EDIÇÃO 3 » ESPECIAIS

Jogando na Estratosfera

Quarta Temporada do High Stakes Poker Terá Mais de $5 Milhões na Mesa


Bob Pajich

Era cedo para os jogadores de poker no South Point Casino em Las Vegas, mas não para os seguranças, que pareciam estar há 300 semanas de 40 horas consecutivas protegendo os interesses dos convidados e do patrão. Nessa manhã de maio, um após o outro, os seguranças, em seus uniformes pretos, pegaram a escada rolante e entraram em uma sala onde o último local de filmagem do High Stakes Poker era montado. Eles carregavam caixas plásticas cheias de maços de dinheiro e fichas de cassino que totalizavam pelo menos $500.000 cada. As caixas seriam colocadas em uma mesa vigiada por câmeras que estavam em toda parte.

Por trás desse cenário, Patrik Antonius, David Benyamine, Doyle Brunson, Antonio Esfandiari, Sammy Frha, Jamie Gold, Barry Greenstein, o criador do Cirque du Soleil, Guy Laliberte, e Daniel Negreanu tomavam seus lugares em frente a um maquiador para serem preparados para um dos melhores programas de poker da televisão.

O High Stakes Poker, cuja quarta temporada começou a ser exibida dia 27 de agosto no GSN, é o único programa que tenta levar os mais caros cash games àqueles que suam ao ver um reraise de $120.

Assistir a jogadores de poker sentarem com maços de dinheiro e, de vez em quando, apostarem uma pequena fortuna que pode virar pó depois que o dealer vira uma carta é mais ou menos como assistir a atuação de trapezistas diante uma platéia ofegante. Em suas próprias estratosferas, os truques desses artistas das cartas divertem os jogadores casuais e fazem aqueles que não têm um centavo no bolso balançar a cabeça, reprovando o espetáculo.

Nas últimas três temporadas, o High Stakes Poker mostrou um estilo de jogo inteligente e alucinado que acabou encontrando fiéis seguidores para sintonizar o canal nas noites de segunda-feira.

E quando um dos astros joga uma mão de forma perfeita, manipulando a mente do adversário para que ele pense estar enfrentando a melhor mão, quando na verdade não está, e dando um nó de escoteiro na massa cinzenta do oponente, os fãs querem ficar e aplaudir. Vemos Freddy Deeb pagar $50.000 o blefe de Daniel Negreanu com um second pair e um kicker fraco. Assistimos Eli Elezra apostar alto com 6 2 depois de acertar um par com seu dois e fazer Erick Lindgren desistir de sua queda para flush. Observamos Brad Booth empurar all-in contra Phil Ivey apenas com 4 como carta mais alta (“seus reis eram bons, Phil”). Às vezes parece mágica, mas é ainda melhor, porque sabemos que não existem fundos falsos, e quando o stack de alguém é serrado ao meio, machuca.
Encrenca em River City

DEMONSTRAÇÃO A: Em todo lugar que Daniel Negreanu vai, as pessoas querem saber como foi tomar um “chega pra lá” de Gus Hansen em rede nacional, num pote que lhe custou $287.000. Essa mão, que aconteceu na segunda temporada, mostrou como o poker pode ser brutal, e também belo. Veja o que aconteceu:

Com um par de cincos, Hansen apostou $2.100 em um pote de $1.700. Com 6-6, Negreanu colocou mais $2.900. Hansen pagou na mesma hora. O flop veio 9 6 5, e parecia que Hansen estava prestes a ser atropelado por Negreanu. O dinamarquês pediu mesa e Negreanu disparou uma aposta de $8.000 com a maior facilidade. Hansen esfregou suas têmporas, contou as fichas e aumentou para $26.000. Negreanu esperou alguns segundos antes de descruzar os braços e colocar no pote um maço de dinheiro que caiu suavemente na mesa. Agora a disputa era por $63.700.

No turn veio o 5 que faltava. Negreanu, um dos jogadores mais simpáticos do mundo, apenas colocou a mão fechada no rosto. Isso fez com que Gabe Kaplan, jogador veterano e apresentador no High Stakes Poker, exclamasse: “Nossa, Gus fez um four! Em River City, é encrenca para Daniel Negreanu.”
Hansen apostou $24.000. Negreanu depois disse que pensou estar bem naquela hora, mas queria que Hansen achasse que ele tinha um par alto, então se contorceu e fez um teatro pouco antes de pagar a aposta. O pote estava agora em $111.700. Faltando somente uma carta para ser aberta, Negreanu passou de favorito com 94% a azarão.

O 8 no river só complicou as coisas para Negreanu. O bordo agora mostrava 96558, com quatro cartas para um straight, que ambos gostavam tanto. Sendo o primeiro a falar, Hansen concedeu o controle do pote ao pedir mesa diante do agressivo Negreanu. Durante a mão, vimos Negreanu ir de herói a esmagado em menos de um segundo e, a esse ponto, ele ainda não sabia disso. As micro-câmeras das cartas permitiam que os telespectadores previssem o futuro, e eles assistiam, como se o mundo estivesse em câmera lenta, Negreanu beijar a lona.

Insano.

Negreanu lentamente pegou o dinheiro e as fichas, juntou $65.000, e vagarosamente os colocou no pote. Hansen apoiou a cabeça entre mãos e, sem nenhuma emoção, disse: “Vou de all-in”, com mais $167.000. Negreanu então parou e deslizou as mãos nos bolsos de sua calça cáqui. Alguém – deve ter sido ele próprio – soltou um palavrão, mas só se ouviu o “bip” característico. Isso aumentou a tensão ainda mais. A única coisa que faltava era uma lanterna vermelha.

O pote agora tinha $408.700. Negreanu então se sentou, riu e disse: “É melhor eu ter alguma coisa se eu for pagar, certo?” Acontece que ele tinha. Ele sorriu enquanto contava os $167.000 e as fichas amarelas de novo e de novo. Então ele se levantou, ficou sério, e disse: “167, certo?” E em um único movimento com as duas mãos colocou as fichas no pote.

“Nossa, isso é loucura”, disse ele, ao ver o dealer empurrar $575.700 para Hansen.

Esse clipe de sete minutos e meio foi postado no YouTube por mais de dez usuários e visto mais de 1,6 milhão de vezes. Milhares de horas são desperdiçadas por pessoas que diminuem a velocidade na estrada só para espiar um acidente de trânsito, provando que o ser humano gosta de presenciar a desgraça alheia. Qualquer homem que alguma vez na vida caiu numa armadilha como essa e perdeu algumas centenas de dólares encontra consolo no sofrimento de Negreanu. Ele pensa “Não sou o único. Sim, Daniel é insano – doido de jogar pedra.”

Apesar de perder tanto dinheiro em uma única mão que será comentada pelo resto da carreira de Negreanu no poker, ele a encara da seguinte maneira: “Eu não me importei muito”. Negreanu não teve muita sorte no High Stakes Poker, e aponta que só conseguiu se dar bem em uma temporada, dentre quatro.

“Se você olhar para a minha carreira no High Stakes Poker até agora, perceberá que foi um fenômeno bizarro onde, sem dúvidas, tomei as mais horrendas pancadas em várias situações”, ele afirmou. “Digamos que nada me surpreende mais.”

Aquela mão mostrou ao mundo por que Negreanu acha que o High Stakes Poker mostra como o jogo poder ser belo.

“Está bem claro que qualquer jogador de poker que tenha real interesse pelo jogo achará o High Stakes Poker o programa de poker número um da televisão. Ponto final”, diz Negreanu. “Para mim, é um bom programa e me divirto assistindo. Na verdade, é o programa que mostro quando estou ensinando alguém a jogar.”

Quanto a essa mão em particular, ela define o motivo de o High Stakes Poker ser o programa escolhido por Negreanu.

“Havia tanta coisa acontecendo, além do fato de aquilo ser somente um monte de cartas. Houve tantas jogadas traiçoeiras naquela mão que fez dela um momento que eu realmente gosto de recordar. O interessante é que Gus maximizou a própria mão ao ler a minha de forma completamente equivocada.”
E então ele riu, só um pouco, como se dissesse “Isso é poker, baby.”

Talvez o maior ingrediente para o sucesso do programa, até mesmo mais do que a quantidade de dinheiro arriscada em cada mão, sejam os participantes em si. Os produtores de HIgh Stakes Poker trabalham duro para reunir um grupo de jogadores que interajam, joguem mãos de forma não-convencional, “assoviem e chupem cana ao mesmo tempo”, enfim, sejam artistas do jogo. É uma forma de arte montar uma bela partida, e essa tarefa é função de um jogador veterano chamado Mori Eskandani.

O Casamenteiro

A equipe de produção do High Stakes Poker é lidereada por três homens: Eskandani, Henry Orenstein e Eric Drache. Orenstein é o homem que inventou e centralizou programas ao redor das câmeras de cartas, o que mudou o poker na TV – e conseqüentemente o jogo em si – para sempre. Drache e Eskandani são os homens por trás do POKER-PRO-ductions, uma empresa de consultoria em programas de poker que é responsável pela estrutura de muitos dos programas de poker na TV, incluindo o Poker Superstars Invitational, o NBC National Heads-Up Poker Championship, e o Poker After Dark.

Eskandani é um conhecedor do poker que ama o jogo e se orgulha de realizar um trabalho fantástico nessa produção de poker na TV, apesar de ter sido apresentado ao jogo há pouco tempo, por seu amigo Orenstein.

High Stakes Poker aconteceu quase por acaso. Depois de fechar uma produção de um programa de poker de efeito para a GSN alguns anos atrás, Eskandani estava jantando com vários executivos da GSN no Bellagio quando Johnny Chan chegou e contou a eles uma história de perder um pote de $750.000 para Phil Ivey. Alguns dias depois, Eskandani recebeu uma ligação de um executivo da GSN, perguntando se ele conseguiria produzir um programa que mostrasse potes daquele tamanho. Ele explicou que potes como aquele não acontecem todos os dias, mas que eles conseguiriam montar uma mesa de cash game que mostrasse os melhores jogadores utilizando o próprio dinheiro. Ele recebeu autorização para ir adiante e produzir uma temporada. O resto, como Eskandani diz, é história.
Conseguir os jogadores para participar foi fácil, disse ele, que assumiu o papel de agente de elenco e guru de poker com facilidade.

“Todos viram os méritos do poker de verdade aparecendo na televisão”, afirmou. “É fácil ser um agente de elenco, já que joguei contra esses caras a minha vida inteira.”

Em sua maior parte, os jogadores escolhidos são capazes de jogar com quaisquer cartas, conseguem variar seu jogo, e não ficam sentados durante horas só esperando um mágico par de ases que aparece a cada 220 mãos. Eles são jogadores de ação, que gostam de apostar. São essas pessoas que os fãs gostam de ver.

“Nossa idéia é realmente procurar por profissionais que se encaixem nesse estilo”, disse Eskandani.

Também ajuda quando os jogadores se conhecem, que é o caso dos jogadores que estão no High Stakes Poker desde a primeira temporada. A fórmula é simples.

“Nós tentamos misturar e colocar pessoas que estão familiarizadas umas com as outras, que jogam poker de ação, e que tenham personalidades que são apresentáveis na TV. Se você fizer isso, não deverá ter problemas em produzir bons resultados.”

Todos os dias jogadores procuram Eskandani e perguntam se eles podem participar do programa; tantos, na verdade, que os produtores estão discutindo se devem ou não aumentar o buy-in para $100.000.
“Há uma boa chance de aumentar”, afirma Eskandani.

A mesa especial de $500.000 que será apresentada nesta temporada não foi nem um pouco difícil de ser organizada, diz Eskandani. Ele simplesmente entrou no Bobby’s Room, lançou a idéia para alguns profissionais presentes, e, antes que percebesse, tinha oito lugares preenchidos, com mais quatro rodeando o estúdio do South Point esperando para entrar. Eles não conseguiram.

Os fãs do High Stakes Poker sabem que os participantes mais importantes do programa são aqueles que não jogam profissionalmente, mas têm o dinheiro necessário para sentar e jogar com os melhores. Esses amadores põem pimenta no programa, o que evita que ele se torne somente uma exibição de poker high-stakes. Esses caras têm mais dinheiro para perder que qualquer outro. É como uma ilha da fantasia para eles, e isso mantém o programa e o partida interessantes de se assistir.

Eskandani escuta falar desses jogadores o tempo todo. Recebe emails deles. Quando fica sabendo de um amador rico que pode ser bom para o programa, joga com ele. Não leva muito tempo para saber se será capaz de enfrentar os “tubarões” sob tantos holofotes.

“É o seguinte: os profissionais não jogam cash games para melhorar suas habilidades. Mas sim para arrancar o dinheiro dos menos habilidosos. Já os amadores jogam para enfrentar os melhores profissionais”, descarrega Eskandani. “As fichas deles são apenas brinquedos.”

Milhões Não Significam Nada
Jamie Gold, campeão do Main Event do WSOP 2006, e Brian Brandon, têm duas coisas em comum. Os dois são desafiados a jogar com os melhores dos melhores em um programa que ambos conhecem e amam. Gold não precisa de apresentação, somente um adjetivo. Apesar de ser o campeão do maior torneio de poker live da história, ele acredita que ainda está começando a desvendar o jogo, e está espantado com os jogadores que conseguiu combater no High Stakes Poker. Ele está vivendo um sonho de fã.

“Eu definitivamente comecei como fã. Tem somente um ano desde que eu joguei no World Series. Antes disso, eu era um grande fã. Assistia a todos os episódios de High Stakes Poker. Eu nunca sonhei em estar no programa; nunca imaginei que teria oportunidade de jogar nesse nível.”

Além do Main Event, ele jogou o $20-$40 no limit hold’em no Commerce Casino, uma disputa em que os stacks dos jogadores variam entre $5.000 e $20.000. Gold costumava sentar com cerca de $5.000 que ele ganhava em torneios, bem diferente do buy-in mínimo de $10.000 do High Stakes Poker. Ele disse que era um jogador mediano de cash games naquela época.

A partida de $500.000 era algo completamente diferente para Gold. Era, de longe, a maior quantia que ele já havia colocado em jogo.

“Eu nunca vou entrar numa partida se eu tiver medo de perder aquela quantia. Você deve saber o que fazer se perder todo aquele dinheiro.”

Mas Gold teve sorte um dia antes de o maior jogo da história do High Stakes Poker acontecer. Ele teve uma grande sessão e construiu um bankroll para entrar na partida. E fez isso.

“Eu não teria participado daquele jogo com meu próprio dinheiro. Se não tivesse me saído tão bem no dia anterior, não teria sido tão corajoso”, disse Gold.

As pessoas terão que ficar ligadas para ver como Gold se saiu na partida com buy-in de $500.000.
Brandon, por outro lado, ganhou e perdeu milhões de dólares em um único dia, mas não na mesa de poker. Já que passou anos na bolsa de valores, vivenciou altos e baixos capazes de colocar a maioria dos jogadores de poker na cama por uma semana ao lado de uma garrafa de Jack Daniel’s. O dinheiro não o intimida.

“Sou uma dessas pessoas que grava todos os episódios e assiste duas ou três vezes. É poker de verdade. O dinheiro de verdade muda tudo”, diz Brandon. “Por alguma razão, há uma pureza naquilo, e lá é onde eu queria jogar.”

Brandon se encaixa no modelo de Eskandani do perfeito amador rico. Ele leva o jogo muito a sério, tem muito dinheiro para queimar, é bastante competitivo, e é um tipo esportista, caçador de emoções que está disposto a disparar contra Phil Hellmuth com um reraise de $65.000.

O amador de 37 anos já jogou no limit hold’em em mesas de $100-$200 no Venetian, e também em high stakes de Miami e Chicago. Ele enfrentou a maioria dos rostos que apareceram em torneios do High Stakes Poker, que ele admite não jogar muito.

“Preferia entrar lá e jogar algumas centenas na mesa e falar, ‘Hey, vamos jogar’”, afirmou.

Foi o que ele fez, e parece que incomodou um dos profissionais. O que aconteceu entre Brandon e Hellmuth. Ao que parece, houve uma discussão entre os dois durante um intervalo de um episódio que logo será transmitido. Brandon disse que Hellmuth foi tirar satisfações com ele, que decidiu marcar Hellmuth na mesa.

Brandon deu uma boa dica, e vimos o que aconteceu em seguida... “Estamos de volta, High Stakes Poker. O melhor é você.”




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