EDIÇÃO 6 » ESTRATÉGIAS E ANÁLISES

Os três estágios


Raul Oliveira

Nesta edição vou falar sobre o modo como classifico o nível dos jogadores. Não discutirei o estilo de cada um, mas sim o modo com que encaram o jogo. Para isso, vou dividi-los em três estágios. No primeiro se enquadram os iniciantes, aqueles que enxergam o hold’em como uma roleta, e também os que têm “preguiça” de pensar e por isso não sabem de nada do que esta acontecendo ao seu redor. No segundo estágio estaria a maioria dos jogadores, no qual se sabe o que está acontecendo, mas ainda é preciso pagar para ver que estava certo. E no terceiro é onde se encontram as grandes feras do poker mundial, no qual o mais importante é sua própria leitura. Saiba um pouco mais sobre cada um desses níveis.

ESTÁGIO 1
Neste primeiro estágio as cartas da mão têm 100% de importância na forma de o jogador atuar – o raciocínio é limitado e fica preso ao seu próprio jogo. Um exemplo clássico é quando o jogador recebe AA e nada que venha no bordo o fará largar a mão. Ao final, ele irá mostrar seu par de ases como quem diz: “o que poderia fazer, eu tinha AA...” O importante aqui é entender que o jogo é composto pelas 5 melhores cartas das 7 que cada um usa, então, num bordo como KQT87©, se você tem AA, sua mão é a 19ª melhor (sem considerar os naipes das cartas). Em outras palavras, numa mão com muita ação, com certeza estará perdendo com seu par de ases, e saber largá-lo é fundamental. Se você se encontra nesse estágio, estude bastante, e o principal: se desapegue das próprias cartas! Não é porque tem AK que deve ir até o fim da mão – assim como não é porque têm apenas um 22 que vai dar fold: raciocinar sobre a jogada desde o pré-flop é o mais importante. Prestar bastante atenção aos bons jogadores também ajudará.

ESTÁGIO 2
Aqui o jogador tem a leitura do jogo, mas ainda precisa pagar muitas vezes para ver que estava certo. Neste caso, a auto-afirmação passa por ele dar call e falar “eu sabia que ele tinha tal mão”. A questão é: se você sabia, por que pagou? Acho que apenas 1% dos jogadores consegue fugir desse estágio completamente, portanto, minimizar o tempo de permanência nele deve ser seu objetivo. Eu mesmo, por muitas vezes, me pego dentro dele, principalmente durante as bad runs. Esse com certeza é um dos fatores que aumenta (e muito) nossas perdas nas marés de azar, e a celebre frase “ele não pode ter jogo de novo”, no fundo, é uma mentira para nós mesmos, que sabemos que estamos batidos mais uma vez, mas queremos pagar para mostrar com o quanto de azar estamos e que não há como não perder muito mais nessa hora. Um exemplo típico do estágio 2 é quando a 3ª do naipe vem no bordo, e seu adversário, que deu todos os indícios que estava para a queda do flush, aposta alto, e você paga com sua trinca e diz: “inacreditável”. Um treino legal para se fazer é tentar acertar as cartas dos adversários e anotar seu índice de acerto – quando ele estiver bem alto você não precisará mais pagar para ver que estava certo.

ESTÁGIO 3
Neste nível o jogador atua 100% com base em sua leitura das mãos. Para ele não importa o que tem na mão, e sim se tem como bater seu adversário, seja pelo seu jogo ou pela sua aposta. O poker perfeito seria jogado se pudéssemos ver as cartas dos adversários e, aqui, é isso que o jogador tenta fazer: jogar como se estivesse vendo as cartas dos outros. Permanecer constantemente neste estágio é uma missão quase impossível, mas, quanto mais tempo se mantiver nele, melhor será seu resultado. Grandes laydowns valem tanto – ou mais – do que grandes blefes, e é nesse nível que a coragem que leva os jogadores a blefar forte numa mão, seja a mesma força que os faz jogar fora um AA no flop, pelo simples fato de pensarem que estão batidos. No estágio três, há outro fator importante: o jogador minimiza a importância das odds na mão, já que sua leitura passa a ter mais valor do que os números frios. Isso não quer dizer que ele abandone as probabilidades, mas apenas que não joga mais tanto em função disso.

Acredito que entre os bons jogadores exista uma constante luta entre o estágio dois e três, e o resultado disso na maioria das vezes se reflete no desempenho do próprio jogador. Uma coisa que fica clara é que, durante os bons ventos, manter-se no três é muito mais fácil. Dar um fold difícil quando se está ganhando bem é muito mais simples do que fazer isso quando se está perdendo muito (assim como uma bad run nos segura no estágio dois), e conseguir fugir dessa regra é muito importante. Outro fator decisivo é a parte psicológica e o preparo mental: jogadores frios tendem a não se abalar com bad beats e isso faz com eles sigam raciocinando mais e errando menos. Por outro lado, os mais emotivos “tiltam” com muita facilidade e, dependendo do “despreparo” emocional, em certos momentos, jogadores que atuam no estágio três em boa parte do seu jogo voltam até o um, e jogam movidos simplesmente pela raiva do momento.
 
O recado que quero deixar aqui é: tenha como meta trabalhar sua leitura, para que um dia possa jogar apenas com base nela. Grandes jogadores passam a sensação de que estão vendo nossas cartas e, no fundo, estão mesmo.




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