EDIÇÃO 48 » MISCELÂNEA

Nunca tantos foram derrotados por tão poucos

Akkari e seus bravíssimos 76 torcedores fizeram história em Vegas ao trazer, para o Brasil, o ouro americano da WSOP


Pedro Nogueira

E, súbito, percebo o óbvio: entre todos os atletas do Brasil, não há nenhuma espécie mais patriota do que o jogador de poker. Estas figuras – as que habitam o pano verde – ultrapassam os outros esportistas do país numa dimensão tão extraordinária que é quase uma covardia compará-los.

Pode parecer exagero. Imagino, aliás, que um ou outro leitor há de discordar. Mas desafio alguém a encontrar, no esporte, uma demonstração de amor à pátria semelhante àquela que se viu nos salões do Rio All Suite Hotel and Casino, em Las Vegas, no dia 29 de junho. Mais especificamente, na final do Evento 43 da World Series of Poker, em que o jogador André Akkari buscou um épico bracelete de ouro.

Há exatamente um ano, eu escrevia aqui nesta CardPlayer Brasil que o título de Alexandre Gomes na WSOP de 2008 fora digno de uma página da Odisséia. E lamentei, no texto, que Homero não estivesse vivo para narrar a vitória do curitibano.

Pois, hoje, sinto-me tão órfão do poeta grego quanto me senti à época. A crônica do bracelete de Akkari, assim como a de Alê Gomes, deveria ter sido escrita por Homero. Ele – e somente ele – poderia dar às vitórias de nossos heróis o justo tom lírico que elas mereciam.

Se o leitor por acaso não assistiu à final de Akkari, tomarei a liberdade de explicar a situação. Numa WSOP em que países da Europa e da América do Norte monopolizavam todos os braceletes (sem exceção), Akkari furou um gigantesco bloqueio de 2.856 adversários para cravar o Evento 43. Exatamente, amigos: nosso atleta teve de derrotar essa feroz multidão para lembrar ao mundo do poker que, sim, aqui no sul também jogamos cartas.

Assim como Alê Gomes fez em 2008, Akkari redimiu sozinho todo um hemisfério, marcado por séculos de dominação, ao derrubar em Las Vegas a potência bélica americana e europeia. Eu disse “sozinho” e já retifico: ele não estava sozinho. Ao seu lado havia uma torcida de 76 bravíssimos brasileiros. Um número de grandeza modesta, talvez, ainda mais se comparado aos 300 milhões de americanos que ansiavam por um novo bracelete. Mas nunca tantos foram derrotados por tão poucos.

Aquele exército de 76 brasileiros, que na arquibancada do Rio All Suite Hotel and Casino vibrava dramaticamente a cada lance de Akkari, botou uma banca nos americanos que nunca se viu igual. Nos 235 anos de história dos Estados Unidos, jamais um grupo estrangeiro foi tão absoluto e gigante dentro da terra deles.

Como num Maracanã lotado, os 76 faziam um barulho sem precedentes desde o surgimento de Las Vegas. E, ali na mesa, Akkari golpeava um por um os inimigos. Até que, finalmente, chegou ao duelo final contra Nachman Berlin, um atleta da casa. Mesmo com uma desvantagem de 1 para 3 – para cada ficha que Akkari tinha, Berlin possuía o triplo –, nosso herói se lançou ao pescoço do americano. E, num dos massacres mais brutais já vistos na WSOP, o brasileiro triunfou.

No momento seguinte, ocorreu uma cena que deixaria até mesmo um paralelepípedo arrepiado e com lágrima nos olhos: abraçado a uma bandeira do Brasil, Akkari puxou o ouro americano enquanto os 76 entoavam o hino nacional. Em plena Las Vegas, em pleno Estados Unidos, em plena Word Series of Poker.

Sim, amigos: nunca tantos foram derrotados por tão poucos.




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