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Anthony Zinno - O Senhor dos Jogos


Julio Rodriguez
O World Poker Tour (WPT) é uma das principais séries de torneios do mundo, considerado um dos majors do circuito mundial. Criado em 2002, até o ano passado, apenas dois jogadores haviam conseguido três títulos da série, o dinamarquês Gus Hansen e o equatoriano Carlos Mortensen. Em 2015, a lista aumentou.

Anthony Zinno, que começou a disputar o WPT em 2012, venceu o Borgata Poker Open 2013 (US$ 825.099) o Fallsview Poker Classic 2015 (US$ $252.420) e, logo na sequência, o L.A. Poker Classic 2015 (US$ 1.015.860). Seus resultados fantásticos, em um curto espaço de tempo, incluindo um bracelete da WSOP, lhe garantiram o prêmio de Jogador do Ano da Card Player em 2015 — e agora você fica por dentro de todos os detalhes da carreira do mais novo fenômeno norte-americano.
 
Julio Rodriguez: Você poderia falar um pouco sobre sua infância e sua família?
 
Anthony Zinno: Minha infância sempre foi divertida — brincava com as crianças da vizinhança, jogava videogame, saía para comer almôndega com a família e colecionava figurinhas esportivas. Na escola, eu sempre me esforcei para ser um estudante B+. No geral, meus estudos foram tranquilos. Os estudantes não eram competitivos e os professores não eram tão exigentes, o modelo que acredito ser o correto. 
 
Minha irmã e eu sempre fomos bastante próximos e ela sempre apoiou minha carreira no poker, desde o primeiro dia. Meu pai era ortodontista e, mesmo falecendo quando eu tinha 15 anos, me deixou grandes lições. Ele trabalhava muito, era paciente e gentil, desde que ninguém o irritasse (risos). Já minha mãe é a mulher mais forte que conheci. Ela perdeu a mãe quando ainda era um bebê e o marido quando eu era um adolescente, mas nunca vacilou conosco. Ela é a fonte da minha perseverança.
 
JR: Quais eram suas paixões e ambições na vida antes do poker?
 
AZ: Eu adorava matemática e ciências, então escolhi fazer Engenharia Química na faculdade. Conheci pessoas muitos legais e o tempo passou voando. No meu último ano, fiquei sabendo que engenheiros poderiam se tornar advogados e trabalhar no mercado de patentes. A ideia de ajudar cientistas nessa área era desafiadora e a demanda por esse tipo de serviço era bem grande. Meus três anos na Faculdade de Direito de Suffolk foram incríveis, e logo em seguida passei no exame da Ordem de Massachusetts. No entanto, minha paixão pelo poker cresceu naquela época, assim como minha vontade de viajar e conhecer outras culturas — e eu decidi perseguir o sonho.
 
Algum dia, talvez eu sossegue e tenha filhos, mas meu foco hoje é nas viagens para jogar poker. Citando minha banda favorita: “I’m reaching for the random, or whatever will bewilder me. And following our will and wind, we may just go where no one’s been (Alcançando o incerto ou o que quer que me desnorteie. E seguindo nosso desejo e o vento nós poderemos chegar aonde ninguém jamais esteve)”.
 
JR: Quais são suas primeiras memórias relacionadas ao poker?
 
AZ: Minhas primeiras lembranças são dos jogos de 5-card draw, com os amigos, por centavos. Descobri o poker competitivo em 2003, assistindo pela TV, e comecei a jogar um pouco online em 2004. Com a faculdade, era difícil me dedicar completamente ao poker, então não consegui jogar integralmente até passar no exame da Ordem, em 2008. Sempre fui atraído por jogos que envolvem estratégia, o que me levou direto para o no-limit hold’em. 
 
JR: E como foi seu desenvolvimento?
 
AZ: Sou 100% autodidata. Todo meu conhecimento vem de horas e horas de jogo, sempre focado em corrigir os erros, psicológicos ou matemáticos. Por anos, meu objetivo foi corrigir mesmo o mais insignificante dos erros. Para mim, isso é mais importante do que estar ganhando dinheiro. No poker, um centavo perdido hoje pode ser o dólar de amanhã, graças à lição aprendida.
 
JR: Há algo no poker que incomoda você?
 
AZ: Algo que me causa espanto é o fato de que, nos últimos 10 anos, muitas pessoas categorizam o poker dentro de jogos de cassino, como o blackjack, o que seria primariamente baseado em chances. É frustrante saber que podemos comprar infinitas raspadinhas ou bilhetes de loteria junto com leite e ovos, mas somo proibidos de jogar um torneio de poker de $20 no bar da esquina. Tenho certeza que, no futuro, mais e mais pessoas abraçarão poker como jogo de habilidade. 
 
 
JR: Em que ponto você sentiu que pertencia ao mundo do poker?
 
AZ: Eu sempre fui um “gamer”, então me conectei com o mundo do poker logo de cara. Do Atari, passando pelo Nintendo, até os jogos de PC, se fossem desafiantes, eu estava lá jogando. Inclusive, na época da faculdade, paguei minhas despesas pagas vendendo itens de um jogo chamado Ultima Online no eBay. Eu também costumava jogar Counter-Strike e tendo chegado ao topo da maioria dos jogos competitivos dos quais eu era adepto, me senti confiante para fazer a mesma coisa no poker.
 
JR: Você surgiu do nada em 2013 e ganhou milhões de dólares. Como o dinheiro mudou sua vida?
 
AZ: Em 2013, eu coloquei muito mais volume em torneios, acabei vencendo o WPT e ganhando meu primeiro prêmio milionário. Isso me ajudou a pagar o restantes dos empréstimos da faculdade. Também abasteci meu bankroll, doei um pouco para caridade e investi no mercado de ações, o que, eu admito, foi muito arriscado. Psicologicamente falando, meu objetivo era não deixar o sucesso subir à cabeça, afinal, o que consegui foi contra as odds. Vencer um WPT com tão poucas tentativas era inacreditável, assim eu poderia aproveitar o dinheiro mais tranquilamente. Em 2013, me esforcei muito para melhorar o meu jogo, então, no ano seguinte, achei justo “tirar uma folga”. Foi a melhor decisão. Sinto que estou jogando o meu melhor, e se eu não estou pronto para jogar o meu “A-game”, não entrarei em nenhum torneio.
 
JR: Você teve decisões bem difíceis em alguns torneios. Quando essas decisões lhe derrubam tão perto de uma vitória, você se sente mal ou coloca na conta da variância?
 
AZ: São centenas de decisões complicadas ao longo do anos. Uma bad beat ou coin flip perdido faz parte da variância. Só fico chateado quando cometo um erro. Estudei milhares de horas para ser conivente com erros. Apesar disso, a beleza dos torneios está no fato de que há espaço para cometer muitos erros. Podem ser um erro mínimo, como extrair um pouco menos de valor naquele river, mas acontece o tempo todo, com qualquer um. Isso é o que faz o jogo tão complexo e incrível. Em minha opinião, a melhor maneira de melhorar o seu jogo é tomar notas de todos os seus erros. Se vocês os repetir, corte um dos seus dedos fora para servir de lembrete e lembre-se que erros não são tolerados. Talvez eu esteja assistindo muito Game of Thrones, mas vocês entenderam (risos).
 
JR: Qual o segredo para ir tão bem em torneios como o WPT, WSOP e os high rollers?
 
AZ: A verdade é que me sinto muito bem em torneios de no-limit hold’em que possuem estruturas deep. Sou um cara com muita experiência em jogar com qualquer faixa de stack, dos oito aos 200 big blinds. Poker deep stack, cujos stacks ficam por volta de 50 big blinds nos estágios intermediários e finais, é uma variável bastante complexa do jogo, em que experiência e habilidade contaram muito durante os cinco ou seis dias que você jogará.
 
 
JR: Todo esse sucesso já justifica você ter renunciado à advocacia?
 
AZ: Provavelmente, eu já fiz mais dinheiro do que faria trabalhando toda a minha vida com patentes, mas nunca foi sobre isso. É uma questão de liberdade e amor pelo jogo. Eu faço meu próprio horário e viajo para onde quero. Mas quero deixar claro para o jogadores recreativos que ser um profissional do poker nunca será fácil. Nos últimos anos, passei por períodos bons e ruins. Se minha paixão pelo jogo não fosse tão grande, eu já teria largado tudo. Minha perseverança foi recompensada e eu nunca estive tão feliz em minha vida.
 
 
CINCO DICAS DE ANTHONY ZINNO PARA GRANDES TORNEIOS
 
1. VALORIZE SEU STACK
 
Sim, você começa com muitas fichas em torneios deep stack, mas isso não quer dizer que cada uma delas não é valiosa. Vejo muitos jogadores recreativos colocando 25 big blinds ou mais no pote, com mãos que não deveriam, como se estivessem sedentos por ação.
 
2. JOGUE SEMPRE PARA GANHAR FICHAS
 
Uma coisa interessante que percebi através dos anos é que muitos jogadores, mesmo profissionais, sentem-se mais confortáveis com poucas fichas do que com muitas. Eu entendo que isso pode estar relacionado à expertise de cada um, mas sempre jogue para aumentar seu stack e preocupe-se em melhorar seu jogo quando possuir muitas fichas.
 
3. SAIA DA ZONA DE CONFORTO
 
Essa vai para os jogadores recreativos. Entre um torneio e outro, use seu tempo na mesa para melhorar seu jogo. O que isso quer dizer? Se você não está acostumado a jogar com um grande stack, treine. Tente achar situações com pouca variância e ganhar mais fichas em potes pequenos. Não se deixe levar pelo nervosismo e ir construindo potes gigantes. Se estiver short, não pense em ir all-in logo que a situação apertar. Aprenda em quais situações você deve ir all-in, dar call ou dar fold.
 
4. IDENTIFIQUE OS OBJETIVOS DOS SEUS OPONENTES
 
Na mesa final, obviamente há implicações de ICM (Independent Chip Model) das quais os jogadores devem estar cientes. No entanto, distinguir quem está jogando de olho nas premiações de quem está jogando para ganhar é fundamental. Esses últimos tendem a ser muito mais agressivos. Na minha primeira mesa final no WPT, eu estava bem nervoso por causa das câmeras e das enormes diferenças entre as premiações, então acabei jogando mais tight do que realmente eu jogaria. No final, isso jogou a meu favor, mas poderia ter sido um tranquilamente um tiro pela culatra.
 
5. PRESSIONE E SAIBA TROCAR AS MARCHAS
 
Nas minhas últimas vitórias, eu fui capaz de saber quando ficar mais tight e quando soltar mais o jogo e também coloquei muita pressão nos meu oponentes. Isso me permitiu ganhar vários potes menores, que não são mostrados na TV, mas são os que mais fazem diferença para o seu jogo fluir.
 
 
EVENTO BUY-IN (USD) DATA POSIÇÃO PRÊMIO (USD)
Evento #60 da WSOP – PLO High Roller $25.000 Junho/2015 $1.122.196
Main Event do WPT L.A Poker Classic $10.000 Fevereiro/2015 $1.015.860
Main Event do WPT Borgata Open $3.500 Setembro/2013 $825.099
Evento #58 da WSOP – High Roller for One-Drop $111.111 Junho/2015 $565.864
Main Event do WPT Fallsview Poker Classic $4.000 Fevereiro/2015 $302.235
High Roller do WPT Bay 101 Shoooting Stars $25.000 Março/2015 $197.758
 
 
 



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