EDIÇÃO 31 » COLUNA NACIONAL

Não vem que não tem

Recapitulando a Ação à Procura de Blefes


Raul Oliveira

Continuando com o formato que pretendo dar aos meus artigos em 2010, apresento duas mãos interessantes que joguei durante heads-ups sit-and-go. Na primeira, o fato interessante é como, alterando um pouco o seu padrão de jogo, pode-se criar uma oportunidade de ganhar fichas. Na segunda, demonstro uma mão clássica em que joguei apenas o jogador e desconsiderei as minhas cartas.

MÃO 1

Nesse instante, eu estava com 1.855 fichas contra 1.145 do meu adversário e, no button, recebi 6-4 off. Como eu vinha dando raise puro em quase 100% das mãos, nessa em particular eu apenas entrei de limp. Não havia um motivo específico para isso, eu quis apenas quebrar um padrão e, claro, possibilitar um limp mais tarde com um jogo de verdade. Agora, como eu não havia dado nenhum limp até o momento, meu adversário deu apenas check sem forçar a mão.

O flop trouxe AA2, e agora sim veio o teste: ele saiu disparando 80 e, sinceramente, essa aposta não fez muito sentido para mim. Afinal, com o ás, ele quase certamente teria dado raise para me testar pré-flop; nesse caso, apenas o 2 justificaria essa bet. Mas, como eu também não acreditei nessa hipótese, resolvi pagar e ver o que acontecia em seguida. Bateu o 5 no turn e mais uma vez ele disparou 80. Nesse momento eu tinha quase 100% de certeza de que ele estava blefando, porque tudo indicava que o ás ele não tinha e, na hipótese de uma mão mais fraca com valor, era quase certo que ele aplicaria um check-call no turn. Porém, como minha mão também não tinha nenhum valor de showdown, resolvi tentar encerrar a questão ali mesmo e dei raise para 210. Ele então deu call, o que sinceramente eu não esperava. No river veio o 9, sem grandes efeitos sobre a mão. Meu adversário deu check e eu parei para pensar. O que ele poderia estar segurando para ter jogado dessa forma tão rapidamente? Duas mãos vêm à minha cabeça: na primeira, ele com um 2 na mão tendo jogado de forma meio estranha; e, na segunda, ele tendo blefado no flop e ficado com uma queda para a gaveta no river, tipo com Q3, K4 etc. Ou seja, em ambos os casos ele estava bem fraco na mão e uma boa aposta me daria as 740 fichas do pote.

Nessa hora, ele tinha 775 restantes e os blinds estavam em 40-80, então eu resolvi apostar quase todas as fichas dele: coloquei 580, praticamente seu all-in. Foi aí que eu imaginei que ele havia me colocado em uma trinca de ás ou mesmo em um J-J ou um K-K que se sentiu bem na mão. No final das contas ele deu fold – quis levar no blefe: nem vem que não tem!

MÃO 2

Nessa, eu estava jogando contra o famoso lunático. Eu já tinha jogado uma vez antes com ele, e seu padrão era insano, com overbets, raises violentos e por aí vai. No BB eu recebi A5, com os blinds em 15-30. Como era de costume, ele abriu raise de 120 (muito questionável num heads-up desse tipo, mas tudo bem).

Sabendo quão insano ele era, e para não dar margem a um all-in, eu apenas paguei. Se eu tivesse voltado reraise, possivelmente precisaria pagar esse all-in e decidir o torneio com um A-5 off: melhor esperar por uma situação mais favorável. O flop veio J7J e, apesar de não ter acertado nada, não me senti tão mal e dei check-call na bet de 120 dele. No turn, uma boa carta para mim, outro J. Mais uma vez, dei check-call na aposta dele, dessa vez de 240. No river bateu o 3 e, novamente, abri check; ele, sem hesitar, voltou a casa (como de praxe). Aí parei para pensar...

Decidi refletir sobre a ação porque, apesar do estilo lunático, ele faria essa jogada com qualquer mão boa ou blefando. E quando digo qualquer mão boa, me refiro a 22+, 7-X ou ainda um valete louco na mão dele. O que eu não consegui visualizar foi ele fazendo isso com uma mão com ás, pois, apesar de sua aparente insanidade, um check no river seria o mais provável depois do meu duplo call. Então, das duas uma: ou eu veria um full house ou um blefe total. Assim, depois de rapidamente recapitular todas as mãos que tinha visto até ali, decidi pagar e vi que a opção 2 era a correta: ele abriu um lindo 8-4 off. Como eu disse: nem vem que não tem!

O interessante dessas mãos é o exercício que devemos fazer para se chegar a uma conclusão. Dessa equação fazem parte elementos como o bordo, suas cartas, o valor das bets, o tamanho dos stacks e, sempre, a principal e mais importante variável: seu adversário. Pense nisso.




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