EDIÇÃO 77 » COLUNA NACIONAL

A Arte da Continuation Bet

Um tema familiar a jogadores de todos os níveis


Fábio Eiji

No artigo de hoje, o assunto será continuation bet (c-bet). Este é mais um tema bem familiar a jogadores de todos os níveis e uma das primeiras ferramentas que (mais ou menos) aprendemos a utilizar. Trata-se da aposta que fazemos no flop quando somos o agressor pré-flop, ou seja, continuamos a agressão. A lógica dessa jogada parte do pressuposto de que, para defender-se de uma aposta, o vilão tem que acertar o flop, mas isso só acontecerá perto de 35% das vezes. Bem, isso faz bastante sentido se falarmos de um poker jogado em 2008 ou 2009. Hoje, já não é bem assim que a coisa funciona.

De maneira geral, os jogadores, mesmo os recreativos, aprenderam a jogar e praticamente não cometem erros quando falamos do jogo pré-flop. E eles sabem que, quando decidem pelo call, enfrentarão uma c-bet muitas vezes. Ou seja, já estão acostumados e, muitas vezes, preparados para enfrentar e reagir a essa jogada.

É comum encontrar por aí jogadores, mesmo regulares vencedores, que ainda não se adaptaram a essa nova realidade e cometem o erro de usar a c-bet demais, ou seja, fazem continuation bets de maneira automática, sem fazer as devidas considerações sobre. 

Antes de fazer a c-bet, é preciso pensar em alguns elementos importantes:

– Range que representamos.

– Range que enfrentamos (perfil do oponente — loose ou tight; passivo ou agressivo).

– Textura do bordo.

– SPR (tema do último artigo). 

– Valor ou blefe.

Complementando os elementos acima, há a c-bet que não se encaixa nem valor nem em blefe, que seria a aposta para “recolher o dead doney”. Por exemplo, fazer uma c-bet com A-K em um bordo 7-7-2 rainbow para ganhar o pote ali, já que mãos não dominadas (live cards) ainda têm seis outs para melhorar e dificilmente reagirão agressivamente nesse tipo de flop.

C-BET POR VALOR E POR BLEFE

Se estamos apostando por valor, devemos considerar as seguintes questões:

1. Definir o range do adversário e fazer a seguinte pergunta: esse range acerta o bordo? 

2. É possível extrair três streets de valor (fazer o oponente pagar flop, turn e river com mãos piores)? 

3. Quais os tipos de turn vão me fazer desacelerar?

Se a reposta para alguma das duas primeiras perguntas for “não”, então, geralmente, o check será melhor do que a c-bet. 

Já se estamos fazendo a c-bet por blefe, devemos considerar o seguinte:

– Qual o range que estou enfrentando? Esse range acerta esse bordo? De que forma?

– Em quais turns continuarei a blefar? Quais mãos pagariam flop e dariam fold no turn?

– Quais rivers continuarei a blefar? Quais mãos pagariam flop e turn, mas dariam fold no river?

Ou seja, é necessário que, antes de fazer a c-bet, haja um plano em mente para as próximas streets. Já que a ideia é continuar apostando em muitos turns e rivers que ajudarão a representar mãos fortes, é importante que haja equidade para melhorar a efetividade da jogada: gutshots (brocas), backdoors para straight e flushes (chances de ficar para o draw no turn), e overcards costumam ser o suficiente.

Exemplo:

Temos 18 bbs e abrimos miniraise do HJ com A8. O BB, com 30 bbs, paga. O pote tem 5,5 bbs. O flop é A 6 2, e o oponente pede mesa.

Análise

Muitos jogadores fariam a c-bet de maneira automática aqui, afinal, “temos top pair”! Mas sugiro pensar um pouco mais a respeito.

A nossa aposta aqui seria por valor ou por blefe?

“Por valor, claro”, diria um leitor mais desatento. Porém, devemos começar pensando no range de call pré-flop do vilão. Podemos excluir AJ+ e 88+, pois quase todos os oponentes iriam de 3-bet pré-flop com essas mãos. Ao mesmo tempo, temos blockers para os Ases, o que reduz significativamente a frequência de A-X que enfrentamos. Mesmo assim, ainda é mais comum um oponente fraco dar call com broadways (combinações entre 10, J, Q, K e A) e pares do que com Ases nesse cenário.

Agora, vamos pensar nas mãos que representamos. Geralmente, o Ás acerta em cheio o range de quem agride pré-flop. Afinal, há muitas combinações de Ases no range de quem abre raise. Então, esse seria um bordo que acerta muito mais o range que representamos (como agressores) do que o range do vilão (como passivo).

Se optarmos por apostar aqui, há poucas mãos piores do que a nossa que dariam call. Isso porque, como disse anteriormente, não há muitos Ases no range do vilão, além do fato do Ás acertar mais o nosso range que o dele.

Dito isso, podemos concluir que a c-bet aqui não funciona como aposta por valor.

Se apostarmos por blefe, temos que fazer com que mãos melhores deem fold, o que também não parece funcionar bem, já que as poucas combinações de Ases melhores que 8 não dariam fold, muito menos as trincas. Ou seja, apenas as mãos que já estamos ganhando desistiriam. Então, também não serve como uma aposta por blefe.

Resumindo, a aposta aqui não tem sentido, por isso, devemos optar pelo check. Dessa forma, conseguimos manter um range fraco na mão e induzir o vilão a cometer erros — blefar, por exemplo — nas próximas streets.

Espero que este artigo ajude o leitor a repensar as suas continuation bets. Não devemos fazê-las de maneira automática, como um robô. É preciso ter um plano bem elaborado para o restante da mão. E lembre-se: não é vergonhoso desistir de um pote quando avaliar que o bordo ajuda muito mais o oponente do que você, mesmo sendo o agressor. Se jogar corretamente, dificilmente será explorado por isso.




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