EDIÇÃO 13 » COMENTÁRIOS E PERSONALIDADES

Jogando no Rush

A psicologia da situação


Bob Ciaffone

Parece ser um axioma geralmente aceito no poker o fato de quando você está “em um rush” (conseguindo muitas mãos vencedoras em um curto período de tempo), deve tirar vantagem dessa ótima situação alterando seu jogo. Ainda assim, eu já testemunhei muitos jogadores fazendo drásticas mudanças quando estão “iluminados”, e geralmente perdendo grande parte do que ganharam — ou mais — no processo. É quase como se eles tivessem a consciência pesada por terem tanta sorte, e agem como um criminoso tentando se redimir de seus crimes.

Antes de falar sobre como eu acho que você deva jogar em um rush, vamos falar sobre suas causas. A sorte não vem de um armário proporcionalmente medido. Seria bastante improvável que um evento que tem odds de 9-1 de não acontecer se desse exatamente na 10ª oportunidade de ocorrência. A sorte, seja boa ou má, vem em ondas.

Presumindo que o jogo seja sério, as odds de você receber uma boa mão não são afetadas de forma alguma pelo fato de você ter recebido durante um longo período mãos ruins ou um grande número de boas mãos. A expressão do poker que descreve isso é: “As cartas não têm memória”. Sorte passada na distribuição das cartas não tem efeito nenhum sobre a sorte futura na distribuição das mesmas.

A maioria das pessoas se lembra melhor das sessões de poker se tiverem tido sorte muito boa ou muito ruim. Permitam-me contar sobre uma das minhas noites de poker mais memoráveis, quando eu tive ambas. Isso ocorreu há cerca de um quarto de século. Eu estava jogando em um cash game de no-limit hold’em no Binion’s Horseshoe durante a World Series of Poker. Embora eu não tivesse sofrido uma bad beat, minhas mãos iniciais eram péssimas. Eu estava no jogo havia sete horas sem receber A-K ou um par de valor decente, e estava paralisado com $500. Então, de repente, minha sorte mudou radicalmente. Eu recebi um par de reis na posição cut-off e dei raise contra alguns limpers. Um dos blinds pagou, e isso atraiu dois limpers. O flop trouxe um rei e duas damas, e eu dupliquei meu estoque à custa de um jogador que tinha uma dama e havia feito um full house no turn. Na mão seguinte, recebi um par de ases no button, aumentei o pote e consegui uma trinca no flop, duplicando novamente. No espaço de duas mãos, eu passei de estar paralisado a ter ganhado quase três mil. Acabei com cerca de quatro mil no momento em que ganhei dinheiro. No poker, você nunca sabe quando sua sorte vai mudar. Não há razão alguma para ela ser totalmente ruim ou totalmente boa durante uma sessão inteira.

A ciência diz que as teorias de que você “merece ter sorte” ou “passa por um período” não têm fundamento. No entanto, muitos apostadores não dão atenção à ciência, e acreditam que existem forças místicas atuando, controlando o destino. Eis algumas reações típicas a rushes:

Alguns oponentes se comportam como se o “iluminado” estivesse fortalecido por uma força mística, evitando confrontos com um jogador que está embalado. Assim, um rush faz com que alguns oponentes fiquem tight.

Existe uma reação oposta a rushes que também pode ser testemunhada. Seu raciocínio é um mais ou menos assim: “Esse cara está forte agora, mas ele já usou quase toda sua boa sorte, e está prestes a se machucar. Ele está a caminho de levar uma fatiada. Eu quero estar presente quando isso acontecer”.

Algumas pessoas reagem se autoproclamando administradores da justiça equilibrada, tornando-se xerifes do jogo. “Esse cara acha que é o rei, mas ele pode perder como qualquer outra pessoa. Eu queria pegá-lo para que ele sentisse o gosto da realidade”.

E existe também a reação analítica. “Esse cara está em uma fase de sorte, e sabe disso. Ele muito provavelmente vai jogar muitas mãos que não deveria. Há chances maiores de pegá-lo sem a força normal que suas apostas indicam. Eu tenho a chance de me aproveitar da empolgação dele e ganhar uma parte de suas fichas”. Eu devo admitir que é assim que eu, em regra, reajo diante do rush de um oponente.
Como você pode ver, tais reações são bastante variadas, mas três das quatro dão ao jogador em um rush mais ação, ao invés de menos. Minha experiência no poker diz que, quando um jogador estiver claramente “iluminado”, o resultado final é que ele receberá mais ação de seus oponentes.

Eu não acho que você deva sucumbir à sensação psicológica que ocorre quando se está em um rush — a de que você entrou em uma cabine telefônica, colocou sua roupa azul e vermelha, e apenas kriptonita pode lhe deter. Tal comportamento pode fazer com que você fique superagressivo em um momento no qual já está propenso a dar mais ação do que o normal.

Durante um rush, é preciso basear suas decisões na psicologia da situação, em vez de na expectativa de mais sorte boa. A psicologia diz que você vai conseguir mais ação do que o normal. Eu não vejo nada de errado em ver mais flops do que o normal, desde que se possa fazê-lo de forma barata. Quando suas implied odds aumentam, você pode se envolver com mais freqüência. Mas não faça isso com exagero. Boa posição terá ainda mais importância, pois é muito mais fácil ganhar dinheiro em um flop de sorte quando seu oponente atua primeiro.

Você deve aumentar mais potes do que o normal quando estiver em um rush? Bem, você pode ser mais ativo, mas se certifique de que tem boa posição.

Eu raramente blefo quando estou em um rush. Por que blefar se as pessoas estão dispostas a pagar? Eu recordo de uma ocasião, em que eu havia acabado de ser movido para uma nova mesa em um torneio, e aumentei com a primeira mão que recebi. Ninguém pagou. Eu aumentei com a segunda, uma pessoa pagou, apostou no pote e ganhou. Cerca de duas mãos depois, eu aumentei novamente. Alguém revidou, eu fui all-in por uma pequena quantia adicional, e pagaram. Um dos jogadores riu e disse: “Agora veremos com o que você está aumentando esses potes”.

“Ah, não, não verão”, disse Bill Smith, que sabia como eu jogava desde meus dias de jogos caseiros em Dallas. “Dessa vez ele vai mostrar a vocês uns dois reis”. E meu par de reis ganhou o pote.

Fichas ganhas em um rush devem ser tratadas com o mesmo respeito das demais.




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