming na Internet, os nossos principais torneios? Apenas o EPT e a WSOP conseguem fazer isso no mundo inteiro. E aqui no Brasil nós já temos, com a presença de grandes comentaristas e participação de profissionais, transmissões que chegam a 30 horas em um evento. É incrível e nem eu sonharia com isso no início do ano.

Conquistamos espaços nas TVs. Hoje são vários canais transmitindo poker, graças ao investimento de sites como o Poker Stars e o Full Tilt, mas também do brasileiro Tower. ESPN, FX, Band Sports: a mídia aos poucos abre espaço para o poker ser visto pelo grande público. Prova disso é ver André Akkari com milhares de seguidores no Twitter como uma grande celebridade de outra área. Belo trabalho de divulgação o que ele está fazendo.

O BSOP ficou muito mais bonito e profissional, indo para grandes resorts e hotéis de luxo e crescendo como evento. O que antes era organizado por mim, Brasa e DC, hoje envolve uma equipe fixa de mais de 15 pessoas, e outra variável que chega a 75 funcionários para fazer o torneio acontecer, entre dealers, imprensa, apoio, seguranças, garçons etc.

Ah, e claro, eu finalmente consegui lançar meu segundo livro, “Dominando a Arte do Poker”, em outubro. Depois de dois anos escrevendo, produzindo e procurando espaço, a Editora Ediouro lançou a obra. Estou superfeliz com o feedback que tenho recebido. O primeiro livro, “Aprendendo a Jogar Poker” já chegou a 25 mil cópias vendidas. Será que o segundo terá esse fôlego? Só o tempo dirá.

Até por eu estar envolvido pessoalmente, não posso deixar de citar os esforços do BestPoker no Brasil.  É claro para mim, e menos transparente para o público em geral, que, para um site do tamanho do Poker Stars e do Full Tilt, investir em marketing no Brasil não é tão caro assim, até por conta do potencial imenso de retorno para essas empresas. Mas para sites menores, como o BestPoker, o buraco é mais embaixo. Para investir no Brasil, o site deslocou para o nosso país seu CEO e criou uma base de operações. Grande parte de seus investimentos para o ano veio para nosso país. E quem ganha com isso é o nosso público. Entre outras coisas, eles botaram em prática o projeto do CBO 2009, para levar mais de 20 jogadores a Las Vegas em 2010 durante a WSOP. Isso é mais do que todos os jogadores brasileiros que lá estiveram há 4 anos.

E vale lembrar que eles foram, junto com o Full Tilt, o principal patrocinador do BSOP ao longo do ano. E ainda patrocinaram jogadores. Eu fui ao EPT e à WSOP patrocinado pelo BestPoker. Ou seja, palmas para o BestPoker por investir no Brasil.

Da mesma forma, é muito bom ver o Party Poker investindo através do Felipe Mojave no Brasil. Ou ainda, o Titan Poker e o Everest, que tiveram algumas ações. E que tal a história do Bananas Poker, que é um site com a cara do Brasil? Crescimento e investimento.

Espero que minha profecia pra 2010 se concretize, e que com essa estrada bem pavimentada, ao invés de um caravana de carroças, haja a decolagem de aviões a jato, levando o poker para todos os cantos do Brasil e elevando o nosso esporte. Que venha 2010!




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