EDIÇÃO 82 » ESPECIAIS

André Akkari - O Homem de um milhão de dólares


Marcelo Souza


Desde a nossa última conversa, no ano passado, vejo que ele mudou completamente e que não mudou nada. O Akkari de hoje está mais confiante, mais completo. Em apenas um ano, ele desenvolveu ainda mais suas habilidades, cercou-se de pessoas que o fizeram crescer em todas as vertentes, preparou-se para explodir cenário mundial e manteve os seus ideais, crenças e caráter inabaláveis.

“E aí, porquinho? Como está?” – com sua alegria típica, é com essa frase descontraída que ele me recebe para nossa entrevista. Se existe algo que talvez rivalize com sua paixão pelo poker, é o Corinthians. Mais um do “bando de loucos”, André Akkari nunca perdeu a oportunidade de fazer uma brincadeira com os torcedores rivais. E em mais de uma hora de entrevista, percebo que existem outras coisa que ele também nunca perdeu: a humildade, a simpatia e a chama interna que apenas os grandes campeões carregam no peito. 
 
Desde a nossa última conversa, no ano passado, vejo que ele mudou completamente e que não mudou nada. O Akkari de hoje está mais confiante, mais completo. Em apenas um ano, ele desenvolveu ainda mais suas habilidades, cercou-se de pessoas que o fizeram crescer em todas as vertentes, preparou-se para explodir cenário mundial e manteve os seus ideais, crenças e caráter inabaláveis. 
 
Com a missão já cumprida no online — o inédito, nacionalmente falando, ROI (sigla em inglês para “Retorno sobre Investimesto”), de US$ 1 milhão, recentemente alcançado em torneios no PokerStars, já mostra isso —, ele já anunciou que seu ritmo na internet vai diminuir drasticamente. Ainda o veremos em ação nas grandes séries, como WCOOP e SCOOP, mas o seu foco agora é ao vivo. Nos próximos anos, ele estará nos principais torneios de poker do mundo, buscando levar a bandeira do poker nacional a locais ainda inexplorados. Ele está sedento por vitórias, títulos e fichas.
 
Dedicar-se apenas aos grandes torneios de poker ao vivo, sem depender dos outros, é para poucos, resultado de uma carreira bem estrutura e planejada. Akkari trabalhou duro em seus 10 anos como jogador. Hoje, colhe os frutos. Alcançou um status em o tempo não lhe gerencia, muito pelo contrário. O tempo agora trabalha a seu favor e conveniência.
 
Entre outros inúmeros dons, o profissional do PokerStars sabe se expressar de forma brilhante. E é graças à sua oratória afiada que os leitores da Card Player leem, agora, uma das entrevistas mais marcantes que já tive a oportunidade fazer.
 


Marcelo Souza: Akkari, primeiro vamos falar ao que remete o título desta matéria. Você é o primeiro jogador do Brasil (e um dos poucos do mundo) a chegar a US$ 1 milhão de lucro jogando torneios no PokerStars. Qual a sensação?
 
André Akkari: Eu sempre tento manter o ROI o melhor possível. Cada mão e cada jogada é buscando esse retorno, mas nunca pensei em valores. Penso nas melhores decisões para poder chegar ali. Realmente é uma marca histórica. Acho que o grande segredo é o equilíbrio que consegui encontrar na minha carreira, jogando ao vivo e online. Alcançar esse marco me deixou muito contente, mas é só questão de tempo que outros caras no Brasil consigam também. O volume que nossas feras do online têm jogado é impressionante. Então, é só aguardar.
 
MS: E um dos grandes responsáveis por essa conquista são os torneios 109 com rebuys. Você tem inúmeras cravadas e mais de 300 premiações nesses eventos. Qual o segredo? 
 
AA: (Risos) Para ser sincero não sei. Acho que é o que eu mais envolvo para jogar. Eles têm algumas peculiaridades. O field nunca é tão grande, apesar que tenho os títulos também no de domingo, o Sunday Rebuy, que tem mais inscritos. É também um torneio que acontece várias vezes na semana, por isso acaba tendo uma amostragem maior e aparecendo mais resultados. Mas eu gosto muito de jogá-lo. Mas como como criou essa mística, de eu jogar e ganhar, então eu fico querendo jogar e ganhá-lo ainda mais. Na minha carreira, eu sempre consegui operar bem em todos os cenários do online, mas com o 100 com rebuys, realmente, tem alguma coisa que não sei explicar o que é.
 
MS: Agora, um fato curioso. Sua maior premiação no online não vem do Texas Hold’em, sua especialidade, mas sim de um evento de H.O.R.S.E. do WCOOP, em 2008. Como você explica isso? E na época você era bom nos outros jogos (Stud, Omaha e Razz)?
 
AA: Naquele momento, eu fui muito malandro. Uma das grandes sacadas na vida é saber quando você não sabe alguma coisa, e eu estava ciente de que jogos que eu não sabia jogar. Eu sou um cara com uma autocrítica enorme.  Eu tinha certeza, por exemplo, que no Omaha Hi/Lo eu era muito fraco — ainda não jogo bem, mas vou jogar —, então eu fugia desse jogo. Eu não me metia a jogar potes muito grandes, não acelerava demais e me concentrava mais em mãos de valores. O Stud Hi/Lo, quase a mesma coisa. Mas aí tinha jogos como o limit (Hold’em), que é um jogo que desde que eu comecei a jogar, eu estudava. É um jogo em que me divirto. Nele, eu forçava a barra, sabia que eu tinha uma vantagem maior ali. Fui seguindo essa estratégia e as coisas foram acontecendo. Quando percebi, eu estava na mesa final. O heads-up começou no Omaha Hi/Lo. Acabei me complicando e perdendo o bracelete. Fiquei triste, queria ganhar, mas o resultado foi sensacional. 
 
MS: Hoje, você é a pessoa com maior representatividade dentro do poker nacional. Isso foi planejado?

AA: Acho que isso foi acontecendo com o tempo. Quando eu comecei, o poker tinha uma imagem muito ruim na sociedade e sempre teve um grupo pequeno de apaixonados, de pessoas que eram fanáticas, que gostavam demais. Elas sabiam que o jogo era de habilidade e ele virou o “filho feio” (risos). Se alguém falasse mal, esse pequeno grupo surtava. E eu era um desses caras, que sempre saiu a campo para defender o poker como profissão e prática esportiva. Então, quando tem alguém que faz isso o pessoal você fira fã do cara, se conecta com a pessoa de algum jeito. Acho que se deve a isso, de eu sempre estar na briga para defender, não só eu, mas o (Igor) “Federal” fez a mesma coisa, o CK (Christian Kruel), Raul (Oliveira), (Felipe) Mojave. Todo mundo lutava e eu acho que acabei herdando mais esse lado do embaixador, o lado de mostrar, para quem não acreditasse, que o poker é um jogo de habilidade. Isso foi fazendo com que eu ganhasse mais representatividade, e aí as coisas começaram acontecer. Claro que também fui me esforçando pra fazer um trabalho cada vez melhor, de mídia digital, de rede social, de interação, como o “Boteco do Akkari” [sempre que consegue boas premiações na internet, Akkari realiza torneios de graça, com premiação, para os participantes do seu Home Game no PokerStars], que é coisa muito bacana, porque acaba fazendo com que as pessoas acompanhem seus resultados, acompanhem as mesas finais No final, você acaba dividindo um pouco da alegria do momento com aquela turma. Tudo foi uma combinação de fatores que eu fui criando. Eu era publicitário, então eu também tenho essa pegada do marketing. Sempre estudei isso e fui analisando em que cada coisa podia ser efetiva sobre meu trabalho. Acabei tendo grandes resultados em médio e longo prazo e, hoje, estou colhendo os frutos.


MS: Você acabou de renovar o seu contrato com o PokerStars por mais três anos. O que você pode falar sobre esse contrato?

AA: Eu tenho um contrato muito bom. Fico muito contente de trabalhar com eles. Mas eu sempre dei ênfase que eu sou um profissional autônomo, não sou funcionário de ninguém, eu sou simplesmente um atleta patrocinado pelo PokerStars, e nesse tipo de conceito, o PS sempre foi muito bacana e reconhecedor das coisas que eu fiz. Eu tinha um contrato bacana e para um melhor. Não é do nível do Negreanu, em termos de rentabilidade, e nem poderia, o cara é o Pelé do pôquer, que mais leva a marca do site para o mundo. E eu tenho muitos benefícios, que são, na maioria, os torneios que eu jogo.  Eu não preciso pagar para jogar os torneios que eles organizam, como o LAPT, o EPT e BSOP. E na World Series, eu tenho o buy-in do Main Event e de outros sete eventos paralelos. Se eu ganho alguma coisa, a premiação é integralmente minha. Para um jogador de poker, isso é fantástico. Tenho também o rakeback de 100% do site e uma ajuda de custo. Eu não tenho salário, mas essa ajuda me faz aliviar os custo de viagens e de passagens. O poker ainda não é como o futebol, então, tirando o caso do Negreanu, são todos contratos que envolvem mais torneios ou menos torneios, mais despesas ou menos despesas.

MS: O que falta para o Brasil brilhar nos torneios internacionais? O País é um dos principais mercados do poker mundial, mas países com menos representatividade têm jogadores mais conhecidos e resultados mais expressivos.

AA: Acredito que é uma combinação de fatores. Primeiro, amostragem, que também é o principal. Se você pegar a última etapa do EPT, de Monte Carlo, teve uma boa gama de brasileiros participando. Nos outros EPTs não tinha tanta gente assim. Agora que os brasileiros cresceram muito no online, eles começaram a conseguir fazer bankroll para poder jogar os eventos ao vivo. Os torneios ao vivo não têm a mesma amostragem do online. Se existe um lugar onde realmente exista a variância é ao vivo. Quando você consegue fazer um bankroll que suporte, para segurar essa variância, aí você começar a migrar. Caras como o Dowgh (Douglas Ferreiras) e Ariel (Bahia) já começaram a comparecer em todos os torneios. Até o (Caio) Pessagno, que não sai do online, foi para Monte Carlo. Tem uma galera (Thiago) Crema, Rafael Moraes. Todos esses caras resolveram sair para campo. Mais cedo ou mais tarde teremos amostragem e coisas boas vão vir para o Brasil. 
Outro ponto é que eu acho que ainda faltar um teor de profissionalismo. Eu vejo que lá fora os caras são mais profissionais do que a gente. Sendo mais profissionais, eles aumentam a chance de bons resultados. Profissionais não só no estudo do jogo, mas no empenho da vida pessoal, no trato com o corpo, com a saúde, postura. Mas acho esse processo está começando aqui. Há uma evolução bem grande. O (Thiago) Decano é um cara que puxou essa fila, que tem se preparado fisicamente e psicologicamente pra jogar em grandes eventos. A gente achava que poker era um esporte mental, mas ele tem uma pedida muito grande no lado físico. Quanto mais as pessoas preocuparem com isso, mais títulos virão. 

MS: Ainda nesse gancho. Desde que o Caio Pimenta jogou o Super High Roller de US$ 100.000 do PCA 2011, o Brasil não tem representantes nesse tipo de evento. Você, hoje, seria o cara que poderia fazer isso, seja por conta própria ou por meio de investidores. Por que não vemos o Akkari nos Super High Rollers, que agora estão na moda?

AA: Eu tenho algumas limitações, filosóficas e de jogo. Não acho que esses torneios sejam tão bacanas assim de serem jogados. Quando você pega um cara que joga há muito tempo, como Phil Helmuth e Erik Seidel, quanto mais passa o tempo, mais fica difícil desses caras ganharem torneio de grandes fields, de três ou quatro mil pessoas. Primeiro porque o nível técnico está melhorando, e depois porque tudo virou uma verdadeira maratona. A tendência é que caras mais jovens tenham mais chances. Então, esses torneios mais caros, de 100, 200 mil dólares, o field é reduzido, mas que ainda assim gera um sabor de vitória, de mesa final. O que eu não condeno de forma alguma. Se os caras têm dinheiro para jogar e tem vontade, tudo bem. Mas eu não associo o nível de habilidade de um jogador, exclusivamente, ao valor do buy-in que ele joga.  Até porque torneios high rollers possuem muitos jogadores ruins, empresários milionários que só estão lá por diversão. 

Meu segundo ponto é que eu nunca gostei muito de correr atrás de terceiros para investirem no meu jogo. Se acredito que sou lucrativo, eu tenho bankroll para controlar as coisas que eu jogo. Também não vejo problema nenhum em abrir cotas e vender, mas eu não tenho essa necessidade tão grande. Tem muita gente que chega no estágio que eu cheguei e começa a ficar com vergonha de não jogar. Os caras falam: “Poxa, não vou jogar? Eu sou Team Pro, o que as pessoas vão achar? O que PokerStars vai achar de mim?” Nunca tive esse problema, esse tipo de preocupação. Sou o que sou, não preciso mentir para ninguém, nem tentar ser alguma coisa apenas para agradar aos outros. Tenho que ser o melhor que eu puder e viver bem com isso. Não é o valor do buy-in que me deixa mais feliz, menos feliz. No último EPT, não joguei nem o high roller de 25 mil euros. Eu tinha bankroll pra jogar, poderia ter jogado, mas não é uma necessidade minha. Quando não me sinto bem para jogar, não jogo. O mesmo vale se não tenho bankroll pra jogar. Muitas vezes, na internet, já falei: “Não vou jogar esse evento, está fora do meu bankroll”. Esse é o melhor exemplo que posso dar, e por isso acho que tem tanta gente que gosta da minha carreira. No médio e longo prazo as pessoas têm a percepção se você é verdadeiro.

MS: Hoje, você também é um empresário, com uma carteira de negócios bem diversificada. Como é conciliar isso com o poker?


AA: Não está fácil (risos). Mas faço tudo com muito gosto.  Eu sinto muita adrenalina nessa esfera dos negócios. Tenho sede de estratégia, de ver as coisa acontecerem.  É algo que, de alguma maneira, acaba competindo com o poker, o que, de maneira alguma, não me tira o gosto pelo poker. É claro que, às vezes, acabo me comprometendo mais do que posso. O grande segredo para essas coisa acontecerem é você achar pessoa que sejam boas o suficiente, que sejam de confiança e que tenham pegada. Graças a Deus, essas pessoas tão aparecendo na minha vida. Existem pessoas comigo que são tão surtadas como eu. Eu acredito muito no lado bom desta palavra, “surto”, em pessoas que realmente não sossegam, não dormem enquanto não fazerem as coisas acontecerem. O (Leonardo) Bueno e Piero, do QG Akkari Team; o “Moscou”, que comanda o restaurante japonês. Quando vejo pessoas desse jeito, eu tenho muita vontade de me aproximar e dar uma chance. Se eu puder e estiver ao meu alcance, eu gosto de me relacionar com esse tipo de gente. Eles geram sucesso, alegria. O que eu gerei para mim, com o poker, criaram ramificações e abriram isso para mais gente, para esse universo de benefícios.

MS: Para finalizar, e o futuro do poker no Brasil?

AA: Só tem a crescer. Tende a se estabilizar como uma referência de entretenimento, de esporte mental. As pessoas tinham dúvidas se era legal jogar poker, não só em termos de legalidade, mas se era gostoso mesmo, se era um hobby que valia a pena você ficar jogando com seus amigos. Hoje não. Cada vez mais elas gostam, se divertem, veem que é um jogo interativo. Com o tempo, vai acontecer o que aconteceu nos Estados Unidos. Lá, o poker é um entretenimento definido. Ninguém contesta. As pessoas gostam de jogar porque gostam de jogar pôquer e vão continuar jogando toda a vida. Fora isso, a parte profissional do jogo também não vai parar de crescer. Cada vez mais vai ter gente se profissionalizando, jogando melhor, trazendo mais resultados. E quanto mais resultados, mais ídolos. Quanto mais ídolos, mais pessoas atraídas.  Um dos grandes prazeres que se tem no poker é você conseguir levar um hobby como profissão. As pessoas enxergam isso e querem ter isso. A maioria da população trabalha em coisas que não gosta, e de repente seu hobby é seu trabalho? E isso está crescendo cada vez mais graças ao trabalho que a gente fez, do trabalho da Confederação (CBTH), do trabalho do Igor (“Federal”), da entrada do Ronaldo no PokerStars, do trabalho das revistas, dos sites de poker. Todo participou dessa missão. O poker é uma realidade e acredito que eu seja um dos maiores termômetros. As pessoas me procuram em shopping, me param na rua.  Sou reconhecido cada vez mais. Não tem mais volta, caiu na graça do povo. Agora é aproveitar para fazer explodir, levar mais mensagens para mais pessoas, para aumentar a base de jogadores e levar, novamente, o poker ao próximo nível.
 

SOBRE ANDRÉ AKKARI
Premiações Online: US$ 3.379.906
Premiação Ao Vivo: US$ 1.072.768
Melhor Resultado Ao Vivo: 1º do Evento #43 da WSOP 2011 (US$ 675.617)
Melhor Resultado Online: 2º no Evento #32 [H.O.R.S.E.] do WCOOP 2008 (US$ 200.000)


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