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Jason Mercier: Um jogador americano na Europa

Graças ao European Poker Tour, que permite a participação de jogadores com pelo menos 18 anos, os campeões do poker vão ficando cada vez mais jovens. Com a sexta temporada da turnê patrocinada pelo PokerStars já em andamento, jogadores de todo o mundo estão em ação, prontos para seguir os passos de Michael McDonald, Sebastian Ruthenberg, Bertrand Grospellier e Jason Mercier. Graças ao European Poker Tour, que permite a participação de jogadores com pelo menos 18 anos, os campeões do poker vão ficando cada vez mais jovens.


Julio Rodriguez

Com a sexta temporada da turnê patrocinada pelo PokerStars já em andamento, jogadores de todo o mundo estão em ação, prontos para seguir os passos de Michael McDonald, Sebastian Ruthenberg, Bertrand Grospellier e Jason Mercier.

Todo esse sucesso geralmente chama muita atenção, mas o jovem de 22 anos não deixou a fama subir à cabeça – nem perto disso.

Muitos jogadores do circuito de torneios o vêem como um enigma, um sujeito recluso, de pouca conversa, e que prefere deixar seus resultados – mais de $3.3 milhões ganhos em torneios – falarem por si.

Ele insiste que não é bem assim, que na verdade tem uma personalidade extrovertida e simpática. “Não sei por que as pessoas pensariam isso”, disse ele, pouco depois de ter sido eliminado do Main Event da WSOP. “Certo, eu não me abro muito na mesa, mas esse é meu escritório. É trabalho. Fora da poker room, você não consegue me fazer calar a boca”.

De fato, aqueles que o conhecem atestam que o divertido Mercier tem tido muito sucesso para conquistar seu lugar no mundo do poker. Graças a uma formação positivamente competitiva, ele pode até ser o jovem embaixador do futuro do poker.

NO COMEÇO…
Embora não tivesse como você saber disso com base em sua lista de feitos, Mercier não nasceu nem perto da Europa. Na verdade, ele nasceu e se criou na Flórida, e sua família se estabeleceu nos arredores de Fort Lauderdale.

Caçula de quarto filhos, ele passou a infância competindo com os dois irmãos mais velhos, e rapidamente aprendeu que tinha sua própria força. “Definitivamente, eu era competitivo com meus irmãos. Todos nós praticávamos esportes quando éramos crianças, mas eu jogava três – beisebol, basquete e futebol – o ano inteiro”.

Mesmo sua irresistível modéstia não conseguiu impedir que Mercier falasse mais a respeito de suas habilidades na quadra de beisebol. “É, eu era muito bom. Quer dizer, não era nenhuma superestrela, mas poderia ter jogado na faculdade em algum lugar da Bible Belt, ou algo assim”.

Ao invés disso, ele seguiu sua namorada na época para Boca Raton, para estudar na Florida Atlantic University.

UM FRUTO DA ÁRVORE DO CONHECIMENTO
Embora estivesse lá com uma bolsa de estudos, não levou muito tempo até que Mercier entendesse que a faculdade, principalmente tão longe de casa, não era para ele. Depois de descobrir o poker online, seus relacionamentos e sua vida acadêmica sofreram. “Eu vivia em dormitórios e uns conhecidos me introduziram ao poker, e eu rapidamente fiquei obcecado. Passei meu primeiro ano só jogando, e perdi minha bolsa de estudos. Naquele ponto, tive que voltar a morar com meus pais, e comecei a fazer aulas em uma faculdade pública”.

A vida havia claramente ocupado uma posição inferior em relação ao poker, mas Mercier rapidamente consertou suas prioridades. “Quando comecei, passava umas 60 horas por semana jogando. Eu ganhava pouco, mas estava obviamente viciado. Eu sentia que tinha que jogar, e deixava esse sentimento me dominar. Então, depois que tudo entrou em colapso, decidi parar por dois meses, para reavaliar e colocar alguns limites”, afirmou.

“Enquanto estava em casa, me tornei técnico de futebol e beisebol para crianças do primário, e passei um tempo trabalhando como professor substituto. Comecei a gostar disso, e até me imaginei transformando isso em uma carreira. Realmente pensei em ensinar matemática para colegial”. Mercier sempre foi bom em matemática, passando pela escola sem muito esforço. “Era algo no qual eu sempre havia sido bom. Tudo até cálculo era bem fácil para mim, e eu considerei seriamente ter isso como plano B durante minha pausa de dois meses do poker”.

Mas o chamado das cartas continuou, e Mercier rapidamente descobriu que a nova perspectiva e o tempo extra que tinha em mãos eram tudo que precisava para virar o jogo no poker.

ELE TRABALHA DURO PELO DINHEIRO
Com a mente clara e um novo foco, Mercier estava determinado a conseguir o que poucos haviam feito: se tornar um Supernova Elite do PokerStars. “Consegui me tornar Supernova Elite em 2007, jogando por volta de 2 milhões de mãos no $1-$2 full-ring no-limit hold’em. Estava jogando aproximadamente 50 horas por semana, 12 mesas ao mesmo tempo”. Para colocar esses números em perspectiva, de acordo com as estimativas, Mercier estava jogando mais de 700 mãos por hora durante esse período.

“Naquele ano fomos 39, e eu fui a 16ª pessoa a conseguir o Supernova Elite, no dia 20 de Dezembro. Então, todos os que conquistaram isso depois de mim o fizeram nos últimos dez dias. Foi muito difícil de conseguir na época, devido à restrição de limite de mesas que existia”.

Mercier elaborou, dizendo que o limite de 12 mesas por jogador tornou o feito mais complicado, e que agora é “muito mais fácil”, já que o PokerStars permite que os jogadores participem de 24 mesas ao mesmo tempo.

LARGANDO O MOUSE
Os benefícios de ser um Supernova Elite são muitos, e incluem aparelhos eletrônicos, carros e, sim, buy-ins de torneios. Ávido para jogar seu primeiro grande evento live, Mercier trocou alguns pontos por uma viagem para as Bahamas, para o Caribbean Adventure do PokerStars. Embora o tempo que ele tenha passado no feltro tenha sido curto, ele ganhou uma confiança que o acompanhou no próximo evento – o qual mudaria sua vida para sempre.

De maneira inacreditável, a viagem quase não aconteceu. “Eu já tinha minha vaga para Monte Carlo e percebi que o San Remo estava marcado para uma semana antes. Decidi transformar minha viagem em um grande passeio pela Europa, e ganhei meu assento. Meu colega de quarto deveria ter ido comigo, mas ele desistiu de última hora, depois de uma má fase. Eu não sabia bem o que fazer, e cogitei vender minha vaga, mas contatei alguns jogadores que estavam indo para lá e decidi viajar no último minuto”. O resto é história. Mercier dominou o field em direção à vitória e $1.364.330.

SALVO PELO RIVER
Quando lhe perguntam sobre seu acidental encontro com o destino, Mercier está mais do que disposto a admitir que simplesmente estava no lugar certo na hora certa. “Minha vida teria sido completamente diferente. Acredito que isso tenha a ver com um poder maior. Sei que tomei decisões certas e acabei me dando bem, mas acredito que Deus tenha tido algo a ver com minha presença na Itália e minha vitória no torneio”.

Mercier se considera cristão, mas não de forma restrita, e entende como é visto aos olhos da congregação. “Tento ir [à igreja] quando estou em casa, mas não sou o garoto propaganda do típico cristão. Muitos sabem o eu faço e alguns ficam impressionados, mas certamente há aqueles que acham que poker profissional, ou qualquer tipo de jogo, não tem lugar em uma igreja. É algo sobre o que pensei muito, mas estou feliz com as escolhas que fiz em minha vida, e contanto que eu esteja no controle, posso manter meu próprio código de ética e meus valores.”

Quando perguntando se ele se sente culpado por levar o dinheiro de jogadores que têm menos sorte, ele deixou claro que a religião não tem lugar nas mesas, e concorda que um tolo e seu dinheiro se separam rapidamente. “Pensei, se não for eu a levar o dinheiro deles, outra pessoa o fará. Não é meu trabalho determinar quem pode ou não pode perder. Pelo menos se eu tiver o dinheiro, posso fazer algo de produtivo com ele”.

Ele não está brincando. Ele não gastou indiscriminadamente desde que se deu bem. Depois de seu primeiro grande ganho, ele simplesmente ajudou seus pais e doou uma quantia razoável para sua igreja. 

E OS ÊXITOS CONTINUAM
Depois de uma decepcionante World Series em 2008, Mercier voltou à Europa, dessa vez a caminho de Barcelona. Novamente, ele fez o mundo do poker notá-lo, chegando à mesa final e ficando em sexto lugar, faturando $321.198.

Descontente com tudo que não fosse perfeição, ele foi para Londres, para o EPT high-roller event. Todos estavam de olho em John Juanda, que havia acabado de levar o Main Event da WSOP Europe e buscava vitórias consecutivas. Em vez disso, Juanda teve que se contentar com o segundo lugar, já que Mercier havia batalhado firmemente para conquistar seu segundo título do EPT e embolsar mais $905.141.

De volta aos Estados Unidos, Mercier continuou com uma série de vitórias que durou cinco meses, ganhando quarto torneios antes de fechar a ação com um bracelete da WSOP, em pot-limit Omaha.

JÁ ERA HORA!
Com tanto sucesso no EPT, era apenas uma questão de tempo até que o PokerStars trouxesse Mercier para seu time de profissionais. Depois de ganhar seu primeiro bracelete, ele não podia mais ser ignorado, e o PokerStars lhe ofereceu um lucrativo acordo de patrocínio.

“Me tornar um membro do Team PokerStars significa muito para mim. Estou muito animado para trabalhar para o site onde comecei a jogar. Acho que isso solidifica meu lugar como um dos melhores jogadores do circuito”. Depois de passar a maior parte dos dois últimos anos viajando pelo mundo, Mercier está ansioso para descansar em casa e voltar para suas raízes no online. “Como parte de minhas obrigações com o site, preciso jogar um determinado número de horas. Essa é uma grande oportunidade para jogar um grande volume de mãos e voltar para o grind”.

Com uma boa cabeça sobre os ombros e um dos maiores sites de poker do mundo o apoiando, talvez seja agora que a voz de Mercier vá realmente ser ouvida, como emissário do jogo e inflexível prova de que há caras legais no poker, afinal das contas.

Os números de Mercier
Em apenas 18 meses no circuito de torneios, Jason Mercier tem números que deixam quase todos com inveja. Confira alguns de seus maiores resultados:


Ganhando o Ouro na World Series of Poker – Mercier Conquista Bracelete em sua Melhor Modalidade
Com todo seu sucesso na Europa, não é nenhuma surpresa que a melhor modalidade de Jason Mercier seja a queridinha da Europa: pot-limit Omaha. Depois de alguns resultados bastante expressivos em torneios de Omaha na WSOP, bem como algumas vitórias em eventos preliminaries, Mercier conseguiu o primeiro bracelete de sua carreira na variante que tanto adora, e o fez de forma dominante.

O evento atraiu 809 jogadores loucos pela ação, todos buscando aumentar cedo seu stack, que começava com 4.500 fichas. Mercier arrasou a concorrência, terminando o primeiro dia com 227.000 fichas, mais de 88.000 acima do segundo colocado.

Ele passou facilmente pelo dia dois, e finalmente encontrou um oponente à altura perto da mesa final. Depois de uma dura batalha, ele derrotou a superestrela online Steven “PiKappRaider” Burkholder para levar o título.

Aqui, Mercier conta com detalhes suas bases na modalidade, e fala sobre o jogo na bolha, que lhe deu uma enorme liderança em fichas.

Julio Rodriguez: Quando você começou com pot-limit Omaha?

Jason Mercier:
Comecei a jogar um pouco de pot-limit Omaha em 2006, mas praticamente tive que parar quando estava tentando conquistar o Supernova Elite. Em 2008, decidi que, em vez de tentar de novo, eu iria mudar de limites e misturar um pouco as variantes. Quando você tem milhões de dólares, é difícil manter o foco em no-limit hold’em de $5-$10. Mas quando está aprendendo uma nova modalidade e tentando melhorar, é muito mais fácil levá-la a sério.

JR: O que fez você se interessar pelo Omaha?

JM:
Para ser sincero, acho que a modalidade é bem mais divertida. Consigo jogar muito mais mãos e tenho mais facilidade com Omaha. Nunca li um livro de poker. Na verdade, ler um livro de Omaha parece ser a pior coisa que um jogador pode fazer (risos). Praticamente não há bons livros de Omaha, pelo menos não que eu tenha visto, então estou aprendendo por tentativa e erro. Só fui em seguindo frente, e as coisas começaram a entrar na minha cabeça.

JR: Você não recebeu nenhuma ajuda? Nem mesmo dos números por trás do jogo?

JM:
Novamente, aprendi a matemática sozinho, mas logo notei que é muito mais complexa que a do no-limit hold’em. Sei que parece que estou fazendo propaganda, mas a única ajuda que recebi foi da calculadora de odds de Omaha da CardPlayer.com. Eu jogava uma sessão, e se em algum ponto tivesse dúvida a respeito da equidade, só digitava os números para ter certeza que estava tomando a decisão correta. Por causa da natureza do jogo, é essencial que você saiba a matemática de trás pra frente antes de começar a jogar de forma séria. O resto vem com a experiência.

JR: Com todo o seu sucesso no hold’em, pode parecer chocante para alguns saber que essa não é sua melhor modalidade. Como você classifica suas habilidades em Omaha?

JM:
Omaha é meu melhor jogo, e eu acho que posso dizer que, quando o assunto é torneio, estou tão bem quanto qualquer um no mundo. Não vou dizer que sou um grande vencedor de cash games de $200-$400, mas tenho confiança em minhas habilidades em torneios. Eles têm definitivamente uma dinâmica diferente, por causa dos stacks baixos. Jogar com 20 big blinds é diferente de jogar com 100 big blinds.

 JR: Você conseguiu as circunstâncias perfeitas nesse torneio. Você tinha o dobro de fichas do segundo colocado, tinha posição sobre ele, e todos estavam com medo que você os eliminasse, principalmente na bolha. Qual é sua opinião sobre os competidores?

JM:
Era um field bem tranquilo. Tive algumas mesas difíceis, mas deu sorte de entrar em boas mesas no começo, principalmente na bolha. Há caras demais que não gostam de jogar muitas mãos, e, mais importante, não queriam arriscar jogar contra mim, então acabei conseguindo uma liderança enorme no field sem correr muitos riscos. Isso praticamente me deixou atropelar os outros jogadores.

JR: Aproximadamente uma hora antes de os jogadores chegarem à zona de premiação, Amnon Filipi veio para a sua mesa e sentou-se à sua esquerda, ameaçando arruinar sua grande oportunidade de ganhar fichas.

JM:
Isso mesmo. Quando Amnon veio para a minha mesa, ele praticamente me disse que estava ali baralhar e, se eu aprontasse pra cima dele, ele voltaria a casa. Então, a partir desse ponto, busquei abrir o pote de forma mais tight até que pudesse eliminá-lo. Depois disso, foi quase como ganhar fichas grátis.
Mas quero deixar claro. É importante saber que eu não estava jogando de forma descuidada. Não estava dando 3-bet pré-flop sem nada, nem colocando outros jogadores all-in aleatoriamente. Se eu tivesse uma mão que achava que jogaria bem, eu pagava e os colocava all-in se acertasse ou sentisse que tinha uma boa equidade.

JR: Sim, mas você estava abrindo quase qualquer pote quando a mesa rodava em fold até você.

JM:
Eu provavelmente abri com um range bem grande de mãos para aproveitar o jogo passivo da mesa. Não há muito roubo de blinds em Omaha, mas devo ter levado o pote pré-flop umas 12 a 15 vezes, perto da bolha. Quer dizer, provavelmente houve momentos em que eles estavam dando fold em mãos como J-T-9-8, o que é... bem ruim. Não lembro qual foi a última vez que dei fold nessa mão. Então é seguro dizer que a maioria da mesa estava jogando com medo, e eu me aproveitei disso.

JR: Eu sei que você não gosta de falar muito, mas qual é o conselho que você dá a jogadores novatos?

JM:
Nunca dê fold e venha me encontrar nas mesas. Não, brincadeira. Acho que há muitos elementos do jogo que as pessoas não entendem. O poker é muito mais complexo do que muita gente pensa. Pessoas com menos conhecimento acham que é só apostar, apostar, apostar, mas há muitas formas de reduzir sua variância e evitar flipar em algumas situações. Não vou falar mais nada, mas digamos que o poker é um jogo extremamente incompreendido.




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